Para além das limitações ao nível da habilidade matemática, a discalculia afeta muitas vezes a autoimagem e a autoestima da pessoa que a apresenta. Sendo uma dificuldade de aprendizagem permanente, uma vez diagnosticada vai acompanhar a pessoa durante toda a sua vida. Crianças com discalculia podem acabar por se sentir menos inteligentes e menos capazes do que na realidade são. Os desgastes de repetidas situações de stress relacionadas com dificuldades escolares resultam muitas vezes numa crescente desmotivação em prosseguir os estudos.
Para evitar esta espiral negativa, o diagnóstico e intervenção precoces fazem toda a diferença na qualidade de vida da criança. Para isso, é fundamental que pais e educadores estejam atentos a determinados sinais de alerta na criança, tais como: menor habilidade para contar e agrupar brinquedos por tipo/tamanho, para compreender a passagem do tempo (minutos, horas, dias), para estimar distâncias entre objetos e lugares, assim como menor curiosidade para participar em jogos que impliquem contagens, classificações e estratégia.
Tudo isto são elementos que podem dar pistas a pais e educadores sobre a forma como a criança se organiza neste mundo de quantidades e comparações que é o mundo da matemática. Uma boa comunicação entre pais, professores e técnicos especializados é determinante para identificar estes sinais e despistar a discalculia ou outras perturbações de desenvolvimento em idade precoce.
Uma vez diagnosticada torna-se possível implementar desde cedo estratégias de desenvolvimento das capacidades da criança. Quanto mais cedo for feita a intervenção, mais hipótese a criança terá de melhorar as suas funções do raciocínio lógico-matemático, devido à maior “plasticidade” do cérebro infantil em comparação com o cérebro adulto.
Reeducação da discalculia em crianças e jovens
Sempre que crianças ou jovens revelem alguns dos sinais de alerta relacionados com a discalculia, pais e professores devem procurar fazer uma avaliação mais detalhada junto de técnicos especializados, dado que o sucesso da intervenção será tanto maior quanto mais cedo forem detetadas e intervencionadas estas situações.
O diagnóstico e a intervenção na discalculia são realizados por psicopedagogos e psicólogos educacionais, que devem trabalhar em estreita colaboração com a família e com os professores da criança. A avaliação consiste geralmente numa entrevista inicial aos pais, seguida de quatro sessões com a criança e de uma entrevista aos seus professores.
Os programas de intervenção mais eficazes no tratamento da discalculia consistem numa a duas sessões por semana, durante as quais as funções cognitivas e a capacidade de pensar da criança são estimuladas nas suas diferentes componentes sensoriais, com particular enfoque nas áreas do cérebro responsáveis pelo raciocínio lógico-matemático (estimulação cognitiva multissensorial).
O que é avaliado?
Dependendo dos casos, são aplicadas atividades em que são estimuladas e otimizadas diversas competências da criança. Contudo, antes de se iniciar a devida intervenção avalia-se, nomeadamente:
- A familiaridade da criança com a noção de número, a sua leitura e escrita, assim como noções básicas da matemática, entre as quais a comparação (noção de maior/menor) e a ordenação numérica;
- A sua capacidade de compreender e realizar as operações de adição, subtração, multiplicação e divisão;
- A sua capacidade de estabelecer analogias lógico-matemáticas (necessárias para agilizar o raciocínio lógico-matemático) , e de desenvolver o raciocínio duplo (necessário para manipular mais do que uma informação em simultâneo) e o raciocínio simbólico-abstrato (necessário para realizar operações matemáticas mais complexas).
A reeducação e o treino destas aptidões baseia-se em atividades profundamente estruturadas e sistematizadas, assim como na implementação de atividades lúdico-pedagógicas. É fundamental que o técnico mantenha uma comunicação estreita com os professores e com os pais da criança, de forma a conciliar as estratégias educativas utilizadas.
O mesmo tipo de intervenção pode ser aplicado em adultos com discalculia, trazendo melhorias significativas na habilidade matemática e na precisão do raciocínio lógico-matemático destas pessoas. Contudo, devido à menor plasticidade do cérebro adulto, o grau de motivação da pessoa em superar estas dificuldades é absolutamente determinante para o sucesso da terapêutica.
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