Alegria e felicidade. É isto que se sente quando se entra no café Joyeux. Este é um espaço que – conhecendo-se ou não o conceito – não deixa ninguém indiferente.  Não só pela irreverência do decor amarelo mas principalmente pela sua missão: empregar maioritariamente pessoas com dificuldades intelectuais e do desenvolvimento, como é a trissomia 21 ou o autismo.

Mas mais do que a questão da empregabilidade e de ser um modelo de negócio inclusivo, este café-restaurante pretende promover a integração de todos os seus colaboradores na sociedade e colocar a diferença no coração das cidades e das pessoas. “Quem vier aqui e vir uma pessoa com trissomia 21, a servir-lhe um café com um serviço alegre e simpático, amanhã quando vir que alguém com trissomia 21 que se está a candidatar para um emprego, vai-se lembrar que não é pela trissomia 21 que esta pode não ter uma capacidade de integração profissional”, refere Filipa Pinto Coelho, CEO do Café Joyeux, sobre este negócio social que se tornou uma realidade através da sua Associação Vilacomvida, e de uma parceria com a Fundação Émeraude Solidaire.

Mas como é trabalhar no Café Joyeux? Aqui existe alegria para comprar e vender, algo que está bem visível nos olhos e rostos de quem cá trabalha. Que o diga Pedro, que é um dos sete funcionários deste espaço em Lisboa que emprega jovens entre os 21 e os 27 anos. “Felicidade”. É isto que sente durante o trajeto diário que faz para ir trabalhar para o número 26 da Calçada da Estrela. “É uma experiência nova, diferente, que nunca tinha feito e onde aprendi muitas coisas ao longo do tempo” refere o jovem de 22 anos, adiantando que é muito gratificante “ver os clientes saírem com um sorriso na cara.”

Café Joyeux, uma história que começou em França

Mas para contar a história do Café Joyeux é preciso viajar à cidade francesa de Rennes, onde Yan Bukai, presidente da Fundação Émeraude Solidaire, abriu aquele que viria a ser um projeto pioneiro na área da restauração. A ideia nasceu algum tempo antes durante uma viagem de recreio em catamaran que o empresário fazia regularmente com grupos de exclusão social e onde um dos jovens com autismo, Théo, lhe fez um pedido que o inquietou: “Não me arranjas um trabalho? Quero trabalhar e quero-me sentir útil”. A ideia não saiu da cabeça de Yan e esse foi o ponto de partida para a criação de uma marca e negócio com esta dimensão social que viu a luz do dia em novembro de 2017 em França, com Théo a servir de inspiração para o logo da marca.

Apesar de não se conhecerem e estarem separados por milhares de quilómetros, Yan Bukai e Filipa Pinto Coelho tinham algo que os unia: criar formas de aproximar as pessoas com deficiência com o resto do mundo. Em 2018, prestes a abrir o Café Com Vida, a presidente da Associação Vilacomvida obteve, através de uma amiga, o contacto de Aleksander Debinsky, o designer do primeiro Café Joyeux que tinha aberto em França e que estava a viver em Portugal. Meses mais tarde viria a encontrar-se cara a cara com Debinsky e, posteriormente, com o dono da Émeraude Solidaire. E como nada acontece por acaso, um desses encontros aconteceu precisamente num café em São Bento que, três anos mais tarde, viria a alojar o primeiro café Joyeux fora de território francês. O interesse de Filipa Pinto Coelho por este projeto deve-se ao facto deste ser um tema pessoal para si, uma vez que tem um filho portador de trissomia 21.

“Eu acho que o convenci que o que nós queriamos era trabalhar em equipa para construir uma missão que é muito mais do que uma missão local. É uma missão mundial porque em todo lado do mundo existe um problema do gap enorme entre o mundo das pessoas com deficiência e o mundo dito normal”, refere a empresária que, após chegar ao contacto com o presidente da Fundação Émeraude Solidaire, em outubro de 2018 avançou com a abertura do espaço-piloto na Fundação Portuguesa das Comunicações ainda com o nome Café Com Vida e onde se manteve até ao início da pandemia. Depressa perceberam que este era um conceito que tinha pernas para andar e, em abril de 2021, assinou o contrato de internalização de franchising do Café Joyeux. “Portugal foi primeiro país a dar este passo, mas outros estão na calha: Nova Iorque, Londres e Bruxelas.”

Contratar para formar é o lema do Café Joyeux

Na altura de contratar pessoal, o Café Joyeux foge à regra comparativamente com os outros cafés e restaurantes. O primeiro aspeto é que nenhum dos funcionários é obrigado a ter formação nesta área uma vez que a formação certificada só acontece após a contratação. “Não precisam de ter qualquer experiência na área da restauração porque a ideia é que eles possam aprender aqui todos os processos de raiz. Os processos são feitos de forma muito facilitada para fazerem uma aprendizagem de todas as tarefas que são necessárias fazer”, explica Ana Castro Santos sobre as funções base que vão desde servir à mesa a barista, passando pelo serviço de cozinha e de caixa. Outro deve-se ao seu contexto inclusivo, onde pelo menos 50% dos colaboradores tem um grau de incapacidade intelectual e do desenvolvimento. “Nós não acreditamos, e por isso é que defendemos este projeto, que pessoas com algum tipo de deficiência possam aprender e ver uma referência para crescer em cursos que são só para pessoas com este tipo de incapacidade”, refere a CEO do espaço.

O Café Joyeux em números:

  • Têm doze equipiers contratados para formar;
  • Têm seis supervisores especializados;
  • Desde 2021 que proporcionaram mais de 14.000 horas de formação;
  • Até ao momento já foram celebrados 7 contratos de trabalho com jovens com dificuldades intelectuais e do desenvolvimento (estando mais seis em vias de ser assinados);
  • Já acompanharam mais de 60 jovens em treino de autonomia em diversas atividades inclusivas.

O modelo de trabalho em rede é fundamental para o recrutamento do café Joyeux que, à semelhança de qualquer processo deste género, segue vários passos. O primeiro começa com “ir buscar as pessoas à nossa rede e a outros contactos que já tínhamos”, o segundo em lançar “a informação de que íamos contratar à nossa rede de IPSS e outras organizações com quem trabalhamos”, e por fim segue-se “todo o processo de conhecer a pessoa através de uma entrevista inicial”. O processo de recrutamento termina com um teste: um dia a trabalhar presencialmente. “Foi um grande upgrade ao nosso processo de recrutamento porque permite perceber, in loco, como as pessoas se comportam e se gostam mesmo”, explica Ana Castro Santos, psicóloga e coordenadora da equipa de impacto.

Dado a exigência desta área, a motivação e a vontade para aprender são dois critérios que procuram nos candidatos que selecionam e que posteriormente vão receber formação após terminado todo este processo. Para Filipa Pinto Coelho, este modelo de recrutamento é muito mais eficiente face aos tradicionais. “Temos esperança de que esta experiência possa ajudar outras empresas e o Estado a perceber que se as empresas apostarem na contratação para depois formar quando existe um potencial identificado, vai haver muito menos desperdício de recursos e não se vai gastar tanto dinheiro em formação.” Aliás, o objetivo é que o espaço de São Bento possa funcionar como modelo “café-escola” e onde os atuais colaboradores possam dar formação a todos aqueles que entrarem futuramente. E isso vai acontecer muito em breve.

Outro fator diferenciador é o facto de todos os colaboradores celebrarem um contrato sem termo, dando-lhes a liberdade de procurem outro local de trabalho apenas se pretenderem. Cada um dos funcionários é remunerado de forma proporcional às horas de trabalho e em função do salário mínimo nacional, sendo que aqui o que é premiado é o esforço de evolução e o potencial de cada um.

Sofia Bertão, que há poucas semanas assumiu o lugar de responsável de operações do Café Joyeux, ficou surpreendida com o profissionalismo de todo o staff. Consciente da exigência e rigor que a área de hotelaria exige, não tem dúvidas de que esta “foi a melhor equipa operacional que alguma vez já tive”. “São super cumpridores, não temos que estar sistematicamente a repetir as mesmas correções. Se falham é porque é ingenuamente e não de propósito. São muito focados nas suas funções”, refere sobre os funcionários que, diariamente, contam com o acompanhamento e supervisão de três profissionais da restauração no estabelecimento e um gerente. Em 12 meses não tiveram uma única reclamação.

Como forma de divulgar o seu projeto e a sua missão, o Café Joyeux ainda realiza diversos serviços de catering em empresas dando assim oportunidade de emprego a outros jovens com deficiência que lhes chegam através do modelo em rede e sem desfalcar a equipa que assegura o funcionamento do espaço em São Bento e no quiosque do edifício Ageas Portugal. Localizado nos Parque das Nações, este destaca por ser o primeiro modelo-empresa da marca que presta serviço de cafetaria e de refeições leves servindo, diariamente, 1.600 colaboradores.

2023: um ano repleto de novidades e novas aberturas

Com portas abertas há um ano, o projeto do Café Joyeux enche o coração de Filipa Pinto Coelho. “É um orgulho brutal”, afirma de sorriso no rosto, referindo que o balanço que faz destes 12 meses não poderia deixar de ser positivo. “O maior balanço que nós fazemos é que o conceito funciona, que as pessoas são felizes aqui, que a equipa está cada vez mais motivada, que os clientes e as empresas estão a reconhecer isso, tanto que é que recebemos muitos pedidos para o replicar.”

Informações

Horário: Segunda - Sábado entre as 09:00 e as 18:00

Morada: Calçada da Estrela 26, 1200-664 Lisboa

Contacto:  961 056 550

Brunch: Todos os sábados entre as 09:00 e as 15:00

A próxima abertura em Portugal já tem data e local marcado: se tudo correr bem será inaugurado a 20 março de 2023, no Dia Mundial da Felicidade, em Cascais. Para além de ser um projeto de grandes dimensões, vai compreender diferentes espaços. “São três andares: um é cozinha, outro é sala e vamos ter um espaço para formação e que as empresas podem alugar para reuniões de trabalho”, refere sobre este projeto que, ao todo, irá empregar 12 pessoas. E ao que parece este conceito vai continuar a crescer a olhos vistos nos próximos anos. Atualmente o Café Joyeux tem 18 pedidos identificados de diversas marcas para abrir com esta chancela. “Temos que ter esta equipa estruturada, e já estamos muito mais próximos disso, para dar esse passo. Cascais vai ser um desafio grande pois geograficamente está longe e vai ter que ser também muito autónomo. Nós estamos à espera de ter tudo alinhado para montar Cascais e já estamos a ver outras oportunidades dentro de empresa para poder crescer.” Outro dos objetivos é replicar este modelo e que, até 2026, existam seis cafés-restaurante espalhados pelo país, como é o caso da zona Norte.

Mas as novidades não ficam por aqui. Em breve vão arrancar com uma nova área de negócio: uma marca de café 100% nacional em grão e em cápsulas. Composto por seis blends diferentes, este vai ser o primeiro café solidário que existe no mundo e com produção local. “Todas as vendas das refeições, cafés, caterings e merchandising contribuem para abrir mais cafés Joyeux”, adianta Filipa Coelho Pinto. Esta novidade vai estar à venda nos espaços físicos, em supermercados e no e-commerce da marca que será lançado brevemente.

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