Maria, Eduarda, Matilde, Francisco e Rafael têm entre 10 e 11 anos, são colegas de turma e vivem na Bélgica há mais de dois anos. A mudança não foi fácil para a maior parte delas.
Para a Matilde, 10 anos, foi até bastante difícil. Quando os pais lhe contaram cerca de quatro meses antes que iam deixar Portugal, as lágrimas foram inevitáveis. “Quando cheguei aqui, tinha oito anos, e fiz algumas birras. Chorava, não queria dormir no meu quarto, estava muito nervosa com a mudança”.
Maria, 10 anos, confessa que ficou triste com a mudança, mas por outro lado, sabia que ia ser uma nova experiência. Para a Eduarda, 11 anos, o que custou mais foi deixar a família para trás. Sendo do norte do país, mais precisamente de Póvoa do Lanhoso, com uma família grande, deixá-los foi o mais difícil. “Nós somos muito unidos, e também fiquei com saudades dos meus amigos. Mas, como a Maria, eu depois gostei de conhecer aqui novos amigos”, conclui.
Além da família e amigos, há outras coisas que deixaram para trás e que ainda persistem na memória. Francisco, 11 anos, vive na Bélgica desde que nasceu, e vai a Portugal nas férias da escola e verão. No entanto, e apesar de não ter a experiência de ter vivido no país, como a maior parte dos seus colegas de turma, sabe muito bem identificar do que tem mais saudades sempre que regressa à sua terra natal, o Pego, em Santarém.
“Sinto saudades de um pequeno campo de futebol onde jogo desde pequenino e espero que nunca ninguém o destrua, porque é uma grande lembrança para mim”. O Rafael diz que são “dos gelados Olá e da minha antiga casa!” que sente mais falta.
Uma escola diferente e um ensino bilingue
A escola foi outro passo importante na vida destas crianças. Agora frequentam uma escola europeia, onde no recreio e nas salas de aulas se falam diferentes línguas, além do português. O método de ensino e as rotinas também são diferentes.
“Foi difícil, porque como eu era nova na escola, não me ligavam muito”, revela Maria, que vive em Bruxelas há dois anos. Eduarda concorda. “Quando cheguei, e como era a única rapariga nova a entrar naquele ano, era ignorada e as outras meninas nunca queriam brincar comigo. Havia um grupo para o qual eu queria entrar, mas elas obrigavam-me a fazer coisas que eu não conseguia, só para não fazer parte daquele grupo”.
Hoje em dia, todos estão perfeitamente adaptados à nova escola e têm muitos amigos, inclusive de outras nacionalidades.
Frequentar uma escola europeia para estas crianças é uma grande vantagem na aprendizagem de línguas. “No recreio podemos logo praticar o inglês ou o francês, com outros meninos. Isso torna a aprendizagem de uma língua muito mais fácil”, diz Francisco.
Mesmo para quem não sabe ainda falar o francês, há sempre um amigo disposto a ajudar. “Tenho amigas italianas e francesas, e às vezes elas ensinam-me o francês. Além disso, aqui no secundário a partir de um determinado ano podes aprender uma terceira e quarta língua. Por isso, sais da escola a saber falar italiano, alemão, espanhol ou outra, e isso vai ser importante para o nosso futuro ”, conta Matilde. Para Rafael, “em Portugal aprendem-se outras línguas um pouco mais tarde, e aqui começa-se desde cedo.”
De uma maneira geral, consideram o ensino em Portugal mais exigente e mais difícil. “Aqui eles fazem mais atividades, o que facilita a aprendizagem de determinadas matérias”, revela Eduarda. Na opinião da Maria, “para quem frequentou uma escola em Portugal, chega aqui e tudo parece mais fácil”. Matilde aponta outra questão, relacionada com a compatibilidade dos programas curriculares: “Quando entrei aqui para o 4º ano, havia matérias que já tinha dado em Portugal, por isso não foi difícil”.
A seguir: "Falar de terrorismo era inevitável"
Agora preparam-se para enfrentar um novo desafio, a entrada para o primeiro ano do secundário. Nas escolas europeias, o ensino primário é de 5 anos, e o secundário de 7. Esta transição, da primária para o secundário, é um grande passo para estas crianças.
“Tenho medo, as coisas são muito diferentes da primária para o secundário. Há muito mais alunos, mais velhos, são mais matérias, mais professores”, diz Eduarda. “Eu estou mais relax, porque estou nesta escola desde os quatro anos e já passei várias vezes pela secundária, sei onde são as salas… Mas também tenho alguns receios, porque na primária tens um professor que te acompanha para todo o lado. Na secundária, vamos ter de ser mais responsáveis”, acrescenta Francisco.
Falar de terrorismo foi inevitável
Para este grupo de amigos, existem vantagens e desvantagens de viver em Bruxelas. Para Francisco, “é muito giro ver numa rua uma loja portuguesa, ao lado uma loja polaca e à frente uma francesa. Há muitas coisas aqui para descobrir e ver”. Como a Maria diz, “é tudo muito internacional”. Eduarda acrescenta, “em Bruxelas há mais oportunidades, e a qualidade de vida é melhor e os empregos também. Em Portugal o ordenado mínimo é de 500 euros”.
No entanto, o assunto terrorismo não é indiferente. “Tenho medo, mas quando vejo os militares na rua sinto-me mais segura”, afirmam Eduarda e Matilde. “O terrorismo fez com que houvesse menos turistas por aqui. E isso é mau. Agora vai tudo para Portugal”, remata Francisco.
Expectativas para o futuro
“Quero voltar a Portugal, porque nunca tive a experiência de viver lá como eles. Por isso queria ter essa sensação de viver no meu país e estar com a minha família. Provavelmente, farei a universidade lá”, confessa Francisco, que gostaria de ser jogador de futebol.
Para Rafael, que ainda “não faz a mínima ideia do que quer ser quando for grande”, a faculdade tanto pode passar por Portugal como noutro país.
Matilde tem outras expectativas. “Gostava de ir para os Estados Unidos, para Harvard, e queria ser estilista”.
A Maria, que ainda não sabe que profissão quer seguir, e a Eduarda, que gostava de ser arquiteta, estão decididas. Querem voltar para Portugal, para prosseguirem os estudos.
De uma maneira ou de outra, seja para frequentarem uma universidade ou viver, Portugal é sem dúvida o país que continua a ocupar um lugar grande no coração destas crianças.
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