Estes e outros dados são conhecidos hoje quando forem apresentados os resultados da consulta nacional “Tenho Voto na Matéria”, realizada pela Unicef Portugal, e que quis saber o que pensam, sentem e desejam as crianças e jovens para as suas comunidades.
A consulta nacional decorreu entre 15 e 26 de setembro de 2021, através de um inquérito 'online' de sessões de discussão, de norte a sul do país e ilhas, e ao qual responderam 9.306 crianças e jovens de todos os distritos do país, com idades entre os seis e os 18 anos.
“A grande maioria das crianças e dos jovens consultados não se sente envolvida nas decisões sobre o lugar onde vive ou, quando consultados, sentem que as suas opiniões ou sugestões não têm consequência ou impacto nas decisões”, lê-se no documento com os resultados, a que a Lusa teve acesso.
Efetivamente, 76% das 9.306 crianças e jovens manifestaram que nunca ou raramente deram a sua opinião sobre o local onde vivem, enquanto 80% diz mesmo que quando deram a sua opinião esta de pouco serviu e não teve influência no que foi decidido.
“Os resultados, validados pelo Centro de Estudos e Sondagens de Opinião, da Universidade Católica, vêm demonstrar que, apesar de não votarem, crianças e jovens estão disponíveis para se envolver”, refere a Unicef.
Já no que diz respeito ao que as preocupa, “ficou evidente que as crianças e os jovens querem ser envolvidos e existem assuntos, em particular, que os preocupam relacionados com o seu bem-estar”.
“A saúde mental (20,8%), a discriminação (16%), a internet e as redes sociais (11,6%) surgem nos resultados como as três principais preocupações das crianças e dos jovens nas respostas ao inquérito ‘online’”.
Inês e Guilherme têm em comum não só a idade, o sítio onde moram, e a vontade em fazerem-se ouvir, mas também o facto de terem feito parte do grupo consultivo de crianças e jovens da Unicef Portugal que realizou o inquérito.
Este grupo consultivo foi constituído por 18 crianças e jovens oriundos de contextos tão diferentes como acolhimento institucional, vulnerabilidade económica e social, comunidade cigana, refugiadas ou com deficiências, e algumas destas crianças vão depois participar num debate com algumas vereadoras municipais.
É o caso de Inês Costa, 14 anos, que já tem a pergunta definida e quer saber como é que se consegue alcançar consensos quando há tantas opiniões diferentes.
À parte disso, assume que gostava que levassem a sua opinião a sério sobre alguns projetos.
“Acho que este projeto é basicamente sobre isso, que é darem ouvido às nossas opiniões”, defendeu, acrescentando que gostava que a consultassem sobre o sítio onde vive.
Sublinhou que como ainda é menor e não pode votar não levam tão a sério a sua opinião, quando na realidade os “jovens sabem de coisas que os adultos não têm noção”.
“Gostaria de ser levada um pouco mais a sério”, defendeu.
Já para Guilherme Fernando, 14 anos, o principal desafio esteve no facto de se ter conseguido perceber “onde é que os jovens sentiam que não eram tão ouvidos”.
“Os adultos não nos costumam perguntar muitas vezes a opinião e mesmo quando perguntam a nossa resposta acaba por ser indiferente, a nossa resposta não serve de nada”, criticou.
Guilherme acredita que se dessem mais importância à opinião dos jovens, eles seriam naturalmente adultos mais ativos e mais participantes da vida política, por exemplo.
Não opinião da diretora executiva da Unicef Portugal, neste projeto há “uma conquista pelo processo e outra conquista pelo facto de haver sensibilidades muito claras e ideias muito claras que são transmitidas pelas crianças”.
“Nós, enquanto Estado, e tendo aderido à convenção sobre os direitos das crianças, há uma parte fundamental que também nos obrigámos e que é incluir todas as crianças e jovens nos processos de decisão que a eles lhes digam respeito. Isto tem que passar de ser uma prática de alguns e em alguns momentos para passar a ser uma prática corrente e normal, em todos os momentos”, defendeu Beatriz Imperatori.
Para a responsável, é muito importante valorizar este momento porque se está a fazer caminho e sublinhou que o primeiro resultado claro é o de que há caminho a fazer para incorporar a voz das crianças em todos estes processos, de lhes dar um espaço para que sejam ouvidas e conhecidas.
“Muitas vezes as crianças em vez de ir ao parlamento ou ao gabinete de um ministro o querem é que os decisores políticos vão junto delas para conhecer a sua realidade e a casa onde vivem, a escola onde aprendem e o bairro onde brincam”, defendeu.
Por outro lado, Beatriz Imperatori entende que é preciso deixar de continuamente valorizar a criança na perspetiva do que vai ser amanhã.
“As crianças são como nós, são pessoas hoje, todos nós temos o nosso tempo hoje e não podemos estar sempre a valorizar-nos naquilo que nos acontecerá num futuro. O momento importante a valorizar é o de hoje”, sublinhou.
A apresentação dos resultados acontece na Universidade Católica, em Lisboa, e inclui uma intervenção do presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, através de uma mensagem vídeo.
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