O Guia de Boas Práticas da Audição da Criança, das psicólogas Rute Agulhas e Joana Alexandre, é dirigido a juízes, procuradores, advogados e outros profissionais que possam estar envolvidos na audição de menores e contém instruções precisas sobre o que deve ou não ser perguntado e a forma como as questões devem ser colocadas.

O objetivo das autoras do guia foi encontrar estratégias e mecanismos de garantia dos Direitos da Criança envolvida em procedimentos judiciários, cíveis e penais, tutelares cíveis ou tutelares educativos.

A participação dos menores “envolve as emoções, devendo as crianças participar ativamente quando contam o que sentem, por palavras, jogos ou desenhos”, lê-se no guia.

Em Portugal as crianças enfrentam muitos obstáculos no sistema judiciário, tais como “interrogatórios repetidos, os ambientes e procedimentos intimidatórios, a ausência de formação particularmente especializada dos profissionais que as entrevistam, a morosidade não natural dos processos”.

Entre as boas práticas apontadas inclui-se a presença nas audições de um número mínimo de adultos sem trajes profissionais e a existência de materiais lúdicos, como papel, canetas, lápis de cor e puzzles que permitam identificar partes do corpo humano e bonecos que possam representar os elementos da família, para reduzir a ansiedade do menor.

Uma das sugestões é avaliar, através de questões sobre temas como a escola, amigos, lazer a maturidade da criança, a capacidade que tem para distinguir a realidade da fantasia e para responder a questões do tipo "Quem, o quê, quando e como".

As autoras defendem que a criança deve ser ouvida sempre na presença de um técnico especializado, que tenha tido, pelo menos, uma sessão a sós com ela antes da audição.

Os profissionais devem começar por explicar que não faz mal a criança dizer que não sabe, não se lembra ou não tem a certeza, devem encorajar o relato espontâneo, com questões abertas, e aproveitar sempre as palavras da criança para formular a questão seguinte.

O guia elenca também alguns erros que não devem ser feitos na entrevista, tais como colocar questões na forma negativa, elogiar ou anunciar uma recompensa ou uma punição pelo facto de a criança relatar algo.

É considerado contraproducente emitir juízos de valor sobre terceiros ou sobre as respostas da criança, ou corrigir uma resposta e perguntar em que medida gosta de alguém (por exemplo, dos pais, do suspeito agressor).

Nos processos de regulação das responsabilidades parentais e quando existem vários irmãos, as especialistas defende que os menores sejam ouvidos em separado e em conjunto, porque as crianças podem apoiar-se umas das outras, sentindo-se mais confortáveis e o entrevistador beneficia da oportunidade de poder observar as dinâmicas relacionais entre elas.

Num trabalho supervisionado pelas autoras foi realizado um inquérito a 49 procuradores (38,8%) e magistrados (61,2%), os magistrados relataram a falta de preparação para a audição de menores e a dificuldade em compreender as suas características de desenvolvimento (relacionadas com a idade e a maturidade).