A tese da investigadora do Centro de Estudos Sociais (CES), defendida em 2014, centra-se na forma como a violência doméstica é tratada pelos juízes e procuradores do Ministério Público, encontrando diversas "falhas" no sistema judicial português, disse à agência Lusa Madalena Duarte.
Apesar de haver "uma evolução muito grande da sensibilidade dos magistrados para este tema", "há ainda muitos preconceitos sobre aquilo que é uma vítima de violência doméstica", notou.
"Há uma série de questões que deveriam ser trabalhadas, mas acima de tudo formação dos magistrados", frisou, recordando que se investiu "muito na formação dos polícias e as magistraturas ficaram esquecidas".
De acordo com Madalena Duarte, ainda se verificam "sentenças judiciais que não dignificam a vítima", exemplificando com casos em que "a recusa de relações sexuais por parte das mulheres" foi uma "atenuante" na definição da pena do agressor.
Para a investigadora, ainda subsiste uma ideia "muito tradicional da mulher", as agressões psicológicas e sexuais "são muito desvalorizadas" e é muito usado o estereótipo de que o álcool "é a causa da violência doméstica".
A investigadora do CES afirmou ainda que as mulheres, quando são vítimas de violência doméstica e têm carências económicas, têm um advogado oficioso para cada processo no tribunal: queixa-crime, divórcio e responsabilidades parentais.
"Deveria ser atribuído um advogado para todos os processos", defendeu.
Outra situação preocupante, alerta, é a aplicação das medidas de proteção das mulheres quando apresentam a queixa-crime, considerando que o termo de identidade e residência "não é suficiente", devendo-se recorrer "mais à vigilância eletrónica" e "não ter medo de aplicar a medida de prisão preventiva, quando há risco".
A tese de doutoramento de Madalena Duarte, intitulada "Para um Direito sem Margens: representações sobre o Direito e a violência contra as mulheres", envolveu mais de 200 entrevistas a procuradores e juízes de todo o país, entrevistas a vítimas de violência doméstica e organizações de apoio à vítima, inquérito a 100 futuros magistrados, análise da jurisprudência em torno de homicídios e levantamento de mais de 200 processos relacionados com violência doméstica de cinco comarcas.
O prémio APAV para a Investigação, que tem este ano a sua primeira edição, "é um incentivo" para continuar, contou, referindo que está de momento a fazer um pós-doutoramento sobre os homicídios nas relações de intimidade.
A cerimónia de atribuição da distinção realiza-se hoje à tarde, na sede da APAV, pelas 15:00.
O prémio contou com 43 candidaturas, sendo que são também entregues duas menções honrosas à investigadora da Universidade de Coimbra Neusa Patuleia e à investigadora da Universidade do Minho Cátia Fernandes foram também foi também atribuída uma menção honrosa.
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