A Associação SORRIR tem como missão promover e salientar a importância de sorrir para a saúde, não pela ausência de doença, mas enquanto bem-estar físico, mental e emocional.

O movimento O MAIOR SORRISO DO MUNDO nasce em 2013 para reforçar esta mensagem e representa alegria, amor, saúde e bem-estar.

Figuras públicas e empreendedores aderiram à causa e partilharam os seus testemunhos. Conheça a história de Marta Canário, escrita na primeira pessoa.

"Escrever uma história da minha vida que fizesse alguém sorrir, ou que inspirasse alguém. Foi este o desafio que me propuseram.
Felizmente que minha vida tem sido farta, no que diz respeito a boas histórias. E digo felizmente porque uma vida sem histórias fortes para contar é pouco interessante.

Podia contar-vos episódios hilariantes da minha infância ou adolescência. Podia contar-vos histórias que me aconteceram já na idade adulta. Como a fase em que comecei a trabalhar, ou aquela em que fui tia. Mas vou contar-vos duas que, por serem complicadas e por terem sido ultrapassadas, podem inspirar alguém. Têm ambas a ver com questões de saúde pelas quais passei, mas que, lá está, passei, não fiquei lá.
A primeira aconteceu com 15 anos. Foi com essa idade que deixei de andar. Fiquei paraplégica.

Era um dia normal de março. Frio. Estava sozinha em casa e preparava-me para mais um dia de escola. Fui tomar banho. À época, o esquentador estava colocado na casa de banho – assim era nos prédios antigos como aquele onde eu morava, na Avenida da Igreja, em Alvalade. Assim que liguei a água quente o esquentador, naturalmente, acendeu-se. E sem me aperceber, dele começou a sair monóxido de carbono, que não tem cheiro. Senti-me cansada e, em vez de sair do banho, sentei-me no poliban. Não sabia o que se estava a passar e pensei que não fosse mais que uma quebra de tensão. Sentei-me e esperei que passasse. Sem me aperceber desmaio e só sou encontrada pela minha irmã 2h30 depois (hora a que ela chegou a casa). Fui para o hospital onde estive 5 horas em coma. Quando acordei disse que não sentia as pernas. Depois de vários exames percebe-se que o monóxido de carbono inalado se tinha alojado na medula e causado uma lesão medular que me tinha deixado paraplégica.

Depois de um mês acamada no Hospital de Santa Maria, passo para Alcoitão, onde estou cerca de 4 meses e meio a fazer recuperação.

Aproveito para ir a Londres, a dois reputados neurologistas. Ambos me dizem que os tratamentos de lesões medulares estão em laboratório, podem demorar meses ou anos a saírem cá para fora. Ou mesmo, nunca saírem. Para eu ter paciência e para manter o espírito que levava comigo, que era muito importante para seguir com a minha vida para a frente.  Foi o que fiz. A par da minha fisioterapia, acupunctura e homeopatia, continuei na escola, depois passei para a faculdade.

Com cerca de 3 anos de acidente, e depois de perceber que a evolução que tinha havido era quase nula, decido focar-me de novo naquilo que eu gostava: viver a minha vida de uma forma normal. Não gastar mais energia a tentar voltar a andar porque cedo percebi que seria, não gastar, mas perder energia com algo que não haveria de acontecer.

A consciência disto não aconteceu num dia em concreto. Aconteceu com o passar do tempo, de forma progressiva. O tempo ia passando e fui-me apercebendo diariamente que, apesar de continuar de cadeira de rodas, pouco tinha mudado na minha vida. Aliás, percebi que tudo se mantinha na mesma mas, em vez de a viver a vida em pé, vivia-a sentada. Claro que o facto de ter estado sempre rodeada de gente positiva (família e amigos), que me ajudaram a “viver” desta nova forma foi fundamental.

Não tive a chamada fase do luto. Aceitei as coisas como elas eram. A partir daquele momento, era importante ter uma vida normal, adaptada aquela nova realidade.

No último ano da faculdade fui convidada para lançar um gabinete de imprensa numa empresa portuguesa, a maior tecnológica portuguesa, onde me mantenho até hoje com a responsabilidade de assessoria de imprensa.

Nunca fui vítima de discriminação. Também nunca o permitiria, é um facto. Não deixo de ir para lado nenhum por causa disto. Só aprendi a planear melhor as coisas antes de ir, e se não der para mim, não faço dramas e arranjo alternativa. É tão simples como isto.

Dificuldades, muitas, mas apenas ao nível das acessibilidades. É um terror. Quase nada está feito. E muitas vezes, o que está feito, está mal. A lei também não nos protege como deveria e, quando o começar a fazer (quando terminarem os prazos que obrigam as instituições públicas e privadas a terem acessos para pessoas com mobilidade reduzida), não acredito que seja cumprida. Muito menos fiscalizada. Infelizmente é isto que sinto. Portugal (e o mundo!) tem um longo caminho a percorrer nesta matéria.