Eu guardo boas recordações de algumas, como "VAMP", "O Rei do Gado", "Pedra sobre Pedra"... Lembro-me que era pequeno e de aquele ser o passatempo preferido e habitual que nos reunia a todos na sala depois do jantar. A minha mãe ia deitando um olho na TV, enquanto corrigia os testes dos seus alunos da escola, e o meu pai entre a leitura do jornal e as constantes perguntas: 'este é que é o mau?'. Por fim, eu e os meus irmãos embevecidos a captar aquelas imagens mágicas, naqueles cenários deslumbrantes e histórias tão absorventes, que nos remetiam para uma realidade tão distante e diferente da nossa.

Mal sabia eu que essas histórias, interpretações e imagens, seriam as responsáveis pelo despertar do meu interesse em querer fazer aquilo e que passados alguns anos seria eu a estar ali, ao lado de muitos daqueles atores, em risadas e desabafos de bastidores, a partilhar o mesmo set, a mesma cena, a mesma novela.

Não sou, nem nuncafui deslumbrado com nada, talvez pela minha natureza e educação. Mas não posso negar que assim que comecei este projeto de época, 'Escrava Mãe', que me fascino com coisas que vou vendo e vivendo dia-a-dia.

Para começar, os cenários. Fico fascinado com a forma minuciosa como nada é deixado ao acaso... os copos, os pratos, toalhas, mobiliário, tochas de fogo acesas nos cenários e velas por todo o lado. Esta equipa não deixa passar nada. São profissionais de um rigor extremo. Nota-se que existe um carinho muito grande de todos os elementos da equipa por este projeto.

Os efeitos especiais, decoração e edição, estão a cargo de profissionais vindo diretamente de Hollywood, visto esta novela ser uma co-produção norte-americana.

Os figurinos são tão detalhados e pormenorizados, que é impossível não captar a essência da época em que se retrata na novela, 1803. Os figurinos de homem, mulher, senhor, coronel, escravo, feitor, etc, são feitos pela mesma equipa que produz os figurinos da série "Game of Thrones", mais propriamente em Milão na fábrica 'Tirelli Costumi'.

A cidade cenográfica e as sanzalas, as roças de café, as fazendas, as cachoeiras, são paradisíacas e exatamente as mesmas onde se gravou a tão aclamada 'Escrava Isaura'. Só poderia, visto que 'Escrava Mãe' é a prequela, onde se conhece a verdadeira história de amor e tragédia dos pais da escrava Isaura, 'Miguel' interpretado por mim e ' Escrava Juliana', interpretado pela doce Gabriela Moreyra. A 'Escrava Isaura', essa nascerá durante a trama, fruto deste amor controverso, intenso e proibido.

Mas, para além do impacto visual, há outros detalhes que dependem de cada um de nós. No meu caso, as aulas de fonoaudiologia para atenuar o sotaque carregado português, para que de Norte a Sul do Brasil possam entender o que falo, visto não estarem tão habituados ao português de Portugal como nós portugueses ao português do Brasil.

Os assistentes de cena estão sempre atentos e não dão tréguas às posturas erradas que são hábitos contemporâneos de todos nós atores. As reprimendas a mim, confesso que ainda são uma constante: 'Pedro, na época um senhor não estava assim sentado!'; 'Pedro não deves dizer 'você', mas sim 'vocemecê'; 'Pedro mantém as costas direitas sempre que te diriges a alguém', etc etc etc...

Ontem dei por mim sentado no sofá do camarim, juntamente com outros colegas actores, enquanto esperávamos pela nossa vez de gravar, em conversas triviais, e regressei àquele tempo de menino pequeno em pijama na sala, de boca aberta, a ver TV. Até a simpática Zézé Motta que nos prendeu ao ecrã a todos lá em casa em 'A Próxima Vítima', estava ali, uns anos mais velha e ia entrar na cena seguinte comigo; bem como a divertida Luíza Tomé de 'Tieta' que o nosso pai nos proibia sempre de ver, por ter cenas menos próprias para a nossa idade. Entre tantos outros que agora estavam ali, comigo, a partilhar o mesmo projecto.

Resta-me dizer que nós portugueses não ficamos, de todo, atrás, no talento e na arte de fazer novela...não temos é metade do orçamento e isso faz uma grande diferença, mais notória em projectos como este. Aqui, novela, faz quase parte do património cultural.

Bem...já me estão a chamar para gravar, lá vou eu.

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