"É uma noite especial, cheia de nervos". Estas foram as primeiras palavras de Maria Elisa Domingues em conversa com os jornalistas após terminar o espetáculo 'Cartas de Amor', na noite de quinta-feira, dia 4 de maio, na sua estreia nos palcos ao lado de Virgílio Castelo no Auditório Taguspark, em Oeiras.

O momento foi único, pois além do apoio de vários amigos amigos e caras muito conhecidas, contou com a presença de um dos grandes do teatro português, Ruy de Carvalho.

"Acho que não foi sequer o melhor espetáculo dos nossos últimos dias, mas acho que isso é normal porque há o nervosismo ligado à presença do público. Mas é uma noite de muita alegria por ter tido aqui, para já, muito amigos e depois grandes referências do teatro. Acho extraordinário que o Ruy de Carvalho tenha a humildade de vir aqui assistir a uma estreia de uma novata. Ele é uma permanente fonte de inspiração e uma lição extraordinária. Comoveu-me imenso a presença dele aqui. E a vida vale a pena por essas coisas", realçou.

Esta era uma peça com a qual a jornalista já andava a 'enamorar-se', tendo-a visto pela primeira vez em Paris, em 1991. Foi acompanhando-a noutros países e, em 2011, decidiu partilhar com o encenador Paulo Sousa Costa o desejo de a interpretar. Um texto de A. R. Gurney que conta com a tradução de Armando Nascimento Rosa. "Foi uma paixão que fui alimentando e achando sempre que isto era um texto que era bom para fazer", sublinhou.

"Pensei que gostava de fazer esta peça e, por outro lado, achei que era relativamente fácil por serem só dois atores e também por ser uma leitura. O próprio autor diz que isto não deve ter muitos ensaios", explicou, frisando que "queria fazer esta peça", pois achava-a "muito bonita".

O sonho de interpretar este texto concretizou-se cerca de 12 anos depois de ter falado pela primeira vez com Paulo Costa, o que levou a que, diz, a certa altura achasse que já não iria concretizá-lo.


© Yellow Star Company

"Achei sempre a peça muito interessante, acho que o Paulo arranjou a versão mais difícil para os atores de tudo o que vi. As outras seguem muito mais à letra as indicações que o autor deixou em 1989, quando a peça foi publicada. São duas pessoas a ler cartas lado a lado e quase sem exteriorizar", comentou, partilhando ainda que o encenador "nunca viu a peça fora daqui" e, por isso, "não ficou contaminado por nenhuma das encenações" que Maria Elisa viu.

"Não sei se as pessoas perceberam, mas eu estou morta, já entro morta. E é a razão pela qual não me levanto. O Virgílio levanta-se e eu não. Eu venho do céu, sou um espírito aqui, e não tenho muita experiência de saber como é que se comportam os espíritos. Portanto, é uma personagem que é completamente diferente de mim. É um grande desafio, sem dúvida", detalhou.

Esta aventura acontece ao fim de 40 anos de ter feito o conservatório e aos 72 anos de vida. "É um risco, mas acho que é um risco de certo modo calculado. A minha vida não depende agora desta nova carreira. Se existir, ótimo", confessou, explicando depois que para partir noutra aventura no mundo do teatro tudo dependeria da peça.

"Acho que as pessoas para envelhecerem bem precisam de se desafiar e fazer coisas novas. Há estudos que dizem que é excelente para a cabeça aprender uma língua nova, como não me apetece ir aprender mandarim ou coisa assim, as outras básicas já falo... Isto é uma coisa completamente diferente. Obviamente que saí da minha zona de conforto, da minha maneira de preparar as coisas. É uma coisa completamente diferente, não ia jogar com as emoções a fazer uma entrevista, pelo contrário. Isto é quase o exercício oposto. Aqui o que tenho de mostrar é emoções o tempo todo", realçou.

'Cartas de Amor'© Notícias ao Minuto

Por sua vez, Virgílio Castelo, que começou este projeto há cerca de três meses, estando com outra peça em mãos ao mesmo tempo, referiu que Maria Elisa não é propriamente uma estreante.

"Embora seja estreante em teatro, ela tem o curso do Conservatório, portanto, tem a formação, e depois tem a relação com as câmaras, com o público", explicou. "Agora foi uma questão de adaptação a este veículo que é o teatro, mas acho que não se nota nada que seja uma estreante. É alguém que está à vontade e que tem uma excelente comunicação com o público", enalteceu.

Questionado pelo Fama ao Minuto sobre se este 'Cartas de Amor' o levou a recuar no passado, o ator não hesitou: "Recua-se sempre".

"Nós não podemos decorar o texto - a não ser aquela carta que eu li - mas tem de se interpretar, tem de se estudar, mesmo não decorando, e ao interpretar tem de se ir buscar emoções. E as emoções são aquelas que nós passamos - as alegres e as menos alegres, quando deixamos alguém, quando somos deixados. Está lá tudo", fez sobressair, realçando depois o trabalho enquanto ator.

"Aqui o trabalho é mais do ator no sentido de encontrar qual é a memória afetiva quando eu vivo uma determinada coisa - quem é que foi que me disse isto, ou a quem é que eu disse isto", explicou.

E será que já escreveu alguma carta de amor como as que leu durante a peça? "Há de todos os géneros", respondeu, entre risos, contando também que guarda as suas cartas de amor num baú.

Aos 70 anos de idade, 50 de profissão, e destacando também a presença de Ruy de Carvalho que aos 96 anos continua a ser uma inspiração, Virgílio Castelo partilhou que "enquanto houver saúde" irá continuar com a sua carreira. "Pertenço ao grupo do não me queixo em relação a nada", terminou.

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