Aos 23 anos, Telma Madeira representou Portugal no concurso Miss Universo, conseguindo ficar no top 16, uma verdadeira vitória para o país tendo em conta que na competição participaram 84 mulheres de diferentes países.

A jovem de Póvoa de Varzim revelou-se um exemplo de superação, depois de ter vencido uma depressão, causa que fez questão de levar ao palco da 71.ª edição da competição.

Telma começou a participar nos concursos de Miss aos 17 anos e, desde então, fez um percurso que a deixa de coração cheio. O Miss Universo, conta-nos, foi o encerramento deste capítulo na sua vida.

Como é que tem lidado com toda esta exposição?

Não achava que ia tomar as proporções que tomou até porque os concursos de Miss não são falados há muitos anos em Portugal e foi uma cultura que se foi perdendo. Quando terminou o Miss Universo e toda a gente soube que eu tinha ficado no top 16 comecei a ver muita gente a partilhar as minhas coisas, tanto de Portugal como de fora.

O meu intuito nos concursos sempre foi levar Portugal o mais longe possível, mas achei que não levariam isto tão a sério. Fico mesmo muito feliz.

Em pleno século XXI o ser bonito é algo muito superficial

Há a ideia de que as mulheres que participam nestes concursos são perfeitas. Contudo, a Telma quis descontruir este conceito.

Sim. O meu intuito nos concursos foi sempre tentar mostrar às mulheres que queiram ter uma oportunidade como eu tive que é possível. Se trabalharmos arduamente para atingir os nossos objetivos é muito mais simples do que aquilo que parece. Já faço concursos desde 2017. Fui ao Miss Earth, um dos três maiores concursos a nível mundial e fui a primeira portuguesa a classificar-me no top 8 das mulheres mais belas da terra.

Quando cheguei ao top 16 da Miss Universo fiquei muito feliz porque não só focaram nisso, mas em toda a história por trás, por dizerem que trabalhei muito para atingir o meu objetivo.

Além disso, não posso ser o exemplo da mulher perfeita, porque tenho os meus defeitos, tenho coisas que também não gosto tanto em mim e isso é normal. Esse estereótipo tem de ser descontruído. Em pleno século XXI o ser bonito é algo muito superficial.

Telma Madeira desfila no concurso que aconteceu em Nova Orleães © Getty Images

Para uma jovem que esteja a ler esta entrevista e tenha o sonho de chegar ao concurso de Miss Universo, o que tem de fazer?

No meu caso não tive uma preparação de seis meses, mas de anos, porque já faço concursos desde 2017. O Miss Universo foi o meu quarto concurso internacional, portanto, tenho uma experiência muito alta.

[A jovem que queira] Tem de se inscrever no site da CNB e está lá o Miss Portugal Universo e depois de preenchido os requisitos será chamada para o primeiro casting e aí pode ou não ser selecionada para a grande final.

No meu caso foi ligeiramente diferente. Fui apontada como Miss Portugal Universo porque ficamos com a franquia no ano passado e não tinham tempo para fazer um concurso, então devido à minha classificação em concursos nacionais fui apontada.

O que eu não queria era que elas olhassem para mim de uma forma muito competitiva e pensassem que eu as queria tramar

Como é que se dão as candidatas nos bastidores?

Não senti muita pressão da competição. De todas as minhas experiências internacionais posso dizer que esta [Miss Universo] foi a mais fácil para mim. Disse sempre que queria ser amiga das outras candidatas e que não valia a pena estar a colocar pressão em mim mesma ou até a comparar-me. Tenho as minhas qualidades, a minha preparação e a minha experiência. O que quis fazer foi não me rebaixar ou comparar. Não queria era que elas olhassem para mim de uma forma muito competitiva e pensassem que eu as queria tramar. Posso dizer que estava mesmo feliz e quando entrei no top 16 viu-se no olhar das outras candidatas que ficaram felizes por mim.

Telma Madeira entre as várias candidatas do concurso © Getty Images

Fala com algumas das candidatas ainda hoje?

Já conhecia uma delas do Miss Earth, a Miss Filipinas, e fiquei amiga da Miss Polónia e da Miss Costa Rica, que era a minha colega de quarto.

Há alguma técnica ou truque para não se ficar nervosa quando se sobe ao palco?

No Miss Universo é muito interessante porque as pessoas acham que nós entramos para a grande final e parece que é a primeira vez que estamos a fazer aquilo. Não. Na realidade nós já repetimos aquilo para aí umas quatro/cinco vezes, portanto quando subimos a sexta vez ao palco é para fazer exatamente a mesma coisa.

Não me sentia nervosa, já tinha várias experiências e o facto de termos muitos ensaios faz com que nos sintamos mais à vontade. O público é simplesmente incrível, estão a dar-nos força, vivem aquilo tanto como nós.

Quando entrei em palco para ser chamada ao top 16, sabe o que é que pensei? Até aqui fiz tudo o que podia ter feito, daqui em diante já não posso fazer nada. Vou só desfrutar do momento.

Quando ela disse 'Portugal' eu pensei... 'ela não se enganou?'. Depois comecei a chorar, fiquei muito emocionada
Telma Madeira no concurso do Miss Universo © Getty Images

Este foi um momento que quando era adolescente estava longe dos seus planos...

Quando começaram a ser chamados os outros países, aí é que olhei à volta e pensei: 'Meu Deus, estou mesmo a participar no Miss Universo'. Até ao último momento, antes de ser chamada, achei que poderia não entrar, não por aquilo que eu fiz, mas não queria ter aquela expectativa e depois chegar ao final e desiludir-me a mim e às pessoas do meu país.

Só o facto de estar ali fazia de mim uma vencedora. Se falasse com a menina que eu era com 15 anos, nunca imaginaria que estaria ali. Quando ela disse 'Portugal' eu pensei... 'ela não se enganou?'. Depois comecei a chorar, fiquei muito emocionada.

Posso dizer que a minha maior motivação foram os concursos de Miss e foi a partir daí que deixei de estar doente

Levou a causa da saúde mental ao Miss Universo. Porquê esta escolha?

Infelizmente a nossa sociedade está cada vez mais depressiva e ansiosa, penso que cada vez mais o futuro vai exigir de nós. Também passei por um fase de depressão e ansiedade e o Miss Universo procura uma mulher que tenha uma voz ativa no próprio país e que possa vir a ter uma voz ativa a nível internacional.

Quis expor a minha história e tentar ajudar outras mulheres, outros jovens, a superarem-se a eles mesmos, porque eu consegui superar-me. Consegui deixar de estar doente para acreditar em mim mesma. Hoje em dia isso é muito difícil, porque as pessoas não encontram uma motivação na vida delas.

Posso dizer que a minha maior motivação foram os concursos de Miss e foi a partir daí que deixei de estar doente.

Levei essa causa para o Miss Universo porque quis que toda a gente do mundo, através desta plataforma, soubesse que a Miss Portugal de 2022 já esteve numa fase muito má e hoje em dia conseguiu estar no palco.

A minha maior causa vai ser sempre a saúde mental e mesmo depois da Miss Universo vou continuar a trabalhar porque quero ajudar outras pessoas a superar esta doença silenciosa
Telma desfilou com uma capa criada por membros da Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPACDM) de Ponte de Lima © Getty Images

É uma causa interessante. Quem olha de fora para uma pessoa como a Telma, dada à sua beleza e sucesso, não associa de imediato que possa estar deprimida ou ter enfrentado problemas ligados à saúde mental. É o quebrar do estigma.

Não há vidas de sonho. Por muito que aquela pessoa esteja a viver o seu sonho, isso também vai acabar. Temos de nos agarrar ao que temos de bom na nossa vida e o que tive foram os concursos de Miss e foi isso que usei para conseguir sair de uma depressão.

Claro que o meu exemplo não se aplica a toda a gente, mas só o facto de no final das entrevistas ter pessoas a virem falar comigo a dizerem-me 'olha, estou a passar por uma fase má, o que fizeste para te conseguires superar?'. Tento motivar essas pessoas a algo que gostem mesmo de fazer. Seja desporto, cozinhar, simplesmente dar uma volta ao lado da praia, etc.

A minha maior causa vai ser sempre a saúde mental e mesmo depois da Miss Universo vou continuar a trabalhar porque quero ajudar outras pessoas a superar esta doença silenciosa.

Para alguém que já fez quatro concursos internacionais vai haver sempre o bichinho de fazer mais e mais, mas acho que tinha de finalizar a minha carreira no Miss Universo

Como se vê no futuro?

Não vou mentir. Para alguém que já fez quatro concursos internacionais vai haver sempre o bichinho de fazer mais e mais, mas acho que tinha de finalizar a minha carreira no Miss Universo. Estava destinado, não tenho de mostrar nada a ninguém, apenas a mim mesma. Aquilo que tinha de fazer pelo país e por mim já o fiz, está na altura de dar oportunidade a outras meninas. Não quero mais e espero não querer, porque é muito difícil dizer que não [ri-se de nervoso, enquanto fala sobre o assunto].

Gostava de ter o meu próprio negócio e de trabalhar na área televisiva, enquanto apresentadora. Já apresentei vários eventos do Miss e por isso gostava de explorar essa área, mas vamos ver.

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