O navio aproxima-se da ilha de Santorini, o primeiro porto de paragem do cruzeiro Celebrity pelo Mediterrâneo, ziguezagueando pelos ilhéus de Nea Kameni e Palea Kameni ,que foram criadas pela grande erupção do seu vulcão, há cerca de 3500 anos.
Foi este fenómeno vulcânico que esteve na origem desta maravilha da Natureza que o Homem soube engrandecer. Foi também por ele que nasceram grande parte das lendas que ainda hoje rodeiam de magia estas ilhas, a maior das quais é a que aqui situa a terra perdida dos Atlantes.
Santorini, cujo nome vem de Santa Irene, nome dado durante a ocupação veneziana, é a ilha mais emblemática de toda a Grécia. Quem a visita percebe as razões para tal posição, e simultaneamente não entende o porquê da ilha ainda não estar (ainda espera-se) integrada na lista de locais Património da Humanidade da UNESCO. Já os gregos antigos a chamavam de Kallíst?, que significa “a mais bela”. Outros nomes se seguiram, Strongýl?, "a circular", e finalmente Thera ou Thira, nome em grego que ainda possui.
Apesar de ter uma origem científica, Santorini, como tantas outras coisas na Grécia, tem também uma dimensão mitológica. Rezam as lendas que a ilha teria sido criada por Eufemo, um dos argonautas que percorreu o Egeu em busca do tosão de ouro a bordo do Argo. Eufemo teria atirado ao mar um pedaço de terra que lhe havia sido oferecido por Tritão, um deus marinho filho do grande Poseídon. Acreditando ou não na mitologia grega, estar naquele ambiente acaba por inevitavelmente libertar a imaginação de quem visita Santorini, que nem que seja por simpatia e para entrar no mood da ilha acaba por lhes ter alguma simpatia. É como se Santorini fosse uma enorme sereia que com a sua beleza atrai os visitantes até estes cairem na sua rede de encanto, como em tempos imemoriais as sereias descritas na Odisseia de Homero fizeram a Odisseu e aos seus marinheiros.
Outra das lendas que envolve Santorini numa aura de mistério é a da Atlântida, esse reino perdido debaixo do mar que foi pela primeira vez descrito por Platão nos seus diálogos de Timeu e Crítias. Nesses textos, Platão descreveu Atlântida como uma ilha imensa, um verdadeiro continente, a partir do qual uma confederação de reis de grande poder havia chegado a conquistar muitas ilhas e terras continentais. Depois de uma tentativa frustrada de invadir Atenas, Atlântida afundou-se no mar “num só dia e noite de infortúnio”. A evidência histórica para suportar esta lenda é nula. Platão ficou aliás famoso por incorporar lendas para dar um maior estilismo às suas crónicas, neste caso para substanciar a sua idílica “República”. Terá sido já nos séculos XIX e XX que a lenda da Atlântida ganhou visibilidade, fosse pelo seu carácter utópico e romântico, fosse pela riqueza mitológica que inspirou filmes, livros e até bandas desenhadas. Quem visita Santorini não encontra qualquer vestígio arqueológico que comprove a existência da Atlântica ou, admitindo a improbabilidade de a mesma ter existido, a sua localização nestas ilhas (também os Açores reclamam essa possibilidade). Apesar disso os ilhéus fazem desta lenda um dos temas transversais da oferta turística da ilha, o que é perfeitamente legítimo e até lhe dá uma profundidade que é bem-vinda.
Mais que pelas suas lendas e histórias, Santorini vale pelo enquadramento natural e pela intervenção humana na paisagem, que se adaptou à morfologia do terreno, às características climáticas e de solo, para criar uma forma de vida possível naquele território inóspito. Uma das mais evidentes belezas de Santorini é a sua arquitetura, ou melhor, a maneira como a arquitectura se moldou para poder conviver com as escarpas da ilha. As casas debruçadas sobre o vazio são sem dúvida uma das maiores maravilhas da ilha, não só porque revelam o engenho construtivo dos habitantes que ao longo dos séculos as foram incrustando na parede rochosa, mas também porque daí se tem uma das vistas mais deslumbrantes de todo o planeta, sobre a caldeira e o mar infinito. As casas são invariavelmente caiadas debranco, na mais pura tradição grega, que tendo objetivos térmicos, acaba por oferecer uma harmonia estética que faz das paisagens urbanas das ilhas gregas um postal ilustrado de um romantismo ímpar. Aqui e ali, as cúpulas azul cobalto das igrejas e das portas quebram a monotonia do manto branco das casas, pontuando de cor o cenário.
A paisagem oferecida do cimo da montanha que corre longitudalmente ao longo da ilha é especialmente enfentiçante no pôr do sol, quando o astro rei se vai deitando atrás da parede do vulcão agora adormecido. É para assistir a este espectáculo totalmente natural que todos quantos visitam a ilha se espalham pelos miradouros, cafés e restaurantes das duas principais povoações de Santorini, Oia e Fira. Todas as palavras são parcas para descrever a potência visual desses momentos. O ocaso do sol não marca o fim do espectáculo, apenas determina o momento em que os olhares se viram do mar para terra, onde as luzes das casas começam a luzir como estrelas na noite, criando um cenário mais humanizado e teatral que o anterior mas igualmente avassalador. Há algumas coisas que todos devemos fazer antes demorrer, ver as vistas do pôr-do-sol e da noite e em Santorini é sem dúvida uma delas.
As vistas oferecidas pela caldeira são o ex-libris da ilha, mas não são o seu único atrativo. Outras jóias incluem os passeios pelas ruas labirínticas de Oia, as compras nas lojas de Thira, o pequeno porto de Ammoudi, ou as praias de Akrotiri e Monolithos. Santorini tem ainda como ponto de interesse o seu vinho tradicional, feito com a casta autóctone Assyrtiko. As vinhas são muito antigas, e resistiram àepidemia de filoxera que atacou a Europa no século XIX. O vinho produzido dá pelo nome de Vinsanto, nome que ainda evoca a passagem dos venezianos pela ilha. É um vinho doce e forte, feito com uvas secas ao sol. É um vinho tão único como a ilha aonde nasce, e que é um verdadeiro paraíso no meio daquele que é possivelmente o mais extraordinário arquipélago do Mundo, as Cíclades.
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