A La Redoute começou, em Portugal, como um catálogo de vendas por correspondência. Mas de que forma evoluiu desde esse momento até à atualidade?

De facto, a La Redoute é uma marca muito acarinhada pelos portugueses, que já está no país há 36 anos. Esse carinho advém muito do famoso catálogo que recebíamos em casa e que era esperado com alguma ansiedade. E durante muitos anos, foi uma marca conotada com o têxtil e com a moda. A empresa evoluiu muito ao longo destes anos. A partir de 2008, 2009, começou um processo de digitalização muito forte e o papel deixou de existir na empresa. O famoso catálogo não existe desde 2015 e em paralelo com toda essa modernidade tecnológica que nos foi acompanhando, também fomos evoluindo na abordagem com o consumidor e na estratégia.

Hoje o nosso foco é muito o lifestyle e um lifestyle à volta do mundo da casa. De facto, essa estratégia, que arrancou por volta de 2014, traduz-se no presente com o aniversário, em setembro, de 10 anos de lançamento da La Redoute Interieurs, que é uma marca mais “mass market” e que já começa a ter um peso significativo dentro da nossa atividade.

Como define a relação dos portugueses com a marca La Redoute Interieurs que está a celebrar 10 anos?

É importante salientar que em Portugal, o arranque da área da casa, de uma forma bastante efetiva, inicia-se a partir de 2018, 2019. É evidente que com o COVID-19, acelerou ainda mais, mas já estávamos a ver isso anteriormente. Para além da La Redoute Interieurs já tínhamos outra marca premium há muito tempo, a AMPM, que também já tinha um peso significativo. O lifestyle, para nós, o mundo da casa, também está muito associado a tudo que é o têxtil-lar como um produto muito forte. E porquê? Somos uma marca que comercializa muitos produtos fabricados em Portugal, no Vale do Ave, sempre tivemos a Lameirinho e outros, parcerias que continuamos a ter. As pessoas compravam na La Redoute, porque o que vendíamos era produzido cá. Sabemos que temos nessas áreas um verdadeiro know-how e sabedoria. E de facto, queremos mostrar ao consumidor português que a nossa grande prioridade é o mundo da casa, é o nosso eixo principal. Posso dizer-lhe que 2/3 das vendas são feitas no panorama da casa. É uma estratégia que tem dado os seus frutos e onde vamos continuar. Hoje queremos apostar mais em comunicação para que as famílias portuguesas, quando pensarem em adquirir alguma coisa para casa, se lembrem que a La Redoute também é um ator onde podem encontrar produtos.

Se 2/3 das vossas vendas são feitas nesta área quer dizer que o foco dos consumidores deixou de estar na moda?

Sim, por dois motivos. O primeiro é que as pessoas também compram menos roupa. Quando vemos a análise de um cabaz por parte do INE (Instituto Nacional de Estatística), vemos que os portugueses compram menos têxtil e isso tem sido uma tendência que se tem acentuado ao longo dos anos. É verdade que, atualmente, conceitos de segunda mão, como a Vinted, vieram reforçar a sustentabilidade. O segundo é a própria marca La Redoute, ter vindo a apostar mais nessa área da casa.

Temos uma legitimidade porque somos também criadores. Na sua grande maioria, as peças são produzidas pelos nossos designers, tirando algumas parcerias que evidentemente fazemos e continuaremos a fazer. Mas são coleções nossas que vão ao encontro daquilo que o consumidor quer um pouco por toda a Europa.

Os consumidores estão cada vez mais atentos à sustentabilidade. Como é que a La Redoute tem trabalhado essa questão em termos de produção e logística? Têm equipa em Portugal?

Temos um conjunto de designers internos e externos que trabalham para nós e, curiosamente temos muitos que não são portugueses, mas que residem em Lisboa, como é o caso do Sam Baron, que passa uma parte do ano cá. Em termos de produção, tentamos fazê-lo na Europa para servir mais rapidamente o cliente e também porque há um conjunto de normas éticas em termos de algodão, madeiras, tintas, normas de qualidade, que são imperativas para a satisfação do consumidor. Há muita coisa que é comprada em Portugal. Gostávamos de comprar muito mais, mas nem sempre é possível. Tudo o que é feito e produzido é colocado em armazéns centrais que depois é distribuído, para o consumidor final.

A que se deve o crescimento da La Redoute Interieurs, sendo exclusiva no digital?

O crescimento acontece porque os operadores da distribuição que nós temos connosco são muito eficientes. Nós fazemos entregas com dois motoristas. Não fazemos entregas do móvel numa porta, mas sim na própria casa. Também temos serviços de montagem, temos devolução gratuita. Ou seja, há todo um conjunto de serviços que vêm ajudar o consumidor e que fazem com que, uma compra que pode parecer complexa, se torne em algo muito mais simples.

No contexto de uma empresa como a La Redoute, que tem uma forte presença online, como se mantém competitiva num mercado cheio de players?

De duas formas. Primeiro, a compra digital tem de ser uma compra semelhante a uma compra física. O que é que eu quero dizer com isto? O cliente muitas vezes quando vê um produto numa loja física também não o leva logo. Muitas vezes as marcas dizem que o cliente só vai receber o que comprou daqui a 15 dias, três semanas. Nós entregamos mais depressa. No espaço de uma semana temos o produto em casa do consumidor.

Segundo, se o nosso processo de entrega é fácil, também temos de facilitar tudo o resto. Os meios de pagamento, em que o cliente pode pagar em prestações, se não quiser o produto por qualquer motivo, pode devolver gratuitamente. Ou seja, a complexidade é reduzida ao máximo. E depois, temos de ter um estilo e é aí que está a diferença, o estilo que nós queremos. O design varia de acordo com as nossas diversas linhas. Temos um design mais latino, mais quente, porque claramente, temos um ator extraordinário que domina tudo, em todos os países, não só em Portugal. Nós queremos oferecer coisas diferentes.

E como conseguem marcar essa diferença?

Vou dar um exemplo. Nós temos uma linha chamada Les Ingénieux, os engenhocas, em que temos um conjunto de produtos práticos, como uma mesa sala que serve também para escritório, com arrumações. Depois do COVID, a casa deixou de ter só um objetivo. Já é, para muita gente, um escritório e também começámos a recebemos mais as pessoas. A casa passou a ter uma relevância no nosso quotidiano muito diferente do pré-COVID e isso levou a que a valorização e a procura de estilo seja feita de uma forma diferente. É evidente que nós temos muito para conquistar no mercado dos jovens abaixo de 25 anos, até 35, mas nos segmentos 35-55 estamos bem, até porque são faixas etárias com maior poder de compra, que procuram outras coisas e que estão em etapas de vida diferentes. E é de facto nisso em que nos esforçamos: criar soluções para as pessoas, que sejam diferentes daquilo que vão encontrar em outros lugares.

E não terão a tentação de baixar um pouco os preços para conquistar esse público ou não é essa a estratégia?

É evidente que num mercado como o português, nós pecamos pelo preço. Sabemos que a qualidade é boa e temos ainda algumas promoções que vêm ajudar a compensar isso. Mas estamos totalmente cientes que o preço é um dos grandes desafios que temos pela frente.

Quais são os produtos mais procurados?

O mais tradicional são as camas, os sofás, os aparadores e as cadeiras. Mas também temos uma quota interessante nos tapetes.

Como é que uma marca centenária consegue continuar relevante na era do digital?

Quando em 2008 decidimos enveredar pelo digital - fui eu que liderei esse processo aqui em Portugal - o objetivo inicialmente era conquistar novos clientes, porque o catálogo tradicional, no mundo inteiro, estava a perder relevância. E para buscar novos clientes tínhamos de usar alguma coisa digital, mais moderna. Mas não foi o que sucedeu. É verdade que conquistámos novos clientes, mas aqueles que nos conheciam começaram, do nada, a usar a internet. Todos sabem, e muito bem, que já estamos cá há muitos anos e estamos continuamente à procura de nos reinventar.

Portanto, a primeira etapa foi passar para a internet e a segunda foi passar para o smartphone. O mobile hoje acompanha-nos e temos até uma app que ajuda a puxar pelas nossas vendas, porque o smartphone é a continuação da nossa mão, não conseguimos viver sem isto. Mudámos os objetivos da empresa, mas sempre em prol do consumidor. Trabalhámos muito o serviço para que ele não se sentisse penalizado. Antes do COVID, evoluímos para o conceito de lifestyle com uma preocupação muito grande à volta da família, que se mantém até hoje.

A pandemia foi benéfica?

Foi benéfica no sentido em que alargou os horizontes de muitos consumidores que vieram experimentar, que nos conheciam no passado, e que tiveram a necessidade de consumir digitalmente. E sabiam que connosco o risco, seguramente, seria menor e isso recolocou-nos no “top of mind” de muitas pessoas.

Havia um certo preconceito em comprar móveis pela Internet que a pandemia ajudou a quebrar?

Havia seguramente, por causa do risco. Mas a própria oferta presente no mercado evoluiu muito. Antigamente, os meus pais iam mandar fazer os móveis a Paços de Ferreira e esse conceito mudou. Atualmente, se formos a ver, há muitos conceitos interessantes, mas muito localizados. E nós estamos aqui para democratizar e massificar.

Também já não se compram móveis para a vida toda, como os nossos pais fizeram.

O nosso ciclo de vida mudou muito: há casamentos, mas também há divórcios, famílias que se juntam em que há filhos de outros casamentos. Ou seja, o conceito de família evoluiu para padrões que no tempo do catálogo eram tabus e que hoje são o quotidiano. A realidade é que já ninguém está a pensar em comprar móveis para a vida. Antigamente isto era impensável, a casa dos meus pais é a mesma há 40 anos. Agora estamos sempre a querer mudar. Mas é óbvio que as pessoas não têm a mesma rotação de compra nos móveis, como tinham na roupa. Isso obriga-nos a reinventar, a estar sempre à procura e à conquista de novos consumidores, coisa que não era tão necessária no têxtil.

Que balanço faz destes 10 anos de La Redoute Interieurs?

Muitos bons e temos crescido continuamente. Nós sempre tivemos como meta o consumidor final, mas também passámos a ter o consumidor profissional, que chamamos de Business to Business(B2B). Fazemos muitos projetos para hotéis, para alojamento local, sobretudo em Portugal. Temos trabalhado com muitos projetistas, muitos arquitetos, para oferecer linhas diferentes. E isso também vem consolidar a nossa estratégia à volta do mundo da casa.