Alexandre Saldanha da Gama, licenciado em engenharia zootécnica pela Universidade de Évora, frequentou o curso de feng shui do Instituto Macrobiótico de Portugal (IMP) em 2000, área à qual se tem dedicado desde então. Com base na sua experiência em organização de espaços, aliada à pesquisa no âmbito do chi, energia universal, tornou-se consultor de feng shui, realizando projetos, seminários e ateliers sobre o tema. Participou como decorador no programa televisivo «Querido, Mudei a Casa» e é autor do livro «Feng shui @ Lares e Costumes Portugueses», publicado pela Editorial Angelorum Novalis. Em entrevista, dá dicas e conselhos.
Quais os princípios do feng shui?
Organização do espaço de uma forma harmoniosa, de maneira a podermos tirar o melhor partido dele. Muitos pensam que transformar um espaço segundo o feng shui é torná-lo zen, mas não é assim. Na verdade, não há uma regra universal, tudo é organizado em função da finalidade. Uma área de lazer poderá ser mais tranquila ou não. Em casa, podemos ter uma sala mais tranquila e outra dinâmica para receber amigos.
Pode ser encarado como o lado mais espiritual de um espaço?
Há quem o considere uma filosofia ou arte. Eu chamo-lhe disciplina porque é um conjunto de técnicas para a boa organização do espaço. Tal como há pessoas que interpretam os sinais do corpo humano, no feng shui interpretamos os sinais da casa e comparamos as características do local e o tipo de vida da pessoa.
Como podemos localizar as energias presentes em casa?
Há zonas com qualidades de energia diferentes. A fachada sul é mais dinâmica enquanto a norte é mais estagnada, não permite ter os horizontes abertos. No lado crescente, temos uma energia ascendente e no lado poente o inverso, uma energia de recolhimento. Assim, visto que o sul é mais dinâmico podemos defini-lo como zona social e optar pela área norte, mais tranquila, para um quarto.
Qual a importância dos elementos da natureza?
A água, árvore, fogo, terra e metal são os cinco elementos da natureza e aqueles que definem as quatro direcções. A norte, temos a água, a tranquilidade. A nascente, temos a energia árvore, estimulante. A sul, o fogo, energia da expansão. A poente, temos a energia metal, do recolhimento. Ao centro está a terra, a energia da segurança.
De que forma podem ser aplicados na decoração?
Numa casa que tenha dois ou três quartos pode escolher, segundo os elementos, qual será o ideal para dormir, servir de escritório ou de quarto das crianças. Por exemplo, no quarto de casal a energia terra promove a tranquilidade, segurança e proteção. Num quarto de criança, escolheria a energia árvore, mais dinâmica.
Veja na página seguinte: É possível equilibrar as energias quando a planta da casa não é favorável?
É possível equilibrar as energias quando a planta da casa não é favorável?
Há combinações entre energias. Sabemos que a água com o fogo gera conflito, mas se colocar a energia árvore pelo meio já harmoniza, porque a água alimenta a árvore e a árvore o fogo. Por exemplo, na casa de banho a energia é água. Se estiver a sul (área do fogo), cria um desequilíbrio na casa e na vida. O fogo está associado ao lado social e em contacto com a água enfraquece. Podemos corrigi-lo com a decoração, introduzindo o elemento árvore (plantas), reforçando o fogo (velas) ou pelas cores dos têxteis.
Que estilo é mais harmonioso?
A decoração moderna e minimalista tem impacto visual mas é mais fria e a energia corre bastante. O estilo clássico dá-nos a sensação de estabilidade. Mas tudo depende do espaço e da fase da vida em que nos encontramos. Em jovens, preferimos algo moderno e arrojado e à medida que amadurecemos procuramos um ambiente tranquilo, marcado pelas madeiras e tecidos.
Quais são os materiais mais indicados?
Os materiais naturais, nomeadamente madeira autêntica, palhinha, papel, algodão ou linho. Enquanto as fibras naturais têm uma energia próxima da nossa, tudo o que é sintético (plástico, acrílico ou vinil) pode ter energias desequilibradas que, em vez de nos ajudarem, perturbam-nos.
O que pensa da moda de pintar uma parede de uma cor distinta?
Ao pintarmos só uma parede, criamos um desequilíbrio. A atenção é dirigida para um dos lados, seja porque a cor é mais forte e atrai-nos ou mais escura e desvia o olhar para a parte com luz. Pode ser positivo em áreas com formas irregulares ou mal distribuídas. Essa parede funciona como moldura. Deve ficar à nossa frente quando entramos mas, seja no quarto ou sala, confere mais harmonia se ficar numa zona para a qual não estejamos sempre a olhar. O mesmo se aplica ao papel de parede com padrões, que cria dinâmica mas torna-se confuso se pretendemos calma.
Como podemos fomentar a intimidade no quarto?
No quarto de casal, aplicamos a simbologia dos pares, representada por duas mesas de cabeceira idênticas. O uso de modelos diferentes indica que o casal não vive a relação de igual forma, há um desfasamento e um sente-se mais apoiado do que o outro. Se tivermos simetria (duas mesas e candeeiros iguais), há mais equilíbrio. Depois pode pôr velas, flores, joias, imagens sedutoras ou do corpo humano, que estimulam a intimidade.
O posicionamento da cama é importante?
Sim. A cama deve estar na parte mais recolhida e sempre de maneira a que consiga ver a porta. Se imaginarmos um traço que une a porta e a janela, vamos tentar que a cama não fique nesse ângulo ou que, pelo menos, não abranja a cabeça. Isto porque a linha entre a porta e a janela é mais dinâmica.
Veja na página seguinte: O que torna a cozinha mais harmoniosa?
O que torna a cozinha mais harmoniosa?
Antes de mais, separar a parte onde se trata da roupa e da comida. A zona da preparação dos alimentos (lava-louças e fogão) possui elementos opostos (água e fogo) que também não devem estar juntos. A cor pode depender da localização da divisão, contudo, os amarelos e laranjas são boas opções, porque estimulam o prazer com os alimentos.
Os eletrodomésticos podem interferir no nosso equilíbrio?
Há um campo eletromagnético no corpo que pode ser afetado. No entanto, podemos ter precauções, como não ter televisão no quarto ou o telemóvel na mesa de cabeceira e desligar os aparelhos da tomada. Não percebemos que não é só o eletrodoméstico que nos prejudica mas a instalação, pois mesmo desligados os fios continuam em carga.
Quais os erros típicos das casas portuguesas?
Ter um espelho à frente da porta de entrada. O espelho tem imenso potencial, aumenta o espaço, mas também redireciona a energia. Se ao entrarmos em casa encontramos logo um espelho a energia volta para trás. Não significa que não o possa ter no hall, deve é colocá-lo de lado e não na parede em frente. Outro erro é dispôr o sofá de costas para a porta, em vez de estar de lado ou de frente para receber as pessoas. Uma sala em L, com dois sofás nessa orientação é equilibrada. É como se fosse alguém de braços abertos a receber-nos.
Que tradições podem ser consideradas feng shui português?
No Alentejo, o costume de caiar as casas uma vez por ano ou o hábito de fazer as limpezas de primavera. São processos de renovação, formas de trabalhar com a energia.
Como podemos criar um ambiente natural num apartamento?
Sempre que possível devemos ter seres vivos em casa pois aproximam-nos da natureza. Consoante a exposição solar e orientação há pontos mais propícios, mas todas as zonas da casa podem ter plantas. Nuns locais, optamos por espécies altas, de folhagem, noutros por flores. Os catos enquadram-se em ambientes exteriores ou janelas.
Ter animais de estimação em casa é bom para o feng shui?
O animal é fogo, portanto é uma energia dinâmica. É um ser que partilha connosco a casa e pode frequentar qualquer divisão. A decisão de ter um animal deve sobretudo depender das condições que temos para lhe oferecer.
Em termos de energias, o que distingue o cão do gato?
A qualidade de energia do cão é semelhante à nossa e, como o seu instinto é mais desenvolvido, podemos aprender com ele: onde procura estar será um sítio bom para nós. Já o gato tem uma energia oposta e prefere zonas menos positivas. Se vier para o colo, isso revela que temos um desequilíbrio. Ele busca a energia que para nós é nociva mas para ele é boa. É como se fizesse uma cura.
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Consulta de feng shui
Esta consiste numa análise do espaço para identificar o que está bem ou não e como melhorar. Há detalhes que podem ser alterados logo, mas as mudanças de fundo devem ser graduais para não sentir que está numa outra casa. Os preços variam geralmente entre os 50 € e os 1.000 €, em casos excecionais. Em média, a primeira reunião que dura duas horas, ronda os 125 € para um T1.
Texto: Manuela Vasconcelos
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