Dizem muitos especialistas que, no futuro, não só os dispositivos electrónicos estarão todos interligados, como também as nossas casas serão inteligentes e, consequentemente, mais autónomas. Isto mais parece conversa de quem passa muito tempo a ver filmes de ficção científica ou até mesmo num laboratório, como é o caso de algumas das personagens masculinas da série "A teoria do Big Bang", "The Big Bang theory" no original.
Mas não é, assegura Vasco Portugal, o empreendedor português que investiu no espaço de coworking LINNK, em Lisboa. Doutorando do Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos da América, onde esteve envolvido num grupo de trabalho relacionado com a cidade do futuro, este especialista ajuda-nos a esclarecer o que está mais perto da realidade, e o que podemos esperar num futuro próximo.
Com a população mundial a aumentar de ano para ano e com a migração crescente para os centros urbanos que se tem vindo a acentuar nas últimas décadas, as formas de habitar estão a atravessar um momento de mudança. O fenómeno é global, mas é em países como a Índia e a China e em cidades como Nova Iorque e Londres, onde se regista a maior procura por soluções mais funcionais e intuitivas para casas pequenas.
Esta tendência exige que o espaço em que vivemos seja otimizado, em conformidade com as nossas necessidades, no sentido de maximizar o tempo de utilização dessa mesma área. Assim, a arquitetura, a engenharia e a decoração de interiores devem trabalhar em simbiose, porque todas contribuem ativamente para a forma como usufruímos da nossa casa, com os residentes a ter um poder crescente no design do espaço para viver.
App que antecipa gostos e necessidades
No grupo Changing Places do MIT, em que Vasco Portugal trabalhou, está a ser desenvolvida uma aplicação chamada City Home que simula uma reunião entre um arquiteto e um potencial residente. De acordo com o perfil dos possíveis compradores, os seus gostos pessoais e estilos de vida (que são obtidos através de redes sociais e questionários), a aplicação sugere soluções para as suas necessidades.
E também permite que a pessoa personalize desde os acabamentos, à iluminação aos equipamentos eléctricos e funções de cada móvel. No fundo, é a aplicação do conceito de arquitetura modular ao interior da casa só que com um funcionamento mais futurista. Por outro lado, já existem casas pré-fabricadas (em aço-corten ou madeira) que são divididas em módulos, permitindo desfrutar de um espaço pequeno de forma mais eficaz, sem sacrificar a funcionalidade. E também é uma maneira de ter várias opções sempre que quer mudar a decoração ou quando a família dá as boas-vindas a um novo membro.
Com paredes amovíveis e mobiliário integrado, como se estima que se venha a verificar de uma forma cada vez mais insistente em diferentes partes do mundo, o processo ainda é mais facilitado, tornando a vivência do espaço mais flexível. E mais! No futuro, a iluminação e os móveis serão controlados com gestos, e as paredes deverão reconfigurar-se de acordo com as necessidades do indivíduo automaticamente.
"Chamamos a isto o robot wall, uma parede que podemos controlar através de botões que lhe indicam em que divisão se deve transformar", clarifica Vasco Portugal, que acrescenta que "é a parte humana que faz o projeto de difícil resolução, porque as pessoas são imprevisíveis", refere. Em muitos países, são muitos os especialistas que, nos últimos anos, também vieram a público defender a mesma teoria.
Rede inteligente
O nosso futuro está prestes a ficar ainda mais conectado, com os carros a avisarem os termostatos quando estamos a chegar a casa e com as luzes a passarem a vermelho sempre que é detetado monóxido de carbono no espaço envolvente. Nesse futuro, que está mais próximo do que pensamos, as casas vão ser (ainda mais) inteligentes graças a uma rede que vai interligar desde os móveis aos equipamentos à parte sensorial.
"A complexidade está em ligar isso tudo, porque agora os cabos que temos em casa não passam informação nem dados", explica Vasco Portugal. Inclusivamente, alguns dispositivos só no início da década de 2010 é que começam a trabalhar bem. O Wi-Fi, um bom exemplo disso, será a chave para a casa inteligente trabalhar bem. Em 2013, apenas 62% da população portuguesa tinha ligação à internet em casa. Hoje, é diferente.
Outros desafios para a(s) casa(s) do futuro
Para apoiar o futuro interconectado, esta tecnologia terá de ser mais rápida e confiável. A banda larga deverá funcionar tão bem como o serviço de eletricidade hoje em dia e os routers terão de ser mais fáceis de instalar e de manter. No fundo, para poderem ser considerados inteligentes os aparelhos terão de poder identificar o que está a correr mal e ajudar a corrigir o problema, se não o futuro será frustrante e, possivelmente, perigoso.
Como diz Vasco Portugal, "com uma solução nasce sempre um problema". Entre esses desafios estão os hackers, "que se sentirão atraídos pelo conceito de casa inteligente, passando a ser os assaltantes do futuro. E, além disso, os vírus que trazemos nos computadores também irão causar alguns problemas, já que afetarão o funcionamento correto da casa inteligente", vaticina o especialista. Todos os dispositivos serão alvos de ataques que, agora, não conseguimos prever. Contudo, "essa nunca será a parte limitativa", garante o doutorando do MIT.
A segurança tecnológica terá de ser melhorada, sim, tal como o funcionamento de todos os dispositivos também terá de ser mais intuitivo. Neste sentido, quer a Google quer a Apple têm vindo a desenvolver plataformas destinadas a interligarem os equipamentos elétricos e de entretenimento das casas. Em junho de 2014, a Apple anunciou o software HomeKit, que liga os dispositivos caseiros aos dispositivos da marca.
Também o Nest, que foi comprado pela Google, por 3,2 mil milhões de euros, tem lançado aparelhos que podem ser controlados remotamente, como o Learning Thermostat, inicialmente à venda por 193 €. Este termostato ajusta as definições de acordo com o uso que lhe damos e ajuda a poupar cerca de 132 € em gastos energéticos anualmente. Estes são, no entanto, apenas alguns dos muitos exemplos iniciais.
Todavia, o facto de as duas empresas estarem a lutar pelo monopólio deste mercado levanta, desde o início da década de 2010, pelo menos, outra preocupação. A compatibilidade entre dispositivos e softwares de fabricantes diferentes. Ambas terão de garantir a privacidade dos seus clientes para conseguirem a sua confiança, visto que o que as pessoas mais valorizam em casa é a segurança. Infelizmente, têm existido falhas.
Casas 3D
Em apenas 24 horas, a empresa chinesa WinSun Decoration Design Engeneering produziu dez casas, cada uma com 230 metros quadrados, através do inovador método de construção contour crafting. Assinada por Behrokh Khoshnevis, professor da Universidade do Sul da Califórnia, nos EUA, a tecnologia não só irá revolucionar a engenharia civil, como também permitirá brincar com a arquitetura a preços mais acessíveis.
A casa é moldada por um padrão feito0 em computador e depois é reproduzida por uma impressora 3D gigante. Cimento e outros materiais desperdiçados são utilizados para fazer a estrutura, reduzindo o custo das comuns centenas de milhares de euros para cerca de 3.600 €. Nos últimos anos, o método contour crafting foi também ele testado na construção de prédios com vários andares em vários locais.
E, com o intuito de vir a ser aplicado na lua e em Marte, o projeto está a ser financiado pela NASA e pelo Cal-Earth Institute. Mas, para já, esta solução ainda não será comercializada com vista à habitação, podendo vir a ser utilizada como alojamento de refugiados ou em campanhas humanitárias após catástrofes naturais. Essa era, pelo menos, a intenção inicial das entidades envolvidas neste projeto (ainda) experimental.
A (nova) vaga das habitações compactas
Gary Chang, um arquiteto de Hong Kong, ainda habita o mesmo apartamento onde cresceu, só já não partilha os 32 metros quadrados com os pais e as duas irmãs. E, de uma, passou a ter vinte e quatro divisões. Para o arquiteto, a utilização do espaço, do tempo e dos materiais tem de ser inteligente e, ao longo das últimas décadas, essa tem sido uma das suas principais missões, como chegou a admitir publicamente.
Além da tipologia tradicional, que continua a ser composta pelo(s) quarto(s), pela casa de banho e pela cozinha, Gary Chang ainda consegue ter outras divisões, como uma biblioteca, uma sala de cinema e um spa, graças às paredes amovíveis que criou. Num futuro próximo, a conectividade das casas e a possibilidade de mudar os interiores serão uma realidade na maioria das habitações compactas nos centros urbanos.
A realidade portuguesa
Conheça, de seguida, algumas das empresas que oferecem soluções modulares (pré-fabricadas), de domótica e de mobiliário integrado no nosso país:
- Casas modulares
As construções pré-fabricadas modulares não devem ser encaradas como tendo menos qualidade do que as tradicionais. Embora algumas estejam prontas num mês, estas casas normalmente demoram cerca de seis meses até serem colocadas no terreno (por causa das aprovações) e estão disponíveis em aço-corten (desde 40.000 €) ou madeira (a partir de 30.000 €).
Se está interessado numa solução destas, recomendamos que consulte as empresas Mima Lab, Modiko, Lemcor, Novo Habitat ou Pinho Casa, algumas das companhias que, nos últimos anos, investiram neste tipo de soluções habitacionais distintas e diferenciadoras.
- Mobiliário integrado
Já chegaram a Portugal os móveis transformáveis, capazes de alterar a sua forma e função em poucos segundos com o mínimo de esforço e sem ruído, graças à sua tecnologia hidráulica. A Space It é a distribuidora nacional das marcas italianas Clei e Ozzio, líderes do mercado saving space, disponibilizando soluções modernas e criativas (em diferentes acabamentos), a partir de 1.000€.
- Soluções de domótica
Há mais de 20 anos que a premiada empresa portuguesa ISA desenvolve soluções inovadoras, como o software Cloogy. Este é um portal web que, por cerca de 99 €, permite controlar remotamente os equipamentos elétricos que tem em casa e ainda produz relatórios dos seus consumos para poder comparar com a tarifa energética.
Texto: Filipa Basílio da Silva
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