Quando estávamos na fase de plantação do jardim, o meu marido, que pouco percebe das lides botânicas, disse-me: «O que eu gostava era de ter umas japoneiras». Tendo nascido no Porto, fora habituado desde criança a ver as ditas flores nas casas dos pais e dos avós, e depois de 25 anos fora de Portugal, veio-lhe uma súbita nostalgia pelas árvores da infância, que tinham, segundo ele, «umas flores lindíssimas».

Como isto se passou já há oito anos, eu confesso que era ainda muito verde nesta matéria dos jardins e, embora procurasse o que eram as famosas japoneiras, nada encontrei.

Um dia, falando com outros portuenses, percebi que as japoneiras do Norte eram as nossas cameleiras do Sul. Aliás a designação de japoneira tem toda a razão de ser se tivermos em conta a origem desta planta. O habitat natural da camellia é o Sudoeste asiático sendo que das cerca de 250 espécies conhecidas, 90 por dento provêm de território chinês.

A China tem um culto ancestral por esta planta, havendo registos de decorações com camellias ainda antes da Dinastia Tang (séc. VII e X), já para não falar da produção de Chá a partir de folhas da Camellia Sinensis.

Da China para o Japão foi um salto, como tudo o que se refere à tradição da
jardinagem. Os japoneses, mestres nesta última, apaixonaram-se pela camellia e
tornaram-na a heroína das suas artes decorativas, parte da cultura do bonsaï, da tradição do Ikebana e ligada desde sempre à cerimónia do chá.

A partir do séc.XVII, na era de Togukawa, a camellia torna-se ornamento indispensável dos jardins dos samurais, das casas das classes dirigentes e do entorno dos templos.

A introdução da camellia na Europa está envolta em mistério. Parte desse
diz respeito a uma teoria (não comprovada) que nos diz que a introdução da
camellia na Europa foi feita pelos portugueses. Isto faz todo o sentido, já que,
com o início do comércio com a China em 1616 e a nossa chegada ao Japão em 1543, se abriu um canal de importações via Macau, onde é muito impossível que
as belas camellias estivessem incluídas.

Só que, por essa altura ainda não se chamavam camellias, mas sim tsubaki,
ou «árvore das folhas brilhantes». A designação de camellia surge apenas em
1735, quando o génio Sueco Linnaeus assim as baptizou na sua obra Systema
Naturae
. O nome trata-se de uma homenagem a um jesuíta chamado Camelli, autor de uma descrição muito extensa de plantas das Filipinas.

A popularidade das camellias no mundo Ocidental foi tal, que se iniciou uma
indústria de produção de híbridos que atinge actualmente cerca de 2000 variedades.

Descendo aqui ao Estoril, depois desta divagação, quando eu quis plantar cameleiras para agradar ao João, disseram-me que era impossível. Que só
no Norte de Portugal se davam bem, que necessitavam de solo ácido para crescerem,
que não gostavam dos calores do Sul.

Como sou teimosa e boa esposa, resolvi mesmo assim experimentar, e comprei
uma vulgar cameleira japónica. Coloquei-a numa zona de meia sombra e rodeei o torrão de terra ácida. Apliquei adubo para acidófilas por alturas da Primavera e esperei.

Para delícia do meu marido, e meu secreto gozo, a cameleira não só não morreu,
como deu uma produção bastante razoável de flores cor-de-rosa pálido. Confiante na experiência, e porque acho que efectivamente a Cameleira é uma bonita e decorativa árvore, resolvi alargar a aventura à plantação de mais algumas com outras cores: brancas e rosa escuro.

Devo dizer que o resultado é espectacular, e que temos neste momento cerca
de seis cameleiras em flor. Não sai barato, mas traz uma diversidade de tom e
de cor no jardim. O único problema é a água da rega, que, como se sabe, por esta zona é extremamente calcária.

Em Invernos muito chuvosos como este, a produção de flores é nitidamente superior porque estiveram praticamente seis meses a receber apenas água da
chuva. No Verão, não há nada a fazer, a água é a que vem da torneira. Se o jardim não for muito grande e houver poucas cameleiras, uma solução possível
é fazer à inglesa, isto é, recolher a água da chuva em bidões e aproveitá-la
para a rega das plantas mais exigentes. Eu faço isso com as minhas orquídeas, por exemplo.

Por isso, já sabem, se quiserem ter um cheirinho do Norte, abalancem-se a umas cameleiras. Só têm que lhes dar artificialmente o que elas pedem: acidez, muita acidez.

Texto: Vera Nobre da Costa
Fotos: Eva Falcão e Jardins