Agostinho da Silva foi um dos grandes pensadores contemporâneos portugueses: personalidade ímpar de humanista, professor, escritor, divulgador, educador, pedagogo, biográfico, ensaísta, tradutor, poeta, novelista, epistológrafo, conferencista e sociólogo.
Com oito meses foi viver para Barca D’Alva, Concelho de Figueira de Castelo Rodrigo, onde passou a infância. Nessa zona arraina cresceu, aí formando o seu espírito e a sua sensibilidade. Em 1917 regressa ao Porto para fazer os estudos secundários no liceu Rodrigues de Freitas, após o que se inscreverá na Faculdade de Letras do Porto.
Personalidade ímpar de humanista, multímoda e polifacetada - professor, escritor, divulgador, educador, pedagogo, biográfo, ensaísta, tradutor, poeta, novelista, epistológrafo, conferencista, sociólogo, urbanista, etc... – a sua obra caracteriza-se, formalmente, por um raro virtuosismo estilístico e por uma temática de singular riqueza e complexidade.
Desenvolveu, em Portugal e no Brasil, uma extraordinária acção sócio-cultural, um verdadeiro apostolado cívico, de cariz eminentemente humanista e universalista mas iniludivelmente alicerçado em valores de Portugalidade, naquilo que ele considerava como servindo à Fundação de uma Identidade nacional.
Investigador apaixonado da quase totalidade das ciências (físicas, biológicas e humanas), das Místicas, das Técnicas, das Pedagogias, etc..., faz culminar todos esses instrumentos numa Síntese única do Conhecimento, centrada o mais possível na Actualidade e o mais possível virada para as necessidades e aspirações da Humanidade (neste singular momento histórico que atravessamos) e para o futuro - tanto próximo como mais remoto.
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Devemos sublinhar que toda esta acção foi desenvolvida sob o signo da aproximação dos Povos e da complementaridade das diferentes Culturas e Civilizações. Nas tarefas e missões que se impôs, nos desígnios que invocou e tentou propagar e irradiar à sua volta, sempre referiu, Pessoanamente (sobretudo, considerando-se o Pessoa da "Mensagem"), a magnitude, a grandiosidade e a transcendência que deverão reconhecer-se a Portugal, ao Brasil e aos demais países e Comunidades de Língua portuguesa, pelo papel que virão a assumir nesta transição momentosa da humanidade.
Transcrevemos em seguida um notável texto e uma genial afirmação da sua autoria.
Excerto de “A Doutrina Cristã” (editado em 1943)
"1. Existe um Deus que é o conjunto de tudo quanto apercebemos no Universo. Tudo o que existe contém Deus, Deus contém tudo o que existe. Pode-se, sem blasfémia, considerar, falar não de Deus mas apenas do Universo, com Espírito e Matéria, formando um todo indissolúvel. A doutrina de Deus, tal como a pôs Cristo, permite considerar todas as religiões como boas, embora em graus diferentes, todos os homens como religiosos. Não poderá, portanto, fazer-se em nome de Deus qualquer perseguição: todo o homem é livre para examinar e escolher; a maior ou menor capacidade de exame e o resultado da escolha serão, em qualquer caso, a expressão do que ele é e do máximo a que pode chegar segundo as suas capacidades.
2. A visão mais alta que podemos ter com Deus, nós que somos apenas uma parte do Universo, é uma visão de Inteligência e de Amor; os pecados fundamentais que o homem poderá cometer são as limitações da Inteligência ou do Amor: toda a doutrina estreita, sem tolerância e sem compreensão da variedade do mundo, toda a ignorância voluntária, todo o impedimento posto ao progresso intelectual da humanidade, toda a violência, todo o ódio, limitam o nosso espírito e o dos outros, impedem que sintamos a grandeza, a universalidade de Deus.
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3. Deus não exige de nós nenhum culto; prestamos a nossa homenagem a Deus, entramos em contacto pleno com o Universo, quando desenvolvemos a nossa inteligência e o nosso Amor: um laboratório, uma biblioteca, são templos de Deus; uma escola é um templo de Deus, e o mais belo de todos. Todos podemos ser sacerdotes, porque todos temos capacidades de Inteligência e de Amor; e praticamos o mais elevado dos cultos a Deus quando propagamos a cultura, o que significa o derrubamento de todas as barreiras que se opõem ao Espírito. Estão ainda longe de Deus, de uma visão ampla de Deus os que fazem consistir o seu culto em palavras e ritos; mas dos que subirem mais alto não pode haver outra atitude senão a de os ajudar a transpor o longo caminho que ainda têm adiante. Ninguém reprovará o seu irmão por ele ser o que é; mas com paciência e persistência, com inteligência e com amor, procurará levá-lo ao nível mais alto.
4. Para que possa compreender Deus, para que possa, melhorando-se, melhorar também os outros, o homem precisa de ser livre; as liberdades essenciais são três: liberdade de cultura, liberdade de organização, social, liberdade económica. Pela liberdade de cultura, o homem poderá desenvolver ao máximo o seu espírito critico e criador; ninguém lhe fechará nenhum domínio; ninguém impedirá que transmita aos outros o que tiver aprendido ou pensado. Pela liberdade de organização social, o homem intervém no arranjo da sua vida em sociedade, administrando e guiando, em sistemas cada vez mais perfeitos à medida que a sua cultura que a sua cultura se for alargando; para um bom governante, cada cidadão não é uma cabeça de rebanho; é como que o aluno de uma escola de humanidade: tem de se educar para o melhor dos regimes, através dos regimes possíveis. Pela liberdade económica, o homem assegura o necessário para que o seu espírito se liberte das preocupações materiais e possa dedicar-se ao que existe de mais belo e de mais amplo; nenhum homem deve ser explorado por outro homem; ninguém deve, pela posse dos meios de exploração e de transporte, que permitem explorar, pôr em perigo a sua liberdade de Espírito dos outros. No Reino Divino, na organização humana mais perfeita, não haverá nenhuma restrição de cultura, nenhuma propriedade. A tudo isto se poderá chegar gradualmente e pelo esforço fraterno de todos.”
Fonte: in Biosofia - para uma nova compreensão da Vida, do Universo e do Homem, nº1 - Primavera 1999
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