Uma semana após a Câmara Municipal de Lisboa ter assinado um acordo com os cinco operadores para organizar o “caos” causado pelo tráfego das trotinetes na cidade, ainda é visível que estas são deixadas um pouco por toda a parte, a grande maioria em passeios, acabando tombadas no chão. Entre os vários aspetos, o acordo pretende combater o estacionamento irregular e desordenado das trotinetes, através da expansão de zonas de estacionamento próprio para este tipo de veículos, os ‘hotspots’ e mesmo zonas proibidas de estacionamento, além de locais de circulação interdita junto aos monumentos nacionais.
À Lusa, a presidente da Junta de Freguesia da Misericórdia, Carla Madeira, contou que o fenómeno é visível a qualquer hora do dia, mas durante o período da noite e ao fim de semana é pior.
“[Esta] é uma zona de afluência noturna e, portanto, muitas pessoas usam as trotinetes para vir para aqui e divertirem-se durante a noite. E o problema não é tanto virem, desde que não venham em excesso de velocidade e respeitem as normas de trânsito”, começou por explicar.
A questão, de acordo com a autarca eleita pelo PS, “é o local onde deixam [as trotinetes]”, frisando que, por norma, é o “primeiro local que encontram e, muitas vezes, esse local é em cima do passeio, das passadeiras”.
“Isso prejudica claramente os peões, as pessoas que querem passar, nomeadamente as com mobilidade reduzida”, disse, lembrando que na sua freguesia há muitas pessoas idosas e, “terem trotinetes em cima dos passeios, que em muitos sítios são pequenos, como é o caso do Bairro Alto, é um obstaculo grave”.
Carla Madeira considerou importante o recente regulamento camarário, frisando a importância em limitar o número existente de trotinetes e o estacionamento com regras, que deverá ser feito em articulação com as juntas de freguesia para que não sejam eliminados “os escassos lugares para moradores”.
O miradouro de São Pedro de Alcântara, as zonas do Bairro Alto e Bica e o Mercado da Ribeira são dos locais mais problemáticos apontadas por Carla Madeira, sublinhando que, a dada altura, “as trotinetes se misturam com o lixo”, um problema de saúde pública, considerou também.
A Lusa constatou, numa volta pela cidade, que a maioria dos utilizadores de trotinetes partilhadas são turistas e jovens, muitos que viajam em dupla, o que é contra o que está estabelecido no Código da Estrada. Também já se veem pessoas com as suas próprias trotinetes elétricas e essas, mais respeitadoras das regras de trânsito, circulando com capacete, que, embora não sendo obrigatório, é recomendado.
Quanto aos locais onde são ‘abandonadas’, é frequente ver as trotinetes junto a semáforos, em cima de passeios e mesmo passadeiras. Também é frequente observar o ‘mau estacionamento’ junto a escolas secundárias e há queixas de terem sido encontradas no rio Tejo, no Parque das Nações.
À Lusa, o presidente da Junta de Alvalade, José Amaral Lopes (PSD), considerou que a sua freguesia “tem os mesmos problemas que as outras”, mas talvez “em menor dimensão”, lembrando que já houve acidentes que envolveram pessoas idosas, um dos quais um atropelamento, que levou um membro da Academia Sénior de Alvalade a ser intervencionado a um braço.
“Enfim, há aqui alguma preocupação. Não é por causa das trotinetes em si, mas é o seu uso que é pouco regulado. Muitas vezes julgamos que estamos num veículo que não tem que cumprir regras e tem”, disse, considerando que a medida do presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas (PSD), “é um passo”.
Para o autarca, na Cidade Universitária “há um espaço muito amplo” e nesse local estes meios de mobilidade suave “são mais utilizados por pessoas” mais novas, tendo em conta a proximidade às faculdades e ao facto de existir uma ciclovia que liga o eixo ao centro da cidade.
“Nós, enquanto autarcas, temos de estar atentos àquilo que os residentes, os cidadãos, pensam e, muitas vezes, à realidade. Muitas vezes faz-se maniqueísmo, ser a favor ou ser contra, quando as ciclovias fazem sentido existir em certas zonas e em outras não”, sublinhou.
Para José Amaral Lopes, as pessoas “não estão suficientemente sensibilizadas para perceber que, quando se usa um veículo, seja ele qual for, tem de se cumprir a lei e esta aplica-se às regras de trânsito”, lembrando que, muitas vezes, os problemas acontecem “porque não há cumprimento das regras”.
“Nós sabemos que Lisboa é uma cidade que não é propriamente muito jovem, infelizmente, e, por isso, as pessoas de maior idade, por assim dizer, sentem-se incomodadas tendo o seu espaço invadido, sentem insegurança e nós não devemos permitir que isso aconteça”, expressou.
Além dos pontos de estacionamento próprios obrigatórios em Lisboa, as trotinetes vão ter um limite máximo de velocidade de 20 quilómetros por hora, além de um contingente máximo de veículos por circulação, que será de 1.500 por operador no inverno e que poderá ir até aos 1.750 na primavera e no verão, sendo que os operadores vão ter 60 dias para se adaptar às novas regras.
Segundo os últimos dados enviados à Lusa, a PSP registou até 31 de dezembro passado 556 acidentes envolvendo trotinetes, que provocaram 440 feridos ligeiros e 13 feridos graves, o valor mais elevado desde 2018, quando houve registo de 23 acidentes.
O ano começou da pior forma, com um homem de 25 anos a morrer na madrugada de 01 de janeiro, vítima de atropelamento no Porto, num acidente que envolveu duas trotinetes e um carro.
De acordo com a PSP foram detidos 58 condutores de trotinetes com excesso de álcool em 2022, quase o dobro em relação a 2021, sendo a média de idade destes utilizadores de trotinetes alcoolizados de 26 anos.
Desde 2019, o número de acidentes com trotinetes quase triplicou passando de 577 para 1.619 em 2022, com o concelho de Lisboa a registar mais acidentes (17,7%), seguido do Porto (4,1%), Vila Nova de Gaia (3%), Cascais (2,2%) e Coimbra (1,9), segundo dados avançados pelo presidente do INEM, Luís Meira, durante o seminário “Mobilidade Ativa: Futuro em Segurança” que decorreu na terça-feira, em Lisboa.
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