Sua Santidade, o 14.º Dalai Lama, 80 anos, nasceu no Tibete, filho de camponeses. Foi reconhecido, aos dois anos, como a reencarnação do anterior Dalai Lama e formalmente empossado em 1950, aos 15 anos. Desde a revolta nacional do Tibete, em 1959, que vive no exílio em Dharamsala, na Índia. Em 2015 foi considerado o líder espiritual vivo mais influente pela revista Watkins Mind Body Spirit. Eis o estado do mundo, nas suas palavras sábias. Veja o que pode aprender com ele:
- A violência nunca pode ser justificada em nome da religião
«Qualquer pessoa que crie um derramamento de sangue em nome do Islão não é mais um praticante do Islamismo. É impensável que um ser humano mate outro. É a guerra justificável? É perigoso afirmar tal. No entanto, a Segunda Guerra Mundial protegeu a democracia ocidental e derrotou o nazismo, por isso valeu a pena. A Guerra da Coreia salvou a Coreia do Sul», defende o Dalai Lama.
- O sucesso tem significados diferentes para pessoas diferentes
«Num campo económico, penso que nos tornamos bilionários. No campo científico podemos descobrir algo. Com a religião, penso que, hmm... penso que é quando um praticante vê Deus. Isso é sucesso», considera o líder espiritual.
- Nunca nos deixamos de zangar com as pequenas coisas
«No meu caso, sucede quando a minha equipa faz qualquer coisa de forma descuidada. Então, aí, a minha voz sobe de tom. Mas, após alguns minutos, passa», assegura o Dalai Lama.
- Somos animais sociais. Um sentido forte de comunidade é essencial
«Na Índia, a taxa de suicídio é mais elevada nas cidades do que nas áreas rurais. Apesar de as posses materiais das pessoas serem mais pobres no campo, existe um maior sentido de comunidade. Se colocarmos demasiada ênfase nas coisas externas, negligenciamos os valores internos», aponta o exilado.
- A primeira semente de compaixão não é ensinada ou explicada mas demonstrada através de ações
«A minha mãe era uma pessoa muito compassiva. Era uma camponesa e iliterata. Não existia nada para brincar, por isso carregava-me sempre às costas enquanto trabalhava. Recebi o máximo de afeição dela. Por vezes, na vida moderna, não é possível passarmos tempo com as nossas crianças desta forma. Mas o que faz um bom pai? Sou um monge. Não tenho experiência!», verbaliza o líder espiritual.
- A crise de refugiados na Síria não pode ser resolvida simplesmente ao aceitar acolher refugiados
«Vivi a maior parte da minha vida como refugiado. Vivo fora do Tibete desde 1959 e a situação na Síria entristece-me imenso. A maior parte dos países estão dispostos a aceitar refugiados. A um nível humanitário isto é maravilhoso. Mas, no fim de contas, temos de encontrar uma solução pacifica para os problemas nestes países», defende o monge.
- Se Buda reaparecesse hoje, ensinaria ética secular
«O nosso programa escolar deveria ensinar ética, não baseada na religião, mas em senso comum e experiências comuns que respeitam todas as religiões e todos os não crentes, e que também ensina a ser cordial. Estudamos higíene física, mas e a higiene emocional? É igualmente importante», assegura.
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- Muitas vezes não existe fundamento para os nossos medos
«Enquanto criança a viver no Palácio Potala, no Tibete, um monge mais velho contou-me que os andares térreos estavam assombrados por fantasmas. Tive tanto medo quando passei por essa parte do edifício. A coisa que mais me assusta são lagartas. Talvez tenha sido uma numa vida passada... Mas consigo tocar em escorpiões!», desabafa o líder espiritual.
- Muitos problemas criados pelo homem advêm de nos focarmos nas nossas diferenças
«Matar, discriminação… Todas estas coisas acontecem porque as pessoas não se focam no que nos torna semelhantes. Somos todos o mesmo. A um nível básico, sou um ser humano. A um segundo nível, sou budista, sou asiático e sou tibetano. A outro nível, sou o Dalai Lama», sublinha.
«Se coloco a ênfase em ser o Dalai Lama, só existo eu e é solitário. Por isso, coloco a ênfase no nível básico. Sou um ser humano e, então, tenho sete mil milhões de irmãos e irmãs e, aí, já não estou sozinho», acrescenta o líder espiritual.
- A felicidade advém de conhecermos outras pessoas.
«Cada dia faço uma oração para me dedicar ao serviço de outros. Estou no meu estado mais feliz quando me misturo com os outros. Se falo com alguém e essa pessoa recebe algum benefício, sinto-me muito feliz», confessa o monge tibetano.
Quem é Dalai Lama?
O 14º Dalai Lama nasceu como Lhamo Thondup, a 6 de julho de 1935, em Taktser na China e foi rebatizado Tenzin Gyatso. Em 1950, com 15 anos de idade, foi solicitado a assumir a completa responsabilidade política como chefe de Estado e de Governo, após a invasão chinesa do Tibete. Os esforços para alcançar uma solução pacífica para o problema sino-tibetano não tiveram um desfecho positivo e, em resposta, surgiu a Revolta do Tibete, que exigia que a China se retirasse da região, reafirmando a sua independência.
Quando a situação se tornou insustentável, Dalai Lama saiu do país para, no exílio, continuar a luta pela libertação. A Índia acolheu o líder espiritual, assim como os cerca de 80.000 refugiados tibetanos. Hoje, mais de 120.000 tibetanos vivem como refugiados na Índia, no Nepal, no Butão e no Ocidente. Desde 1960, que vive no exílio em Dharamsala, na Índia, conhecida como Pequena Lhasa, por sediar a sede do governo tibetano no exílio.
Em resposta à entrevista no canal alemão Deutsche Welle, o líder espiritual tibetano, galardoado com o Prémio Nobel da Paz em 1989, afirma que, desde 2011, que não se envolve em assuntos políticos e que não se preocupa em saber quem o vai suceder mas, sim, com o bem-estar da região.
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Os (outros) ensinamentos do Dalai Lama
Dalai significa oceano em mongol (o nome Gyatso vem da palavra tibetana para oceano). Lama é o equivalente à palavra guru ou líder espiritual em sânscrito. Traduzindo literalmente, o título de Dalai Lama significa professor do oceano, significando um professor espiritualmente tão profundo como o oceano.
No seguimento dos atentados em Paris, Dalai Lama afirmou, numa entrevista ao canal de televisão alemão Deutsche Welle, que os homens não podem estar à espera que Deus resolva os problemas criados pelos próprios seres humanos. «As pessoas querem viver as suas vidas em paz. Os terroristas têm uma visão curta e esta é uma das razões pela qual tem havido vários atentados suicidas», considera.
«Não podemos resolver estes problemas apenas através de orações. Sou budista e acredito na oração. Mas os seres humanos criaram este problema e, agora, estamos a pedir a Deus que o resolva. Não tem lógica. Deus dir-nos-ia para resolvermos o problema porque fomos nós que o criámos», referiu também publicamente.
5 livros que deve ler para saber mais sobre o líder espiritual dos tibetanos
Perceber os ensinamentos do atual Dalai Lama é colocar a paciência e a compreensão em primeiro lugar. Estas são as obras a que deve recorrer para o conseguir:
1. «Um Guia para a Vida» de Howard Cutler e Dalai Lama
Publicado em Portugal pela Editorial Presença, este livro resulta de um encontro entre o Dalai Lama Tenzin Gyao e um conhecido psicólogo americano, em diálogo sobre temas em que duas tradições distintas, Oriente e Ocidente, se encontram na mesma investigação das grandes interrogações da existência.
2. «Bondade, Amor e Compaixão» de Dalai Lama e Jeffrey Hopki
Publicado em Portugal pela Editora Pensamento, apresenta as mensagens de Dalai Lama sobre a importância da bondade, do amor e da compaixão são direcionadas a todos aqueles que acreditam na possibilidade de transformação do homem como indivíduo e como membro de uma sociedade.
3. «O Caminho do Meio, Uma Fé Ancorada na Razão» de Dalai Lama
Nesta obra, o líder espiritual tibetano explica o caminho do meio, o caminho da pessoa inteligente que aborda todos os assuntos, incluindo os da fé. Em Portugal foi publicado pela Editora Presença.
4. «Dalai Lama, Autobiografia Espiritual» de Dalai Lama
Publicada pelas Edições ASA, nesta sua autobiografia espiritual, o monge tibetano partilha como nunca antes as suas memórias, histórias e reflexões. Os pensamentos de Dalai Lama são como um traço de união entre o passado e o presente. Com a mesma naturalidade com que recorda a infância, narra episódios de vidas anteriores, evoca os seus 13 predecessores e reflete sobre a sua sucessão.
5. «Caminhos da Fé» de Dalai Lama
Nenhum país, cultura ou ser humano está imune aos acontecimentos mundiais e a globalização apresenta hoje, mais do que nunca, inúmeros desafios. Para Dalai Lama, trata-se do momento ideal para a humanidade concretizar uma das metas essenciais do século XXI, a promoção de uma coexistência pacífica. Este é o mote deste livro, publicado em Portugal pela Porto Editora.
Texto: Fiona Wilson/The Times/Atlântico Press
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