No fim de março, Happy, a nova coleção unissexo que a Zippy inflamou as redes sociais. Como a marca de moda infantil portuguesa utilizou a expressão "sem género" para a promover, gerou um movimento contestatário que levou à generalização da hashtag #deixemascriançasempaz. "Parem de as usar como instrumentos dessa campanha global hedionda. Happy é igual a gay. Boicote à Zippy", apelou Hugo Roque.

"Esses porcos bicharocos dos LGBT [lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros de merda] querem que as crianças sejam doentes como eles", escreveu João Serôdio na zona de comentários da notícia, onde não faltam críticas aos homossexuais. "Temos de ser fiéis aos valores que Deus instituiu", digitou também Ana Rocha. "Amores, Jesus andava de saias", reagiu, pouco depois, Carla Macedo, uma das apoiantes da linha.

Coleção unissexo da Zippy inflama redes sociais. Os comentários mais surreais
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"A imposição da ideologia de género no seu esplendor... Ainda há pessoas que acham que estamos a exagerar, que é teoria de conspiração", critica Nuno Pt, que não revela publicamente o apelido. "A esquerda marxista é um cancro. Essa ideologia do inferno não tem outro propósito senão [o de] desconstruir a família tradicional assente na moral judaico-cristã e impor a ditadura gayzista", diz. "Querem fazer das crianças seres assexuados e pior, confundir-lhes a mente, fazendo-os acreditar que meninas podem ser meninos e que os meninos podem ser meninas", acrescenta ainda.

"É preciso ser muito ingénuo e ignorante (ou de esquerda) para não perceber o que se está a passar. É claro que esta iniciativa tem como propósito implantar a maldita ideologia de género que afirma que um menino pode ser uma menina e vice-versa. A prova disso são os comentários das pessoas que entenderam a mensagem subliminar [luta contra a disciminação] e, como tal, [a] parabenizam", diz Ana Pereira.

"Chegamos ao ridículo, graças a esta maldita esquerda diabólica, com suas ideologias feministas e gayzistas, de considerar que um menino vestir[-se] de azul e [uma] menina de cor de rosa é considerado opressão e, por isso, temos de lutar contra", prossegue a internauta. Muitos dos que mais se insurgem nas redes sociais escrevem frases sem pontuação repletas de erros ortográficos e poucos têm a coragem de dar a cara.

Os nomes atrás dos quais muitos se escondem

NyXy, jcrf09 e Room101, alguns dos que não perderam tempo a comentar a notícia avançada pelo jornal Sol que dava conta que a atriz Alexandra Lencastre tinha sido vítima de violência doméstica, são exemplo disso e não mostram a face. "Sofreste? Porquê? O marido recusou-se a dar-te o cartão de crédito? Haja paciência", reagiu LB. "Sofreu, mas foi ao [médico José Maria] Tallon e a coisa passou", retorquiu logo outro.

Vítima de violência doméstica no Dia Internacional da Mulher
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"Não será melhor assumir de uma vez que todas as mulheres sofreram de violência doméstica?", questiona Soares. "Assim, poupava-nos a este desfile deprimente, com cada uma a queixar-se na sua vez", desvaloriza. Os comentários ofensivos foram tantos que levaram Catarina Bakker, a filha mais nova da atriz de 53 anos, que reside em Inglaterra, a vir a público defendê-la com unhas e dentes. "Por amor de Deus, haja respeito. Venham a Londres [onde reside] falar comigo sobre a minha mãe cara a cara, seus cabrões", ameaçou a estudante de 20 anos.

Nos últimos dias, depois de se saber que quis introduzir um cavalo no interior de um palácio oitocentista em Belas e não terá gostado de ter sido contrariada pela Câmara Municipal de Sintra, proprietária do edifício, que o proibiu, também Madonna foi vítima da fúria dos haters portugueses. "Esta senhorita pimba do norte das Américas acha que pode fazer de Portugal o paraíso dos seus [video]clipes sadomaso", criticou um.

As (muitas) barbaridades que as pessoas escrevem nos comentários que fazem nas redes sociais

"Lá porque em Portugal os políticos são todos uns froxos, e ficamos por aqui, [ela] acha que pode bem fazer o que quer? Vá para a terra dela destruir os monumentos históricos. Nos países deles, não fazem nada porque não [os] deixam. Chegam aqui e querem ser donos e senhores, como [sucede] na Câmara [Municipal] de Lisboa, [onde] faz [o que] quer e [é] rainha", acusa Ataide Lopes, outro dos muitos críticos da cantora.

O boçal e o ofensivo que muitos dos comentários roçam

Não raras vezes os comentários descambam e roçam o boçal e o ofensivo. "A veterana [Madonna] deve ser uma belíssima penetração", escreveu Francisco Lopes. Com Conan Osíris, o cantor que vai representar Portugal no Festival Eurovisão da Canção, em Israel, com "Telemóveis", sucedeu o mesmo. Pedro Barroso, chamou-lhe "esta porcaria que não tem outro nome" e criticou "aquela porcaria de canção e de adereços".

"Isto é [que] vai representar o meu país? Até tenho vergonha. Quem votou para [lhe dar] essa vitória é melhor ir fazer uma lobotomia", reagiu, indignado, Quim Fidalgo. "É [n]o que dá quando se deixa[m] incultos tomar decisões", contesta Ana Barbosa. "É gozar com tudo e com todos", apoiou, de imediato, Rodrigues Carlos. "A tua mãe nunca devia ter levado na conan", digitou, indignado, com um trocadilho, João Santos.

Conan Osíris

"[Nos dias] 14, 16 e 18 de maio, não serei português, já que recuso que esse senhor me represente", deixa bem claro Hugo Mendes, outro crítico. "Pessoas com memória curta", acusa Paulo Silva, nos comentários de uma notícia. "2017 [ano em que Salvador Sobral, também ele muito criticado, venceu o Festival Eurovisão da Canção], não foi há muito tempo. Em maio, vão vir elogiar [Conan Osíris]", antevê mesmo Paulo Silva.

"Vão dizer que sempre acreditaram [nele] e que é um artista extraordinário", acrescenta ainda. A modelo americana Cindy Crawford, também ela vítima dos haters, já se conformou. "As redes sociais têm vantagens e desvantagens", afirmou durante a visita recente que fez a Portugal. "Não valorize demasiado a opinião de quem acha que sabe tudo. Os ignorantes não têm limitações", adverte, numa publicação, outro internauta.