"Durante o dia 21 de maio de 2022 o estado do tempo em Portugal continental foi condicionado pela presença de um núcleo depressionário à superfície com expressão em altitude, centrado a oeste do território e que forçava, em deslocamento lento para nordeste, uma circulação de sul e sueste", informa o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).

"Esta circulação transportava uma massa de ar quente e seco proveniente do norte de África e com poeiras em suspensão", acrescenta.

"A noite e madrugada de 21 de maio foram excecionalmente quentes, quer no contexto do mês de maio, quer no de registos anuais. Com efeito, os valores de temperatura do ar que foram persistentemente observados durante o período noturno, designadamente em algumas áreas do interior, entre 26 e 32°C, terão configurado, em alguns locais, a madrugada mais quente desde que há registos", lê-se.

Segundo diversos relatos, entre as 05h30 e 06h00, ocorreu um episódio de vento forte em Beja que, comprovadamente, provocou a queda de cerca de uma dezena de árvores de grande porte.

"Os perfis verticais da atmosfera revelados por diversos modelos de previsão numérica confirmavam um ambiente caraterizado por instabilidade nos níveis médios e altos, mas com a intrusão de uma camada muito seca e estável nos níveis mais baixos, configurando assim uma situação apenas compatível com convecção de base elevada. Por outro lado, era visível a persistência de um fluxo moderado de este-sueste nos níveis mais baixos. Nestas condições seria muito pouco provável a formação de um fenómeno do tipo tornado, quer em associação a supercélula (tornado mesociclónico), quer em associação a processos de convergência na camada-limite (tromba terrestre). Foi ainda notório, em especial no sul de Portugal continental e durante a madrugada, a ausência do registo de precipitação nas estações de superfície, tendo havido apenas alguns relatos de aguaceiros fracos de “lama” que conseguiam chegar ao solo", explica o IPMA.

As observações da estação IPMA de Beja mostraram rajadas de vento até 53 km/h entre as 05h40 e as 06h50, portanto dentro do período correspondente aos relatos. Dentro do mesmo período, provavelmente entre as 05h40 e as 05h45, a temperatura do ar na estação subiu de 22,9°C para 33,4°C, tendo posteriormente descido para os 25,5°C observados às 05h50 e a humidade relativa desceu de 49% para 13%, tendo posteriormente subido para os 37% observados às 05h50. Esta significativa e rápida subida de temperatura (+10,5°C) e descida de humidade relativa (-35%) num período de poucos minutos, constitui um fenómeno raro. Este fenómeno foi observado noutras estações da rede IPMA, embora com menor expressão.

"Este tipo de fenómeno designa-se habitualmente por heatburst", refere o IPMA, e pode ser causado por "uma massa de ar quente e seco proveniente do norte de África e com poeiras em suspensão", condicionada "pela presença de um núcleo depressionário à superfície com expressão em altitude, centrado a oeste" de Portugal continental.

"Se o aquecimento for excessivo, a corrente descendente poderá ser totalmente contrariada e nem sequer chegar ao solo. Se tal não ocorrer, no entanto, a corrente descendente atingirá o solo ainda com algum momento linear, não obstante o aquecimento a que foi sujeita. Este tipo de fenómeno designa-se habitualmente por heatburst", esclarece o IPMA na nota publicada.