"O primeiro trimestre de gravidez é o de maior risco, o mais crítico", disse à AFP o médico Simon Cauchemez, principal autor do estudo, baseado em cálculos matemáticos, publicado na revista médica The Lancet.

A análise dos investigadores tem por base os dados recolhidos durante a epidemia do vírus Zika na Polinésia Francesa, entre 2013 e 2014, que atingiu cerca de 66% da população, e a identificação retrospetiva de todos os casos de microcefalia ocorridos num período de 23 meses entre setembro de 2013 e julho de 2015.

Segundo estimativas, "1% dos fetos ou recém-nascidos cuja mãe foi infetada ao longo do primeiro trimestre de gravidez tiveram microcefalia, contra 0,02% quando a infeção surge nos trimestres seguintes, representando um risco multiplicado por 50".

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"Este novo nível de risco da mulher grávida infetada é mais fraco do que noutras infecções virais associados a lesões cerebrais durante a gravidez", indicou o biólogo do Pasteur. Para a rubéola contraída no primeiro trimestre de gravidez, o risco de complicação grave é de 38% a 100%.

Os resultados continuam a ser preocupantes, já que ao contrário da rubéola, contra a qual existe uma vacina, a proporção de pessoas infectadas durante uma epidemia do Zika pode ultrapassar os 50% e "isso torna-se um problema de saúde pública", aponta Cauchemez.

Outros estudos são necessários para saber se a presença de sinais clínicos de infecção de Zika na mãe aumenta o risco de microcefalia.

Ainda é preciso esclarecer também se as formas de infecção do Zika sem sintomas representam um risco para o feto, disse recentemente Eric Rubin, da universidade de Harvard (Boston, Estados Unidos) na New England Journal of Medicine (NEJM).

Uma questão importante, já que "a maior parte das infeções pelo vírus Zika, geralmente benignas, passam despercebidas", nota Cauchemez. "Acreditamos que cerca de 80% das pessoas infetadas não apresenta sintomas", afirmou o investigador, citando um estudo da NEJM sobre a ilha de Yap (Pacífico).

Estes resultados reforçam as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) para que as mulheres grávidas se protejam das picadas de mosquitos, especialmente durante o primeiro trimestre de gestação, segundo o professor Arnaud Fontanet, co-autor do estudo.

Num comentário acompanhando o artigo, a médica Laura Rodrigues, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, nota que "a constatação do risco mais elevado de infecção no primeiro trimestre é biologicamente plausível, tendo em conta o calendário de desenvolvimento do cérebro e do tipo e da gravidade dos problemas neurológicos".

Outros resultados permitirão saber se há um "risco uniforme" de microcefalia durante o primeiro trimestre de gravidez ou "se há reais variações do risco, segundo a presença de sintomas clínicos ou outros co-fatores", nota.

Segundo especialistas, o risco pode não ser o mesmo na América do Sul devido, por exemplo, às diferenças étnicas, ou até à evolução do vírus.

O Brasil já tem mais de um milhão e meio de casos de Zika. 745 crianças brasileiras têm microcefalia e 157 bebés morreram por causa desta condição, de acordo com um balanço fixado a 10 março.

No início de fevereiro, a OMS estimou que uma possível ligação entre o Zika e a explosão de casos de microcefalia era "uma emergência de saúde pública de preocupação internacional". Não existe ainda vacina ou tratamento para acabar com o vírus.