Daniel Murta, médico veterinário e fundador da EntoGreen, disse à Lusa que a utilização de insetos na alimentação humana, “bastante conhecida noutros pontos geográfico”, na Europa foi enquadrada como “um novo alimento”, o que implica, desde o início deste ano, que sejam submetidos diplomas para aprovação da sua utilização como alimentos para humanos.

A EntoGreen juntou-se à Nutrix e à Portugal Bugs para criar a Portugal Insect, Associação Portuguesa de Produtores e Transformadores de Insetos, para “mudar consciências e procurar dinamizar um setor que está a aparecer”, sendo que um dos “desafios” que a nova estrutura tem pela frente é a legislação.

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No caso da alimentação animal, desde julho do ano passado que se tornou possível a utilização de insetos como fonte proteica na alimentação de peixes em aquacultura e espera-se que, em 2019, venha a ser permitida na alimentação de aves e porcos, terminando com uma limitação que vinha do surgimento da BSE (“doença das vacas loucas”) e que apenas permitia o seu uso para animais de companhia, disse.

Estudas demonstram segurança do alimento

Daniel Murta afirmou que o setor “tem crescido muito fortemente a nível mundial, e em particular na Europa”, salientando os estudos que têm vindo a demonstrar “a segurança destas novas fontes nutricionais”.

A Portugal Insect foi constituída formalmente a semana passada, tendo a sua sede na Estação Zootécnica Nacional (EZN), polo do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) situado no Vale de Santarém (concelho e distrito de Santarém).

A EntoGreen tem vindo a desenvolver um projeto (EntoValor) com investigadores do INIAV em que larvas de Mosca Soldado Negro (BSF) se alimentam de resíduos da agricultura fornecidos pelo entreposto comercial agrícola Agromais, com sede na Golegã, e que iriam para aterro.

O processo permite, além da “engorda” das larvas que serão usadas para alimentação animal (envolvendo aqui como parceiro as rações Zêzere), a transformação dos subprodutos em fertilizantes agrícolas, cumprindo o conceito de economia circular.

Os investigadores do INIAV estão a fazer a caracterização química das larvas e a estudar a sua digestibilidade, em modelo de simulação, para porcos e a ensaiar a substituição da soja por farinha de insetos na alimentação de frangos em engorda, avaliando ainda o impacto ambiental, disse à Lusa Olga Moreira, coordenadora da EZN/INIAV.

Para a investigadora, o acolhimento da Portugal Insect revela a “dinâmica” que tem sido imprimida na EZN, patente nas mais de duas dezenas de projetos de investigação e experimentação aplicada em curso e no interesse e procura por parte das empresas.

José Gonçalves, da Nutrix, empresa de Leiria que produz framboesas biológicas e iniciou o processo para produção de farinhas à base de insetos (larvas de grilos) para incorporar em alimentos humanos, sublinhou a oportunidade criada com a tomada de posição da FAO - Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura sobre a necessidade de se encontrarem “alternativas mais sustentáveis para produzir proteína animal”.

A Portugal Insect vai permitir “agregar a generalidade das entidades que têm interesse na produção e transformação de insetos para alimentação quer animal, quer humana”, permitindo “uma voz conjunta e a partilha de conhecimento”, salientou.

José Gonçalves afirmou que a legislação europeia para a introdução de novos alimentos impõe a apresentação de provas “de que é seguro para ser consumido por humanos”, fase em que se encontra a produção de insetos para alimentação, seguindo-se um período de análise pela Agência Europeia de Segurança Alimentar.

Enquanto se espera uma decisão, pouco provável antes do final de 2019, os projetos em curso são “essencialmente experimentais”, frisou.

A Portugal Bugs, que cria larvas de besouros pretos (bicho-da-farinha ou tenébrio) para alimentação, tem já novos produtos prontos a comercializar, como uma barra proteica premiada recentemente pelo NovoRumoAoNorte.

“Neste momento não vendemos nada, apenas criamos e desenvolvemos novos produtos”, para, “quando tivermos oportunidade, conseguirmos colocar o produto no mercado sem dependermos de terceiros”, disse à Lusa Guilherme Pereira, fundador da Portugal Bugs.

Em cinco países europeus – Bélgica, Holanda, Reino Unido, Dinamarca e Finlândia -, que fizeram “uma interpretação mais permissiva” do regulamento que vigorou na União Europeia até ao final de 2017, há já “alguns produtos para alimentação humana que incorporam insetos”, afirmou José Gonçalves.