Numa nota enviada às redações, a Ordem dos Médicos (OM) recorda o fecho no passado sábado, pela quinta vez este ano, da urgência de Ginecologia/obstetrícia do Hospital de Beja, por falta de um segundo médico especialista.

Citado no comunicado, o bastonário, Miguel Guimarães, considera que esta situação é preocupante e “reveladora da falta de investimento que o Ministério da Saúde tem feito no interior, mas também numa área tão nobre do Serviço Nacional de Saúde (SNS) como é a saúde materno-fetal”.

Miguel Guimarães alerta que o caso de Beja, infelizmente, “não é único nem pontual” e aconteceu poucos dias depois de o Hospital de Portimão ter tomado uma decisão semelhante, mas naquele caso por falta de pediatras que pudessem dar apoio ao bloco de partos.

Os hospitais de Évora, S. Francisco Xavier e Amadora-Sintra são outros exemplos de instituições com dificuldades recentemente conhecidas, recorda a Ordem dos Médicos.

“Temos tido concursos assimétricos, disfuncionais e insuficientes nas várias especialidades, mas muito concretamente na Ginecologia/Obstetrícia, com impacto imediato e direto em indicadores que tanto nos orgulhavam e que eram elogiados a nível internacional, como a mortalidade materna e a mortalidade infantil”, afirma o bastonário.

Miguel Guimarães diz igualmente que “estas falhas estão também a ter reflexo no aumento do número de cesarianas e nos tempos de espera para consultas e cirurgias”.

Na Ordem dos Médicos estão inscritos 1.400 especialistas em Ginecologia e Obstetrícia com menos de 70 anos, sendo que só 850 trabalham no SNS.

A Ordem estima que seriam necessários pelo menos mais 150 especialistas e, por isso, o bastonário considera “urgente alterar os prazos e a forma como os concursos são conduzidos no país”.

“Apesar de em 2019 o Ministério da Saúde já ter aberto dois concursos, a verdade é que o processo é feito de forma acrítica e, em vez de servir as necessidades dos hospitais, acaba por ser indutor de entropia”, diz o responsável.

Miguel Guimarães dá o exemplo do Norte do país, onde “só abriram cinco vagas para uma população de 3,7 milhões de pessoas”, reforça.

“O concurso de janeiro contou com 14 vagas e o de maio com 31 vagas, sendo que entre 2016 e 2019 formaram-se, em média, 45 especialistas por ano e abriram em média 30 vagas por ano no SNS”, explicou.

Dessas vagas, em média, “só 15 são ocupadas”.

“Estes números comprovam que não há falta de especialistas em Portugal, mas sim um défice de abertura de vagas e de ocupação das mesmas”, defende, por seu lado, o presidente do Colégio da Especialidade de Ginecologia/Obstetrícia, João Bernardes, considerando que “é necessário continuar a insistir na abertura de vagas e, sobretudo, na alteração da forma como se realizam os concursos”.

A OM defende uma alteração no sentido de tornar “mais previsível a altura e local em que as vagas serão abertas” e que esse trabalho seja feito “de forma consistente”.

“É ainda imperioso que as vagas não ocupadas, ou deixadas livres depois de uma ocupação inicial, se mantenham abertas e se desenvolvam os programas de incentivos para a colocação de especialistas em zonas periféricas”, acrescenta.

Em muitos casos, acrescenta, “as vagas abertas acabam por ser desadequadas ao perfil do especialista que a ocupa, o que leva a que, mesmo nos casos em que os lugares são preenchidos, os médicos acabem por sair ao fim de pouco tempo”.

“O desinvestimento nas infraestruturas e equipamentos dos serviços está também a ter um impacto muito negativo na capacidade de atrair novos médicos e de manter os mais experientes”, considera também a OM, que frisa que “há cada vez mais equipamentos avariados e obsoletos”.

O bastonário recorda ainda que, com a aproximação do período crítico do verão, a situação tende a agravar-se: “As carências geram uma cascata de carências”, conclui.