Um projeto inovador de reabilitação psicossocial de agressores em casos de violência doméstica lançado em Ponta Delgada, nos Açores, já envolveu 81 indivíduos, 41 dos quais terminaram e processo e não têm registo de reincidência.

"Desde 2009, foram sujeitos a avaliação 110 indivíduos, tendo 81 chegado a este projeto, dos quais 41 já acabaram o programa e ainda não há registo de reincidência", revelou Natércia Gaspar, diretora regional da Solidariedade e Segurança Social, em declarações à Lusa.

Natércia Gaspar salientou, no entanto, que nem todos os agressores reabilitados voltaram para casa, tendo alguns conseguido a reconciliação com as companheiras, enquanto outros estão a viver novas relações.

O programa CONTIGO consiste numa intervenção terapêutica junto do agressor, que frequenta sessões durante 18 semanas, onde "desmonta estereótipos e conceitos", como a posse e o ciúme, mas também analisa questões como a igualdade do género e a criminalidade da violência doméstica.

Este projeto, que envolve a Direcção Geral de Reinserção Social, o Ministério Público da Comarca Judicial de Ponta Delgada, a PSP e a equipa de Apoio Integrada à Mulher em Situação de Risco, decorre atualmente apenas na Comarca de Ponta Delgada, mas o executivo regional pretende alargá-lo a outras ilhas do arquipélago.

"É um programa inovador, conseguido por técnicos açorianos, que já mereceu referências de boas práticas de instituições europeias", frisou Natércia Gaspar, acrescentando que o CONTIGO também já "serviu de referência a nível nacional para experiências similares".

Apesar dos dados positivos deste projeto, a sua eficácia ao nível da reabilitação de agressores é questionada pela Associação para a Igualdade e Direitos das Mulheres (UMAR) nos Açores, que encara com “alguma relutância” aspetos deste programa.

“Em que medida um programa deste tipo pode estar a facilitar a manutenção destas situações e não a ir à raiz?. Até que ponto o facto de se estar a co-relacionar a vítima com o agressor, na recuperação deste, será benéfico?”, questionou Clarisse Canha, da UMAR/Açores, em declarações à Lusa.

Para Clarisse Canha, a reabilitação deve centrar-se na "responsabilização do agressor", defendendo que deve "ser ele próprio a interiorizar-se disso e não apenas a mulher a perdoar".

Nesse sentido, considerou “importante haver intervenção com os agressores, mas no sentido de os responsabilizar pelos atos que cometem, trabalhar comportamentos, conceitos e práticas que os levam a praticar a violência contras mulheres, seja física, psicológica sexual".

No mesmo sentido, a psicóloga Raquel Fontes salientou que, "um programa onde a vítima é envolvida na recuperação do agressor está a fomentar o papel da mulher enquanto cuidadora em detrimento de si, acreditando que a relação pode resultar ou que o agressor irá mudar".

Nos gabinetes que tem abertos em Ponta Delgada e na Ribeira Grande, em S. Miguel, a UMAR realizou no ano passado 372 atendimentos psicossociais e jurídicos a 64 mulheres vítimas de violência doméstica.

23 de janeiro de 2012

@Lusa