É inegável o empenho, dedicação e firmeza dos Médicos Internos portugueses.
O seu trajeto é longo e trabalhoso. Após seis anos de uma sólida formação técnica e científica, que lhes permitiu adquirir competências cruciais em Medicina, Ética, Ciências da Vida, ultrapassaram a funesta Prova Nacional de Acesso à Formação Especializada. Esta tem hoje um modelo (para referência, por este decreto-lei de 2018 e por este despacho do mesmo ano) mais sensato, preciso, aplicado às exigências da prática clínica e que dá prioridade ao raciocínio clínico (existem, todavia, ainda aspetos a monitorizar e a aprimorar).
Sucederam-se 12 meses, ainda em curso, de Formação Geral. Este é um período voltado para o aprofundamento e exercício dos conhecimentos já adquiridos.
Agora, nesta semana de meados de novembro, surge mais uma etapa: inicia-se o Processo de Escolhas para a Formação Especializada do Internato Médico. E com ela, aproxima-se o culminar de um longo procedimento de acesso e a concretização dos objetivos de muitos Jovens Médicos em Portugal. É crucial sublinhar a magnitude da escolha que os Médicos Internos irão realizar nos próximos dias – e os condicionantes a que estão sujeitos.
Esta escolha tem por base o acesso à Formação Especializada, cujo fim consiste na habilitação ao exercício tecnicamente diferenciado numa área de especialização Médica, requer uma análise séria e ponderada que vem sendo seriamente condicionada. Por um lado, a publicação do Mapa de Vagas é habitualmente demorada. Por outro – e também por causa disso – os Internos terão apenas duas semanas para reflexão até ao início das escolhas. É um período de reflexão manifestamente diminuto para uma escolha tão crucial. E com mais uma condicionante: foram extintos os Blocos Opcionais da Formação Geral, que outrora permitiam aos Médicos Internos explorar uma área do domínio Médico a ser equacionada na escolha da Especialidade.
Acreditamos que o modelo de acesso deve promover a responsabilização individual e garantir justiça e igualdade de oportunidades, respeitando a particular importância desta escolha para os Jovens Médicos e para a Sociedade Portuguesa.
Outra problemática, já amplamente discutida e reconhecida, é a existência de Médicos sem Especialidade. Uma realidade verificada desde 2015, quando ocorreu o primeiro concurso em que o número de candidatos excedeu o número de vagas disponíveis. Este cenário tem sido agravado nos últimos anos pelo aumento progressivo do numerus clausus do Ensino Médico Pré-Graduado e pela saída de Médicos Especialistas do Setor Público, onde é centralizada a enorme maioria da Formação Médica Pós-Graduada.
Tais fatores resultam na drástica diminuição da capacidade de formar novos Especialistas, seja em termos quantitativos ou qualitativos.
Ainda que este impasse se mantenha, tem existido uma preocupação para aproximar o número de vagas ao número de candidatos, registando-se uma subida de 1.539 vagas em 2015 para 2.054 em 2022, um aumento na ordem dos 33,5%.
Mas até que ponto poderá o Sistema Nacional de Saúde continuar a aumentar mais a sua capacidade formativa?
Considerando que a atribuição de Idoneidade e Capacidade Formativa são homologadas pelo Ministério da Saúde, sob proposta da Ordem dos Médicos, deverá a Ordem dos Médicos fazê-lo diminuindo os seus critérios de qualidade? Ou será responsabilidade da Tutela acomodar, a qualquer custo, a globalidade dos candidatos ao Internato da Formação Especializada, impondo um aumento sem critério do Mapa de Vagas?
A existência de planos formativos organizados e com critérios de avaliação definidos constitui um aspeto muito significativo e notável para a qualidade da Saúde em Portugal, pois esta é indissociável da capacidade técnica e científica dos seus Médicos.
Deste modo, a definição das Idoneidades e Capacidades Formativas Médicas devem ter como base um processo transparente e competente, que tenha em linha de conta um planeamento articulado entre a Ordem dos Médicos, o Conselho Nacional do Internato Médico e a Tutela. E que englobe a análise das reais necessidades do país, que priorize a qualidade formativa e que forneça os meios logísticos e humanos necessários para que, mais Serviços e Unidades Médicas cumpram os parâmetros de qualidade indispensáveis.
Por um provedor do Médico Interno
Todas estas ideias reforçam o papel de Provedoria do Médico Interno, que a Ordem dos Médicos deve assumir, dado que a necessidade de monitorizar atentamente todo o procedimento de concurso e os moldes em que o Internato Médico decorre, desde o seu início até à avaliação final, é crucial para a defesa da sua formação.
Eles devem ser também agentes ativos no seu processo formativo, e uma fonte com ideias e propostas que têm de ser ouvidas e atendidas. É por isso que a instituição na Ordem dos Médicos de uma Provedoria do Interno garantiria uma resposta mais atempada e com conhecimento às solicitações deste grupo, que constitui o futuro da Medicina em Portugal.
Assim, reconhecendo o inequívoco valor dos Jovens Médicos Portugueses, é essencial considerar a sua visão para a organização do Internato Médico como agentes do seu próprio processo de formação, de modo que as suas expetativas e prioridades façam parte da construção de um Sistema de Saúde responsável, justo, eficiente, seguro, acessível e centrado nas pessoas. É por isso que a instituição na Ordem dos Médicos de uma Provedoria do Interno garantiria uma resposta mais atempada e com conhecimento às solicitações deste grupo, que constitui o futuro da Medicina em Portugal.
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