Uma assistente de bordo informou Alexandra Gurgel que a companhia aérea não possuía adaptador para o cinto e a jovem jornalista teve de fazer o trajeto aéreo São Paulo-Salvador sem cumprir os requisitos de segurança. "É uma situação constrangedora. Foi péssimo, senti-me desprotegida e diferente dos outros. Conheço pessoas gordas que evitam andar de avião só para não ter de passar por isto", diz a youtuber em declarações à BBC.

As dificuldades durante o voo são um exemplo das adversidades encontradas por Alexandra Gurgel ao longo da sua vida, devido ao excesso de peso que a acompanha desde a infância. A jornalista demorou décadas até aprender a lidar com o facto de ser gorda. Nesse trajeto de aceitação, chegou a fazer uma lipoaspiração e tentou o suicídio.

Mas os desafios enfrentados por pessoas com excesso de peso estão em todo o lado. Seja na hora de comprar roupa, escolher um lugar para se sentar ou passar um torniquete. "As dificuldades mostram que nem tudo é inclusivo e que a maioria das coisas estão feitas para pessoas magras", comenta.

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Um preconceito com centenas de anos

Numa reportagem alargada sobre o tema, a BBC recorda ainda os comentários ofensivos, as piadas preconceituosas e as observações maldosas disfarçadas de preocupação. Para isso, Alexandra Gurgel tem uma palavra "gordofobia". "Eu não sabia que essa palavra existia, mas agora  sei que existe e faz todo o sentido", reage a jovem num dos vídeos que partilha no Youtube e que reúnem centenas de milhares de visualizações.

O termo é utilizado para definir o preconceito enfrentado por quem tem excesso de peso. Mas o problema não é recente: olhares curiosos e comentários jocosos já eram comuns na Idade Média, quando a igreja passou a considerar a gula como um dos sete pecados capitais. "O cristianismo fez com que tudo fosse muito ponderado, inclusivamente o corpo. A pessoa não poderia ser gorda, porque isso seria um pecado", explica a historiadora Débora Casanova à estação de televisão britânica.

Para a psicóloga Iolete Silva, a gordofobia traz consequências como constrangimento social e dificuldades de socialização. "As pessoas sentem-se inadequadas, como se houvesse algo de errado. É como se elas não fossem boas o suficiente para estar com os outros e para receber afeto", conta. "Nós tentamos mostrar que a pessoa que exprime esse preconceito está errada e não o alvo", explica a psicóloga.

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Obesidade e doença: uma ligação que é um estigma

O episódio da falta de extensor no cinto de segurança é apenas uma das situações que Alexandra Gurgel cita sobre casos de inacessibilidade. E recorda outros: "Fui com um amigo meu ao teatro, para ver um espetáculo, e não havia cadeira para ele se sentar. Ele ficou desconfortável na ponta de uma das cadeiras, ouvimos cinco músicas e fomos embora", relembra a youtuber e instagrammer na sua conta Alexandrismos.

Para evitar que os comentários ofensivos o afetassem, o publicitário e também youtuber Bernardo Boechat, de 27 anos, passou a autoproteger-se. "Aprendi a lidar com isso desde cedo, porque fui sempre humilhado na escola por ser gordo. Não havia nenhuma proteção na escola, viam que isso acontecia, mas não faziam nada. Então, tive que criar uma espécie de 'casca' à minha volta para que essas coisas não me afetassem tanto", diz.

Por outro lado, para as pessoas gordas, a relação entre obesidade e doença é um dos estigmas que mais causam preocupação. "A nossa luta é para que a obesidade seja retirada da categoria de doenças. O corpo gordo, em si, não é a causa de doença nenhuma. O que pode causar problemas são as várias doenças que podem estar associadas", justifica Bernardo Boechat. "Não queremos continuar a ser vistos como doentes", conclui.

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