Em entrevista ao HealthNews, Maria João Vitorino – Diretora da Linde Saúde em Portugal – alerta que a baixa adesão terapêutica dos doentes com DPOC “se reflete num subtratamento do doente, o que tem impacto na sua sintomatologia diária, nomeadamente em termos de cansaço, dispneia e tosse, o que se traduz numa baixa qualidade de vida e potencia as agudizações que levam a mais idas às urgências e internamentos. Para a responsável, “é necessário criar estratégias de implementação de programas na comunidade, quer através dos cuidados de saúde primários, quer em centros diferenciados em ambulatório e no domicílio”.
Na 37ª edição do Congresso de Pneumologia o presidente da SPP alertou para o facto de as doenças relacionadas com o sistema respiratório serem uma das principais causas de morte em Portugal, sendo a doença pulmonar obstrutiva crónica uma delas. No que estamos a falhar?
As doenças respiratórias são, de facto a 3ª causa de morte quer na Europa, como um todo, quer em Portugal, em particular. No entanto, Portugal é um dos três países na Europa com as mais altas taxas de mortalidade por esta causa, sendo apenas ultrapassada pela Irlanda e a Dinamarca, de acordo com os dados do Eurostat (2018). Os problemas que contribuem para estes fatores são multifatoriais, destacando-se o impacto de uma maior sobrevida das populações que acarreta doenças crónicas, como é o caso da doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC); o subdiagnóstico das doenças respiratórias é também fator relevante, pela atual assimetria no acesso à espirometria e consequente tratamento das doenças, embora o registo de doentes codificados com tendo DPOC nos Cuidados de Saúde Primários seja cerca de 136.000, numa prevalência prevista de 800.000 doentes, o diagnóstico com base no exame “gold standard” é reduzido, sendo estimado em pouco menos de metade dos 136.000 doentes codificados com DPOC. Por outro lado, a própria DPOC pode ter características (sinais e sintomas) pouco evidentes, em fases iniciais da doença, o que pode levar a desvalorização por parte da pessoa e consequentemente ao diagnóstico tardio e a evoluções mais graves da patologia.
Um estudo divulgado no ano passado revelou que em Portugal existe subdiagnóstico da DPOC e uma potencial baixa adesão dos doentes ao tratamento. Em que medida este cenário agrava a qualidade de vida dos doentes?
A baixa adesão terapêutica reflete-se num subtratamento do doente o que tem impacto na sua sintomatologia diária, nomeadamente o cansaço, a dispneia e a tosse, que se traduz numa baixa qualidade de vida e potencia as agudizações que levam a mais idas às urgências e internamentos. A adesão terapêutica requer um esforço de vários intervenientes, sobretudo o próprio doente, os cuidadores e familiares, bem como o médico e restantes equipas de saúde. Na terapêutica mais habitual dos doentes, como é o caso dos inaladores, está demostrado que o treino e formação do doente estão diretamente relacionados com a eficácia terapêutica. No entanto, existem vários tipos de inaladores, o que requer dedicação e tempo por parte dos vários intervenientes, o que nem sempre é possível.
Quanto ao subdiagnóstico, como mencionei anteriormente, a desvalorização pelo próprio e o acesso à espirometria podem ser dois fatores que atrasam o diagnóstico e contribuem para o inicio tardio da terapêutica.
A Reabilitação Respiratória desempenha um papel fulcral na recuperação dos doentes. No entanto apenas 1% tem acesso a estes programas. Como explica este paradoxo e, do seu ponto de vista, o que deve ser feito para combater esta realidade?
A reabilitação respiratória é uma intervenção não farmacológica considerada fundamental no tratamento das doenças respiratórias crónicas que contribui para a melhoria da função pulmonar, redução da gravidade e do impacto dos sintomas e consequentemente melhorar a sua qualidade de vida. Esta baixa percentagem é resultado de um reduzido número de locais onde se pode ter acesso a estes programas, que estão localizados nos principais centros hospitalares – grandes cidades no litoral do país – o que limita a acessibilidade e a adesão dos doentes que estão fora dos grandes centros urbanos. Também contribui o facto de que a própria doença pode limitar a adesão pela sua gravidade e respetiva incapacidade que tornam a deslocação aos centros uma dificuldade acrescida para os doentes.
A resolução deste problema pode ser facilitado pelo aumento da oferta destes programas de Reabilitação Respiratória, através do aumento da capacidade produtiva dos atuais centros, através da alocação de mais recursos (humanos e técnicos), aliada à constante formação e informação dos profissionais de saúde nesta terapêutica não-farmacológica. Para chegar a mais doentes, será necessário também criar estratégias de implementação de programas na comunidade, quer através nos cuidados de saúde primários, quer em centros diferenciados em ambulatório, quer no domicilio.
A Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica é uma doença muito incapacitante que afeta cerca de 15% dos portugueses. Qual o contributo da Linde Saúde na garantia da qualidade de vida dos doentes sob tratamento?
A qualidade está assente na nossa missão de, por um lado assegurar que disponibilizamos a melhor inovação possível para os cuidados respiratórios domiciliários, aliada à máxima segurança desta população. Investimos na formação dos nossos profissionais de saúde e técnicos de apoio domiciliário para termos a melhor resposta para as pessoas com DPOC. Também dedicamos as nossas equipas à formação dos profissionais de saúde para, em parceria, contribuírem para que haja uma comunidade crescente preparada e atualizada para a tomada das melhores decisões terapêuticas, ajustadas a cada indivíduo.
A Linde disponibiliza terapias domiciliárias para o tratamento da DPOC, como oxigenoterapia, Ventilação Não-Invasiva (VNI), reabilitação respiratória e aerossolterapia. Estão a ser desenvolvidas outras soluções terapêuticas inovadoras?
Sim, no caso da oxigenoterapia, estamos sempre à procura de soluções que motivem o doente para uma maior adesão terapêutica, através de maior conforto, através de maior autonomia e mobilidade. Nos últimos meses, especialmente devido ao contexto pandémico por COVID-19, temos vindo a utilizar com mais frequência a terapia de alto fluxo, o que aumenta a oferta de opções terapêuticas para os doentes respiratórios. Temos também promovido a reabilitação respiratória no domicílio de forma a abranger um maior número de doente. Por último, o investimento na telessaúde com a monitorização remota dos doentes, tem demonstrado ser uma ferramenta que minimiza o impacto das agudizações ao disponibilizar uma triagem precoce de sinais e sintomas e permitir a intervenção médica precoce.
A pandemia impactou a história clínica da DPOC?
É difícil afirmar isso dado que não existem dados concretos. No entanto, a pandemia veio criar limitações necessárias, como o confinamento, sobretudo para as pessoas com doenças crónicas, como a DPOC. Com isso, muitos doentes evitaram o contacto com os hospitais e centros de saúde (consultas, exames, urgências, etc.) pelo risco de serem infetados pelo Sars-CoV-2. Esta mudança comportamental poderá ter tido impacto no diagnóstico e no seu seguimento habitual, com impacto na gestão da própria doença, no curto e médio-prazo. Estes doentes não devem adiar o acesso aos cuidados de saúde. As instituições de saúde definiram protocolos e circuitos de forma a garantir a segurança dos doentes e profissionais de saúde, pelo que os pacientes não devem deixar para mais tarde e por receio, a deslocação aos hospitais e aos cuidados de saúde primários Adicionalmente, ao nível da prevenção, as consultas de cessação tabágica também poderão ter sido impactadas e os seus efeitos não podem para já ser quantificados mas são sobejamente reconhecidos os seus benefícios, quer para a DPOC, quer para outras doenças respiratórias. O tabaco continua a ser o principal fator de risco modificável para a DPOC e as consultas de desabituação tabágica são um recurso fundamental, de modo que a diminuição no acesso pode implicar resultados nefastos posteriormente.
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