Citando dados oficiais da Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed), Rui Tato Marinho precisou, em declarações à agência Lusa, que foram registados 27.239 tratamentos desde que foi assinado em 2015 um acordo com a indústria farmacêutica para acesso aos medicamentos inovadores para o tratamento da Hepatite C.
“Há uma certa disparidade entre os tratamentos finalizados e os que são registados, porque isto implica que os médicos registem no portal [do Infarmed]. É um certo obstáculo burocrático, mas tem de ser”, disse o gastrenterologista à Lusa, na véspera de se assinalar o Dia Mundial das Hepatites.
Segundo as estimativas, ainda existem 40 mil pessoas infetadas com o vírus da hepatite C por diagnosticar e tratar em Portugal.
As hepatites víricas são “doenças silenciosas”, “muito traiçoeiras”, porque podem “evoluir durante 20, 30, 40 anos ou mais sem a pessoa saber que está infetada, fazer a vida normal, contagiar outras pessoas, e mais tarde vir a desenvolver uma cirrose ou um cancro do fígado”.
“Porque sabemos que essas pessoas existem”, queremos identificá-las, porque existe uma “grande capacidade interventiva nesta área das hepatites”.
Para isso, é preciso ir ter com essas pessoas, promovendo um rastreio mais amplo, que também é benéfico para a sociedade, para evitar mais infeções.
“Estamos muito habituados” a que as pessoas que têm problemas de saúde “venham até nós, mas temos de mudar um bocado o nosso modo de pensar e irmos até elas”: “estas pessoas não são marcianos, não vivem noutro mundo. Vivem a poucos quilómetros de nós, alguns deles cruzam-se connosco e são potenciais problemas de saúde pública” porque não sabem que estão infetados e podem infetar outros.
Entre esses grupos de riscos, designadamente na hepatite C, um vírus que se transmite sobretudo por via sanguínea, estão pessoas que foram consumidoras de drogas ou que ainda são, alguns sem-abrigo, pessoas com dificuldade em ir ao hospital, em gastar dinheiro em transportes públicos, ou que fizeram transfusões de sangue antes de 1992, quando ainda não existiam testes para este vírus.
“Temos de ir a essas bolsas sociais mais desfavorecidas, além de ser uma ação humanitária, que temos obrigação social e ética de o fazer, vai permitir não só diagnosticar, tratar e curar essas pessoas, mas também é bom para a sociedade”, defendeu.
Mas, ressalvou, “não quero estigmatizar só esses grupos porque há diretores de empresas, pessoas muito bem colocadas na vida que também têm as hepatites víricas sem o saberem”.
Rui Tato Marinho explicou que tal como a COVID-19, as hepatites também são vírus, mas que afetam o fígado em vez do pulmão, e constituem um problema de saúde pública.
“São vírus que conhecemos muito bem, conhecemos as cadeias de transmissão, sabemos que há pessoas assintomáticas, como há na COVID-19″, mas existem testes serológicos, marcadores das hepatites e teste de diagnóstico PCR.
Também há vacinas para algumas hepatites, tratamento e cura. “Portanto, temos uma panóplia de ‘armas'”, de intervenção médica e de saúde pública, que “desejávamos para a COVID com a máxima urgência”.
Com esta intervenção, assinalou, evitam-se as consequências desta doença, a cirrose e o cancro do fígado, que matam 1,5 milhões de pessoas anualmente no mundo.
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