“Antes de terem lesões cerebrais, demência vascular e AVC já começam [doentes hipertensos e diabéticos] a ter a ligação entre neurónios e microvasos sanguíneos mais preguiçosa, mais lenta e menos intensa”, disse hoje à Lusa uma das coordenadoras do estudo que a equipa da FMUP levou a cabo em articulação com investigadores da Northwestern University Feinberg School of Medicine de Chicago, nos EUA, Elsa Azevedo.
Esse défice ou disfunção significativa na articulação é detetável ainda sem existência de quaisquer sintomas de doença cerebrovascular, referiu a professora da FMUP.
Elsa Azevedo referiu que a conexão entre a atividade neuronal e a resposta vascular é essencial para garantir o normal funcionamento do cérebro.
“Normalmente é necessário aumentar o aporte de sangue às zonas cerebrais que se encontram mais ativas em determinado momento e isso é conseguido pelo mecanismo fisiológico do acoplamento neurovascular, isto é, de articulação entre os neurónios e os vasos sanguíneos que os suprem. Este mecanismo precisa de estar bem afinado para um bom funcionamento cerebral”, esclareceu.
Apesar de falar numa descoberta “promissora”, a investigadora assumiu que serão necessários mais estudos antes da sua utilização por rotina na prática clínica.
O objetivo é ir “mais atrás” e entender o que está na origem dessa lesão cerebral para se poder corrigir e prevenir os AVC “tanto quanto possível”, ressalvou.
No estudo participaram doentes com hipertensão que nunca tiveram AVC, tendo os mesmo sido sujeitos a exames não invasivos de imagem, nomeadamente Doppler transcraniano para análise dos principais mecanismos reguladores da vasorreatividade cerebral e a ressonância magnética para avaliação do volume de lesões de substância branca no cérebro.
O Doppler é um teste não invasivo que permite estimar o fluxo de sangue através dos vasos sanguíneos mediante o recurso a ultrassons que incidem sobre as células do sangue.
Durante a estimulação visual, os investigadores verificaram que “os doentes hipertensos apresentam menor aceleração na velocidade do fluxo sanguíneo na artéria que irriga o córtex visual, apresentando uma resposta mais lenta face ao aumento das necessidades originadas pelo estímulo, bem como uma menor flexibilidade na resposta, quando comparados com pessoas saudáveis, sem hipertensão arterial”, afirmou a investigadora.
Já em doentes com hipertensão e diabetes, “os resultados obtidos foram ainda piores, o que aponta para défices precoces do acoplamento neurovascular, anteriores ao aparecimento de sintomas de doença cerebrovascular”, acrescentou.
Assim, o estudo mostra que doenças como a hipertensão e a diabetes podem afetar negativamente o cérebro antes mesmo do aparecimento de doenças cerebrovasculares, como acidentes vasculares cerebrais (AVC) ou alterações cognitivas.
Participaram no trabalho os investigadores da FMUP Ana Monteiro, Pedro Castro, Gilberto Pereira, Carmen Ferreira, Jorge Polónia e Elsa Azevedo, bem como Farzaneh Sorond e Andrew Milstead, da Northwestern University Feinberg School of Medicine.
O estudo foi já publicado no jornal da especialidade Frontiers in Aging Neuroscience.
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