Em comunicado, o instituto da Universidade do Porto esclarece que a coesão do tecido epitelial é "essencial" à vida animal, e que sem a capacidade de criar "uma barreira à superfície dos nossos órgãos" - formada por células - seria "impossível separar os diferentes ambientes de um organismo ou assegurar uma proteção do ambiente exterior".

"O tecido epitelial permitiu a evolução dos animais complexos, como as estrelas-do-mar, a mosca-da-fruta ou o ser humano, mas esta coesão do tecido epitelial pode ser posta em causa", destaca o i3S, lembrando que a rutura da barreira formada pelo tecido epitelial está associada a inúmeras doenças, como as doenças inflamatórias do intestino ou a maioria dos tumores malignos.

Nesse sentido, os investigadores tentaram perceber quais as causas diretas da quebra do tecido epitelial, tendo concluído que o problema pode estar associado à perda de uma das funções da proteína aPKC.

"Apesar de esta proteína ser já bem conhecida da comunidade científica, os investigadores descobriram agora que a perda de aPKC desregula a força que as células exercem umas sobre as outras e que, força a mais, pode romper o tecido epitelial", adianta.

Para isso, recorreram a uma técnica que utiliza a luz como um interruptor para desligar um gene em tempo real, designada optogenética, tendo concluído que no momento em que a proteína aPKC é "silenciada", a força exercida pelas células "aumenta muito".

Citada no comunicado, a primeira autora do artigo científico, publicado na revista Current Biology, esclarece que as células epiteliais "começam imediatamente a contrair".

"Em pouco minutos conseguimos observar como se formam grandes buracos entre células dentro do tecido epitelial. A quebra acontece inicialmente junto às células em divisão celular, que funcionam como um ponto fraco onde ocorre rompimento quando o tecido contrai", explica Mariana Osswald.

Também Eurico Morais de Sá, líder do estudo, salienta que a equipa não só descobriu qual a função específica da aPKC que está na "origem de um tipo de anomalia epitelial", como descobriu que "a quebra da barreira epitelial pode resultar da desregulação da força exercida pelas células".

"Trata-se de uma interpretação completamente nova da origem deste defeito epitelial, uma vez que a quebra da barreira epitelial é normalmente atribuída a morte celular ou a uma falha na ‘cola’ que une as diferentes células e não a um excesso de força", destaca o investigador, acrescentando que a investigação pode vir a ter impacto na compreensão e tratamento de algumas doenças.

Esta “é uma descoberta de biologia fundamental e, por isso, o seu impacto maior é na nossa compreensão do funcionamento da vida animal, mas é provável que tenha implicações a longo prazo na compreensão e tratamento de doenças", afirma, tais como o cancro.

"Sabendo que a maioria dos tumores tem origem em tecido epitelial, podemos dizer que a nossa descoberta permitiu identificar um mecanismo que produz o tipo de desorganização celular que é observado em alguns tumores malignos, o que pode representar um passo para o desenvolvimento de terapias que interfiram com a desorganização epitelial e travem a progressão da doença", acrescenta.

A investigação, desenvolvida pelo grupo "Epithelial Polarity & Cell Division" do i3S, contou com a colaboração de outros grupos de investigação da NOVA Medical School, em Lisboa, e da Universidade de Dundee, no Reino Unido.