“Alterações na distribuição das espécies não terão apenas implicações para a conservação das mesmas. Acarretam uma ampla gama de desafios para a saúde humana, para os serviços prestados pelos ecossistemas e para a viabilidade de várias atividades económicas”, alertou a investigação.

O estudo, publicado hoje pela revista Science, foi liderado por Gretta Pecl, da Universidade da Tasmânia (Austrália), e envolveu uma equipa internacional, que incluiu Miguel Araújo, do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO-inBIO) da Universidade de Évora (UÉ).

Num comunicado do CIBIO-inBio, Miguel Araújo, que lidera uma equipa de investigação do centro, lembrou que os efeitos das alterações do clima na distribuição das espécies já são estudados “há décadas”, mas este novo estudo é inovador. “É o primeiro que, de forma sistemática, procura avaliar o efeito dessas alterações em aspetos essenciais para a qualidade de vida e sobrevivência humanas”, realçou.

O trabalho científico liderado por Pecl revelou “como os seres humanos já estão a ser e poderão vir a ser ainda mais afetados pelas mudanças na distribuição de espécies terrestres, marinhas e de água doce”, devido às alterações climáticas globais. "Muitas plantas e animais estão a responder às alterações climáticas movendo-se para altitudes mais elevadas, maior profundidade nos oceanos e/ou em direção aos polos”, destacou.

Humanos dependem dos ecossistemas para comer

Como os seres humanos dependem dos ecossistemas naturais para alimentação, indústria, saúde e para vários aspetos das culturas locais e regionais, assinalaram, estas mudanças na distribuição das espécies “afetam a Humanidade de muitas formas distintas”.

Ao nível da saúde humana, os cientistas indicaram que “ameaças como a malária estão a tornar-se mais prevalentes, à medida que o aumento da temperatura permite a propagação de mosquitos em regiões onde as pessoas não têm tido uma exposição prévia às doenças”.

15 consequências das alterações climáticas para a saúde

O estudo abordou igualmente os conflitos, realçando que “as tensões começam a surgir, à medida que as espécies se movem entre as zonas económicas ou devido a disputas sobre acessos e usos do solo, como as que ocorrem à medida que o gelo do Ártico derrete, dando origem a novas rotas de comércio”.

“Os peixes, as florestas e as culturas agrícolas estão em risco, à medida que seus ambientes mudam, estando previstas alterações nas principais regiões produtoras de café, além de perdas de inúmeras espécies de madeira valiosa”, dizem, em relação aos recursos disponíveis.

Ao analisar as indústrias, os cientistas alertaram que o turismo e a pesca recreativa “são prejudicados em várias localidades onde desempenham papéis importantes nas economias locais, à medida que os corais morrem, as alforrecas infestam as águas utilizadas para a recreação e as expansões climaticamente motivadas dos ouriços destroem os habitats dos peixes nas florestas de algas marinhas”.

A redistribuição das espécies, nomeadamente dos peixes e das renas, assinalaram, também estão a afetar “a segurança alimentar e os sistemas de conhecimento tradicional” de culturas indígenas, como é o caso dos povos do Ártico.

“Num mundo em mudança, há ganhadores e perdedores. A questão de fundo” é saber “quem ganha e quem perde e se as vantagens superam as desvantagens no médio e longo prazo”, não existindo, por agora, “dados que apoiem a tese de que as vantagens superem as desvantagens”, frisou Miguel Araújo, que integra também o Conselho Superior de Investigação Científica de Espanha.