O que é a Distrofia Muscular de Duchenne e quais são os seus sintomas? 

A Distrofia Muscular de Duchenne (DMD) é uma doença neuromuscular rara, hereditária e degenerativa, ligada ao cromossoma X e ocasionada pela inexistência de uma proteína no músculo, a distrofina, levando a uma perda progressiva de fibras musculares que são substituídas por fibrose e tecido adiposo.

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A maioria dos doentes manifesta os primeiros sintomas no início do segundo ano de vida, com algum atraso na aquisição da marcha, tornando-se, esta, instável, ocasionando quedas frequentes, dificuldade em se levantarem do chão, subir e descer escadas, incapacidade em correr. Frequentemente a família nota que tendem a andar em pontas de pés e que os músculos das pernas (gémeos) são mais volumosos e duros. Em alguns casos, verifica-se um atraso de linguagem e algumas dificuldades de aprendizagem.

A Distrofia Muscular de Duchenne pode afetar qualquer pessoa? Quais os grupos de risco? 

A DMD afeta mais de 300.000 pessoas em todo o mundo e, segundo as últimas estatísticas, uma em cada 3.500 recém-nascidos do sexo masculino. Embora de forma muito residual, a doença também se pode manifestar no sexo feminino. Pode dizer-se que os grupos de maior risco são aqueles onde haja história familiar deste tipo de patologias. No entanto, esta patologia pode surgir em qualquer pessoa. Não se sabe exatamente porquê, embora a doença tenha causas genéticas.

 Qual é o grau de hereditariedade?

Em cerca de dois terços dos casos de DMD, a mutação responsável pela doença foi herdada da mãe do seu portador que geralmente é assintomática. As mulheres que são portadoras da mutação no gene DMD têm, em cada gestação, 50% de possibilidades de transmitir esta alteração, o que significa que tanto podem ter um menino afetado (25%), como uma menina portadora (25%). Esta, por sua vez, poderá transmitir a mutação aos seus descendentes.

Joaquim Brites
Joaquim Brites, presidente da Associação Portuguesa de Neuromusculares créditos: Arquivo pessoal de Joaquim Brites

Como é feito o diagnóstico? Existe a possibilidade de detetar a doença em ambiente fetal? 

Se não detetadas no momento do nascimento, as primeiras manifestações de DMD aparecem no início da infância. As crianças afetadas apresentam algum atraso ao nível motor ou no seu desenvolvimento. Na maioria dos casos, as crianças portadoras de uma miopatia de Duchenne dificilmente atingem capacidade evidente de correr ou de saltar. O diagnóstico, na maioria dos casos, acaba por ser feito através dos sintomas que aparecem por volta dos quatro ou cinco anos de idade, alertando os pais para a anormalidade e levando-os a consultar o médico.

Os seus portadores veem alteradas as suas capacidades durante a infância perdendo a marcha no início da adolescência, assim como a capacidade de usar os braços, impedindo-os de realizar normalmente as atividades diárias tais como escrever ou alimentar-se. A sua capacidade de respirar também se deteriora. À medida que crescem, estes jovens sentem cada vez mais dificuldades em respirar e, normalmente acabam por sucumbir devido a problemas respiratórios ou insuficiência cardíaca.

Dado que é difícil detetar a doença em ambiente fetal, o que apenas acontece se houver razões muito evidentes para essa necessidade, o rastreio da portabilidade de uma alteração genética deve ser feito à mãe, em caso de suspeita ou de histórico familiar. Nesse caso, o aconselhamento genético será fundamental para uma gravidez saudável.

Existe tratamento? 

Apesar de não ter cura, há muitas medidas que podem ser tomadas para ajudar doentes e famílias. Entre os quatro e os seis anos de idade, quando as capacidades motoras da criança começam a ser afetadas, ou logo que seja possível efetuar o diagnóstico, os portadores de DMD podem ser submetidos a um tratamento de corticoterapia, que se traduz na administração de corticosteróides. Para além disso, e exclusivamente para a mutação “Non Sense”, já é possível iniciar um tratamento com Atalureno (princípio ativo do medicamento) que visa obter uma melhoria significativa da função muscular.

Este medicamento, ainda não comparticipado em Portugal, está a ser fornecido a cerca de 10 crianças com esta mutação, ainda com capacidade de marcha. A não comparticipação torna o processo mais moroso e passa pela apresentação de um pedido de Autorização de Utilização Excecional (AUE). Tal procedimento, para além de atrasar o início do tratamento, causa alguma apreensão, ansiedade e expetativa na família, podendo, até, o processo de prolongamento da capacidade de marcha ser comprometido. A comparticipação do medicamento seria uma boa solução, porque cada dia que passa, é um dia que se perde. E no caso destas crianças qualquer atraso compromete, irremediavelmente, a sua qualidade de vida.

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Quais são os maiores entraves ao tratamento? 

Embora dependente da mutação e da evolução mais ou menos grave da doença, pode dizer-se que a qualidade de vida destes doentes depende sempre do ambiente que os rodeia. Para além de uma família robusta, ao nível psicológico e físico, estas pessoas precisam de ser reconhecidas pelo Serviço Nacional de Saúde, como doentes crónicos que precisam de tratamentos de manutenção ao longo de toda a sua vida. Está mais do que demonstrado que tratamentos regulares de fisioterapia e hidroterapia evitam o aparecimento de contraturas precoces, de escolioses e de outras deformidades que afetam o sistema respiratório e cardíaco. Lamentavelmente, não estão criadas, ao nível hospitalar, as condições necessárias para que estes doentes tenham esses tratamentos. Para além de não haver condições físicas como salas bem equipadas e piscinas de tratamento, faltam também os recursos humanos devidamente especializados nestas doenças.

A falta de financiamento continua a ser a desculpa para a ausência dessas condições. No entanto, verifica-se uma duplicação de custos quando se suportam processos clínicos em hospitais e, simultaneamente se pagam tratamentos por credenciação aos serviços privados convencionados.

Em resumo, o acesso rápido aos tratamentos que vão surgindo, continua a ser uma das maiores preocupações da APN. É fundamental que se ultrapassem algumas barreiras burocráticas nas Autorizações de Introdução no Mercado. Para além disso, é urgente definir a sua taxa de comparticipação pelo Serviço Nacional de Saúde, que se exige de 100%, tal como acontece em outros países da Europa.

É possível ter uma vida normal com Distrofia Muscular de Duchenne?

Apesar das muitas limitações impostas a estes doentes, é possível ter uma vida dentro dos padrões, ditos, normais. Dada a sua progressividade, é necessário que a doença seja acompanhada por uma equipa médica multidisciplinar, o mais completa possível. Um bom acompanhamento familiar e uma informação rigorosa sobre a evolução da DMD permite uma condição social mais integrada e um contexto sociocultural mais favorável para o doente e para a família.

Sendo uma componente essencial para a qualidade de vida destes doentes, a família vê comprometidos, muitos dos seus sonhos. Na grande maioria dos casos, um dos pais, normalmente a mãe, abandona a sua carreira profissional para poder cuidar do(s) seu(s) filho(s). Sendo este fato, completamente ignorado pelo Estado Português, que não tem criado condições para que estes “cuidadores informais” tenham um estatuto próprio, sem prejuízo da sua carreira profissional e contributiva, constitui-se como mais um entrave para a vida “normal” dos portadores de DMD.

Para os doentes que conseguem uma formação académica normal, seria importante que as empresas fossem mais inclusivas e adaptadas, para a integração profissional destas pessoas. Uma ocupação profissional também faz parte de uma vida normal.