Ser enfermeiro não é fácil. Múltiplas são as barreiras ao investimento na profissão – excesso de trabalho, falta de recursos humanos, défices graves na organização e aplicabilidade da carreira, assim como uma persistente má remuneração.
Esta realidade é ainda mais notória e preocupante para os jovens enfermeiros, que investem cada vez mais na sua formação, sem que lhe seja retribuído o devido mérito.
Pós-graduações, especializações, mestrados, doutoramentos, cursos complementares e formações avançadas são exemplos do investimento académico de muitos dos enfermeiros portugueses.
A vontade de expandir conhecimentos, desenvolver competências e melhorar profissionalmente e contribuir ativamente para o avanço científico levam muitos dos enfermeiros a procurarem novas experiências e oportunidades de crescimento, como por exemplo em congressos.
Os congressos em saúde são reuniões de profissionais com interesses comuns em determinadas áreas de atuação, onde são exibidas as mais recentes abordagens científicas e inovações. Os congressos são um fértil complemento académico, por serem enriquecidos com momentos de grande partilha profissional, onde se confrontam realidades, compartilham experiências e alargam horizontes.
Este ano, depois de várias experiências nacionais, decidi participar num congresso internacional. O desejo de melhorar os cuidados que presto enquanto enfermeira foi a principal motivação para comparecer neste evento.
Para participar num congresso existem custos diretos e indiretos: custos de inscrição, passagens aéreas, estadia, alimentação, transporte, entre outros. Os enfermeiros que participam nestes congressos, representam o seu país e as instituições de saúde onde trabalham. Em Portugal, quase na totalidade das vezes, todos os custos inerentes à participação num congresso são suportados pelo próprio. Para participar num congresso, os enfermeiros, muitas vezes têm de despender do seu próprio tempo livre, com folgas ou dias de férias, quando pela lei, estes dias lhes deviam ser concedidos. Porém, devido à carência crónica de recursos humanos, os seus direitos são-lhes negados. Os fatores apresentados são, logicamente, encargos difíceis de suportar e, consequentemente, inibidores da participação. Porém, e ainda assim, muitos enfermeiros portugueses fazem um esforço colossal para acederem a estas experiências internacionais.
Em contexto de congresso, são apresentadas as mais recentes guidelines, inovações e investigações na área, e a partilha multinacional é a mais fascinante criadora de ideias. A mudança, renovação e novidade foram constantes palavras utilizadas pelos melhores investigadores na área presentes nas várias sessões, e a motivação pela melhoria é a impulsionadora do investimento dos profissionais reunidos no congresso.
Neste meio é possível aprender, mas também partilhar. O networking é fundamental nos dias de hoje, e este é o momento ideal para trocar experiências, impressões, informações e potencializar oportunidades através de relacionamentos. É possível conversar com o investigador de um tema do nosso interesse e trocar opiniões e sugestões. É possível ouvir ideias para futuros trabalhos a desenvolver do presidente de uma sociedade num país diferente, dos investigadores mais conceituados da europa, dos enfermeiros mais experientes de outro país e/ou de um colega que trabalha na cidade vizinha. Tudo é válido, importante, mutável e aplicável e o conhecimento está na partilha.
Esta foi a minha primeira experiência num congresso internacional e entendi que a diferença de realidades pela Europa é abismal.
Ao longos dos dias de congresso nas partilhas que tive com enfermeiros de outros países, entendi que existem países na europa onde os enfermeiros têm condições de trabalho mais justas, com melhores ordenados, com mais valorização e onde desfrutam de uma carreira estruturada, equitativa e digna onde as suas diferentes valências se encontram devidamente representadas. Carreiras essas devidamente remuneradas. Existem países onde existe facilidade de mudar de hospital, de serviço ou de área de atuação, sem que a sua remuneração seja afetada. Existem países onde as instituições de saúde incentivam, patrocinam e investem na formação dos enfermeiros, onde os custos de formação são suportados pela instituição de saúde em que trabalham, onde lhes é concebida uma redução de horas laborais durante o período de formação para incentivar o sucesso. Existem países onde os enfermeiros são convidados a participar em congressos internacionais e onde todos os custos são pagos pela instituição de saúde onde trabalham. Existem países que sabem que investir na formação dos seus profissionais de saúde significa melhorar as próprias instituições de saúde e que esse é um investimento seguro. Existem países onde existe carreira de enfermeiro investigador, e que proporciona a hipótese de trabalhar a tempo inteiro na pesquisa de novos conhecimentos, processos e evolução da profissão de enfermagem e da ciência. Existem países onde os enfermeiros são valorizados.
A realidade portuguesa ainda não acompanha os países mais desenvolvidos da Europa e o caminho a fazer no sentido de melhorar as condições de trabalho dadas aos enfermeiros é ainda longo. Mas parar não é uma escolha.
Estas ocasiões são momentos chaves para expor realidades. É essencial entender a real necessidade dos enfermeiros portugueses, melhorar as suas condições de trabalho e possibilitar o investimento na sua formação – estes dois agentes são indissociáveis para melhorar a sua satisfação. Enfermeiros motivados e com melhores condições de trabalho, podem elevar os níveis de cuidados, otimizar processos, produzir novas ideias e criar diferentes visões, contribuir para a mudança e atingir patamares de excelência.
Aquilo que mais ouvi ao longo destes dias, foi que sozinhos não conseguimos fazer nada e que precisamos sempre dos outros no processo.
Então façamos diferente, juntos.
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