A Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) ignorou a disponibilidade dos hospitais públicos para operarem uma criança com dez meses, tendo autorizado esta operação e mais outras cinco no Hospital da Cruz Vermelha.
O caso foi conhecido através de uma reportagem televisiva, difundida em janeiro, na qual os pais do menino - Rafael -, uma criança na altura com nove meses e uma cardiopatia congénita, a necessitar de uma cirurgia, apelavam para que o filho fosse operado no Hospital da Cruz Vermelha, onde estava a ser seguido.
Na altura, a operação ainda não tinha sido concretizada, pois o protocolo entre a ARSLVT e o HCV que a viabilizaria estava suspenso, tendo para tal contribuído uma auditoria do Tribunal de Contas (TC), a denunciar que alguns doentes foram enviados para esta instituição, apesar de haver capacidade em unidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Alheios a esta questão, os pais desesperavam por ver o seu filho operado, como contou à Lusa o pai de Rafael, Abel Beja.
Questionado sobre a razão pela qual o filho não ter sido entretanto operado em outro hospital, evitando pelo menos um mês de espera, Abel Beja disse desconhecer a razão e achar que a intervenção só era possível no HCV.
O pai da criança assume a natural preferência por ver o filho ser operado pelos profissionais do HCV que o seguiram desde os primeiros problemas de saúde, que aconteceram quase após o nascimento, em abril do ano passado, quando ainda estava em vigor o protocolo.
Após o conhecimento público do caso, que motivou, inclusive, uma petição on-line e perguntas à tutela de partidos políticos, o Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC), que inclui o Hospital de Santa Marta, uma referência na área da cardiologia, “estranhou o desenvolvimento deste processo, uma vez que a instituição reúne as necessárias condições e competências para realizar esta e todas as intervenções cirúrgicas cardíacas pediátricas necessárias”.
De acordo com o conselho de administração do CHLC, este comunicou à ARSLVT, com conhecimento à tutela, “a sua total disponibilidade para, em tempo útil, realizar a respetiva intervenção cirúrgica, bem como qualquer outra que seja necessária a crianças que se encontrem em situação idêntica”.
O secretário de Estado e Adjunto da Saúde respondeu no sentido de garantir que “iria reencaminhar a informação recebida à ARSLVT, a fim desta tomar as iniciativas entendidas como necessárias e divulgar publicamente que o SNS tem capacidade instalada para resolver todas as necessidades de cirurgia cardíaca pediátrica, nomeadamente através do CHLC – Santa Marta”, segundo este centro hospitalar.
Apesar desta informação, e do protocolo com o HPV estar suspenso, o presidente da ARSLVT optou por dar uma autorização especial para a cirurgia se realizar neste hospital.
Em esclarecimentos à Lusa, fonte deste organismo explicou que “foi inicialmente sugerida a intervenção” dos hospitais de Santa Marta ou de Santa Cruz, que não foi seguida por se tratar de uma reintervenção.
“Faz parte da qualidade de um serviço de saúde que um doente possa ser assistido pela mesma equipa que o acompanha desde o primeiro momento”, adianta a ARSLVT.
Contatado pela Lusa, fonte do HCV limitou-se a dizer que o hospital realizou a intervenção porque a isso foi autorizado e que esta unidade de saúde tem “conhecimento, disponibilidade e vontade” de realizar todas a que seja solicitado para fazer.
Além do Rafael, que já foi operado e se encontra a recuperar, o presidente da ARSLVT deu entretanto mais cinco autorizações especiais para outras tantas crianças serem operadas no HCV.
O caso tem causado forte incómodo nos profissionais dos hospitais públicos de referência de cardiologia, que não entendem a razão do Estado pagar por cirurgias que as unidades do SNS têm capacidade para realizar, e acontece numa altura em que se aguarda a decisão do Governo em relação ao futuro do protocolo suspenso.
5 de março de 2012
@Lusa
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