Um estudo recente da responsabilidade de José Caldas de Almeida, desenvolvido enquanto coordenador nacional para as doenças mentais, indica que quase 23 por cento dos portugueses tiveram uma doença mental nos 12 meses antecedentes ao inquérito que suportou a investigação. Este valor coloca Portugal no topo da lista europeia deste tipo de patologias e muito próximo dos Estados Unidos da América, que registou 26,4 por cento. As perturbações psiquiátricas mais frequentes na população portuguesa são a ansiedade e a depressão.

O estudo, apresentado publicamente há cerca de cinco anos, antes da fase pior da austeridade que vivemos, demonstrou ainda que a maioria das doenças mentais detetadas não foi devidamente tratada. O stress está na origem de muitas destas doenças e, nos dias que correm, é quase impossível fugir dele. É a carreira, a vida familiar, o dia a dia que passa a correr e a constante falta de tempo para descansar. Será possível viver sem stresse? A resposta é afirmativa, como poderá confirmar nas linhas que se seguem.

Viver melhor

Para Sérgio Klepacz, médico psiquiatra presente no encontro, a personalidade individual influencia a longevidade. «Pessoas com uma personalidade muito ansiosa envelhecem mais rapidamente». Uma das características da sociedade actual é precisamente o envelhecimento precoce decorrente do stresse. «Pessoas jovens com 35 e 40 anos já se encontram a envelhecer, o que é preocupante», assinala este especialista que, apesar de atribuir o devido valor aos fármacos, considera que o paciente tem de ser responsável pelo seu futuro através de um estilo de vida adequado.

A solução passa forçosamente por uma alimentação saudável e pela prática de exercício físico. «O bem-estar, a estabilidade emocional e a consciência da sua personalidade permitir-lhe-á viver mais três a cinco anos», realça. O especialista identifica ainda o hipocampo como uma das áreas do cérebro associada aos problemas mentais. «Desordens psiquiátricas, como a depressão, a ansiedade, a doença bipolar e os estados fóbicos podem estar acompanhados de distúrbios hormonais, o que pode provocar o mau funcionamento do hipocampo», refere.

Agir na defensiva

O desenvolvimento do processo de stresse «depende tanto da personalidade do indivíduo como do estado de saúde em que este se encontra (equilíbrio físico e mental), por isso nem todos desenvolvem o mesmo tipo de resposta diante dos mesmos estímulos», salienta Sílvia Victor, psicóloga clínica. Para os mais suscetíveis, existem «estratégias que permitem lidar com o stresse a qualquer momento da vida», afirma. Está preparado? Comece por inspirar, expirar, inspirar, expirar para atingir a tranquilidade num momento de stresse.

Posteriormente, deve «adoptar hábitos de vida saudáveis, como a prática de desporto, hobbies e ter cuidado com a imagem. São gestos extremamente importantes para construir uma boa auto-estima que nos tornará mais seguros de nós próprios e, consequentemente, menos vulneráveis ao stresse», sugere. De igual modo, uma atitude optimista perante a vida assume um carácter extremamente importante. «Torna-se fundamental que, no nosso quotidiano, adoptemos uma postura positiva e realista da vida, dos outros e de nós próprios», explica a psicóloga clínica.

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8 aspetos a ter em conta

A trabalhar como coach há cerca de 10 anos, Rosemar Abreu defende que «o stresse advém, sobretudo, de uma vida desequilibrada». Existem oito áreas que as pessoas devem ter em conta no seu dia a dia. A família, os amigos e vida social, a saúde, a carreira, o aspeto financeiro, o romance, o desenvolvimento pessoal e a espiritualidade, os hobbies e o ambiente em que vive. «A forma como cada pessoa avalia e confere importância a cada uma destas parcelas é única e individual», diz.

«Quando uma pessoa coloca toda a sua energia numa área em detrimento de outras vai fazer com que, ao longo do tempo, entre num grau de insatisfação que é causador de stress», acrescenta ainda. Imagine que está muito centrado na sua carreira e abdicou de outros pilares importantes na sua vida. A pergunta que se coloca é «Tem consciência desta realidade?». «Quando se perde a consciência dos vários pilares, a pessoa começa a entrar em desequilíbrio. A vida deve constituir uma busca regular de estabilidade, a procura de satisfação nas oito áreas que compõem a vida de cada um, pois as necessidades estão sempre em constante mudança», explica Rosemar Abreu.

Rumo ao equilíbrio

Em primeiro lugar, importa definir os objetivos para cada uma das áreas da vida. «O que quero da minha carreira? O que é que pretendo atingir a nível da saúde? Só existem duas direções possíveis. Ou a pessoa caminha para a satisfação das necessidades pessoais ou simplesmente não o faz», alerta a coach. Para que a mudança seja efetiva e positiva, cada um de nós tem de saber do que não gosta em si. «Este desafio constitui uma enorme responsabilidade individual», diz. «Após esta tomada de consciência, está dado o primeiro passo, mas nem sempre o esforço individual é suficiente», comenta ainda. 

Quando não é possível mudar por si própria, é adequada a procura de ajuda especializada, seja um terapeuta, um coach ou um psicólogo», aconselha Rosemar Abreu. Existem alguns sinais que podem indicar que o stresse está a tomar conta do seu dia a dia. «Sempre que a presença destes sintomas se agrave ou dure mais de um mês e/ou se os sintomas impedirem o indivíduo e a sua família de prosseguirem normalmente o seu dia-a-dia, deverá ser ponderado o apoio de um profissional especializado», aconselha Sílvia Victor.

Sem idade

Será que o stresse é um problema exclusivo da idade adulta? «No processo de desenvolvimento, as crianças e os adolescentes deparam-se com inúmeras situações que podem ser potencialmente perturbadoras», explica Sílvia Victor, psicóloga clínica. Tal facto deve-se, em parte, à vida agitada dos pais e «à falta de tempo que existe para a família, o que pode originar sintomas de stress nos mais novos». É um ciclo vicioso que não há como evitar, pensamos nós, quando, na realidade, somos parte da solução.

Para que o sistema familiar funcione, Sílvia Victor considera que «é fundamental passar tempo de lazer com a criança. Além da quantidade de tempo que os pais/educadores passam com os filhos, a qualidade desse torna-se essencial para um desenvolvimento saudável». Assim, é importante «acompanhar o mais possível a criança no seu percurso escolar e criar um espaço agradável onde esta possa estudar, brincar e desenvolver-se de forma saudável», defende a psicóloga clínica.

Por último, os pais devem tentar detectar qual a origem do stress da criança, com vista a ajudá-la a desenvolver estratégias que a permita lidar com essa tensão. Pequenos gestos como a leitura de um livro ou assistir a um filme poderão assumir um papel verdadeiramente importante ajudando a criança a «descentralizar-se da fonte geradora de stresse», sugere ainda a especialista.

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Precisa de ajuda?

Esteja atento aos sinais e saiba quando procurar um especialista. Estas são as manifestações sintomáticas a que deve estar atento:

- Crises de ansiedade e angústia

- Diminuição do rendimento escolar ou profissional

- Distrações frequentes

- Insónias ou sono agitado

- Pesadelos

- Irritabilidade

- Vontade de chorar

- Diminuição de concentração e memória

- Isolamento

- Mau humor

- Fobias

- Perturbações digestivas ou cardíacas

- Mãos frias/húmidas

- Diminuição ou aumento de apetite

Texto: Cláudia Pinto com Rosemar Abreu (coach certificada), Sérgio Klepack (psiquiatra) e Sílvia Victor (psicóloga clínica)