Aconselha-se um champanhe seco, borbulhante e fresquíssimo, saído directamente do congelador, como companhia ideal para estimular a percepção do universo de sabores instigados pelo fascínio da prova de um miniblini, essa espécie de pequena panqueca ligeiramente salgada que serve de base ideal para a degustação aqui proposta e sobre a qual acabou de esculpir cuidadosamente um montinho de caviar encimado por um cume de natas azedas. Sim, é de caviar que falamos... E agora trinque as pequenas ovas, uma por uma, e deixe-as explodir no interior da boca, estimulando as inúmeras papilas gustativas que o farão sentir viajar pelo paladar do esturjão – e pelos sabores do mar, do rio, do sal... Entregue-se ao luxo, neste Natal, de degustar tão reconfortante e delicada iguaria, limitando-se simplesmente a levar à boca uma colher cheia de caviar, mas sem esquecer a indispensável comp nhia... por exemplo, de uma vodka fresca, se o quiser fazer à boa maneira russa, evocando as paisagens que, da profundeza das águas, o esturjão foi atravessando: os mares Cáspio, Negro e de Azov, os rios siberianos, o lago Baikal, chegando a distâncias tão longínquas como Ratisbon ou Ulm. Saboreie esta preciosidade e deleite-se, guardando a memória do seu sabor, seguramente por muito tempo...

 

Beluga, Osetra e Sevruga
Ovas de esturjão topo de gama

 

Objecto de extravagâncias desde servir de alimento para gulosos gatos de multimilionários ou comprado em enormes quantidades para banhos de não menos afortunados, ou ainda como ingrediente principal da “pizza” mais cara do mundo, o caviar espicaça frequente mente a tolice, sem mais, pelo seu custo elevado. Mas tudo isso desvia o interesse verdadeiro pelo caviar, que é uma preciosidade de sabor, riquíssimo em aromas e requintadíssimo no seu fim de boca – e, desculpem-me o segregacionismo, exclusivamente digno de degustação por verdadeiros apreciadores. Provavelmente, a sua exploração gastronómica ter-se-á iniciado nas proximidades de águas frias, doces e russas, na época dos czares, que durante séculos protegeram as espécies mais apreciadas, tentando estimular a sua procriação e condicionar a quantidade consumida. Referências históricas ao esturjão encontram-se na cunhagem de moedas tunisinas e crimeias desde 600 a.C, indicando que as suas ovas seriam já muito apreciadas. Desde esse tempo que o caviar, raro e feudalista, seria reservado apenas aos frequentadores das cortes europeias. No séc. XIV, Eduardo VII proclamava que todo o esturjão pescado nas águas do Tamisa, sobre a ponte de Londres, estavam reservados à realeza. Apenas no séc. XVIII, o Malossol (caviar um pouco salgado) começou a ser consumido um pouco por toda a Europa. O “verdadeiro” caviar, extremamente rico em proteínas, vitaminas e minerais, tem origem nu ma palavra persa e significa literalmente “produtor de ovas”, mas referindo-se especificamente ao produtor – o esturjão – e às suas ovas em conjunto. Trata-se de ovas oriundas de uma das mais antigas famílias de espécies piscícolas do mundo – o esturjão ou o “acipenseridae” –, um verdadeiro dinossauro vivo, mas de barbatanas, com dezenas de milhões de anos de história. Um extraordinário e enorme peixe que pode ter entre um a seis metros de comprimento, capaz de viver 100 anos, com focinho e barbas, e umas escamas pré-históricas sobre o dorso. É genericamente considerado um peixe de mar, que sobe os rios no início do Verão para desovar e, algumas vezes, por razões que a natureza mantém encobertas, os sobem novamente já após a época quente.

Apenas uma ou outra espécie está confinada a viver exclusivamente em “águas frescas” de rio e não existem, que se saiba, nenhumas que sejam oriundas dos trópicos ou sequer do hemisfério sul. Pode bem dizer-se que o melhor caviar é oriundo do esturjão selvagem que frequenta o mar Cáspio nos territórios do Azerbeijão, Irão e Rússia, e também o mar Negro (apesar de tanto o Canadá como os EUA serem grandes fornecedores de caviar, sobretudo para a Europa, e de existirem diferentes espécies de esturjão na China ou no Japão). Das mais de 20 espécies de esturjão conhecidas, as suas variedades mais apreciadas (e mais caras...) são o caviar Beluga, Osetra e Sevruga. De uma forma geral, os factores considerados para a determinação da qualidade do caviar são o tamanho, a uniformidade e a consistência dos grãos, mas também a sua cor, odor e brilho, e ainda a textura da pele dos próprios ovos.

 

 BELUGA

O caviar de esturjão Beluga, também conhecido como “caviar real”, é o mais apreciado, mas também o mais caro de todos: disponha-se a pagar, sem cerimónias, 500 euros por apenas 100 gramas. De enormes dimensões, produz os ovos maiores (que podem atingir o tamanho de uma ervilha) e ostenta a mais clara da típica tonalidade cinza do caviar, apresentando uma textura sedosa e rica. Aliás, o Beluga é normal - mente classificado em graus consoante a sua cor: do 0, mais escuro, até 000, mais claro.

E quanto mais claro, melhor...

 


 
OSETRA

O caviar Osetra é o típico caviar do esturjão russo ou persa. Os seus ovos são mais pequenos que os de Beluga e a sua cor varia entre um cinzento acastanhado e o dourado. Na sua prova, é frequentemente referido o sabor a noz, e tem uma forte componente aromática.

 

SEVRUGA

O caviar de Sevruga apresenta ovos menores, mais finos, e de uma cor cinza escuro ou preto esverdeado. Entre os caviares genuínos, é normalmente o mais acessível nas regiões banhadas pelos mares Cáspio e Negro.