1. A chef Noélia Jerónimo

“Tragam o pão” vai ficar como a grande frase desta temporada do Masterchef, exclamada algumas vezes pela chef Noélia Jerónimo a partir da mesa dos jurados. Na sua quinta edição em Portugal, o Masterchef já é um formato televisivo bem conhecido, para concorrentes e apresentadores, pela seriedade que tenta projetar. A chef algarvia não se deixou intimidar, todavia, e destacou-se pela espontaneidade das suas reações aos pratos dos concorrentes, não fazendo segredo de quando gostava muito, mesmo quando isso significava interromper os seus colegas apresentadores (dá para imaginar as dores de cabeça que causou aos assistentes de continuidade). Eis alguém que parecia provar cada prato também com o coração.

A grande mais-valia que trouxe ao programa, todavia, foi a sua empatia, especialmente crucial no momento de dizer adeus a concorrentes. Soube sempre oferecer a sua afetividade sem escorregar no maternalismo. Essa proximidade, aliada à sobriedade de Ricardo Costa e à exigência de Pedro Pena Bastos, fizeram a diferença nesta edição. Foi um trio bem escolhido para conduzir o programa.

2. O altruísmo da Sahima

A concorrente de 32 anos teria passado despercebida nos primeiros episódios se não tivesse sido o altruísmo com que se ofereceu para potencialmente renunciar ao seu “pin dourado” e assim dispensar outro membro da sua equipa da prova de eliminação dessa semana. A sua oferta acabou por não ser aceite, mas o chef Pedro Pena Bastos não deixou passar o gesto em branco, sublinhando a generosidade da concorrente. O “pin dourado” acabaria por reluzir ao seu peito ao longo de praticamente toda a duração do programa. Nunca chegou a socorrer-se da imunidade, confiando sempre nas combinações de sabores que apresentava aos jurados. Uma prova do seu talento culinário, é certo, mas também da sua extraordinária serenidade sob pressão.

É desde cedo a mais forte candidata ao título de Masterchef 2022, mas um profiterole (bom, uma montanha deles, na realidade) quase resultou na sua eliminação no episódio da semana passada, num momento que, presumivelmente, deve ter deixado a produção do programa em suspenso. A escorregadela ainda assim não deixou de fornecer o mais esperado duelo da temporada, entre o perfeccionismo de inspiração indiana de Sahima e o caos inventivo do Alexandre, outro dos concorrentes mais fortes desta temporada. Era difícil imaginar duas pessoas mais diferentes e, apesar disso, capazes de empatarem num frente-a-frente. No final, ganhou a atenção ao detalhe e a aderência à ficha técnica. A Sahima é a clara favorita para vencer a final deste sábado, embora nada esteja garantido, como se viu no último episódio. Seja como for, assistir ao seu crescimento no programa, e à forma como ganhou confiança nas suas capacidades, foi uma das histórias mais dignas de nota deste Masterchef.

3. A beleza (e frontalidade) do Funchal

Já é hábito do programa organizar provas de equipa fora do estúdio, e esta temporada não foi exceção. Vila Nova de Gaia, Sintra e Sesimbra foram algumas das cidades que serviram de cenário para a cozinha do Masterchef 2022. O destino mais marcante desta edição, porém, foi a Madeira. As ruas floridas da cidade do Funchal proporcionaram um cenário idílico para a competição, ainda que esta não tenha conseguido impressionar as altas individualidades e figuras da gastronomia regional convidadas para estarem presentes e provarem os pratos dos concorrentes. O resultado não foi brilhante para nenhuma das equipas e, como é apanágio do Masterchef, não se tentou suavizar ou adocicar o feedback recebido. Esse é, aliás, um dos motivos pelos quais o formato televisivo parece merecer algum respeito no seu meio, como o sugerem a presença de chefs convidados de renome (a começar pelo próprio trio de chefs-apresentadores). Apesar dos concorrentes não terem convencido a Madeira, o público já ficou a ganhar, nem que seja pela descoberta (para alguns) da fruta deliciosa, que combina os sabores da banana e do ananás no mesmo fruto, e foi o elemento obrigatório de uma das sobremesas preparadas para a prova.

4. O teste de Sísifo do Bruno

Uma eliminatória é sempre um teste à resiliência dos concorrentes do Masterchef, mas houve uma, em particular, que se revelou angustiante de seguir até ao fim. Foi o caso da “prova do arroz”, no episódio 9, na qual os concorrentes foram desafiados a mostrar o que sabiam fazer com três tipos diferentes de arroz. O senão? A luta pela permanência no programa teria de ser disputada em três rondas consecutivas com concorrentes diferentes, sendo que existia a possibilidade de um deles ter de cozinhar em todas elas, caso perdesse as duas anteriores. Foi o que aconteceu ao Bruno, que se viu obrigado a preparar três pratos diferentes com o arroz como elemento principal ao longo de, pelo menos, duas horas (supõe-se que gravadas no mesmo dia). Uma autêntica prova de Sísifo da atualidade que pode ter parecido, a quem via em casa, desnecessariamente extenuante e um raro passo em falso numa produção televisiva que também se destaca pela forma como cuida, dentro e fora do ecrã, dos seus participantes. Apesar de não conseguir arrancar um comentário positivo dos jurados, o Bruno não desmoralizou nem se rendeu ao cansaço e mostrou o que significa cair de pé.

5. A ousadia do Alexandre

Logo de início, foi difícil saber o que pensar do Alexandre: a sua auto-confiança seria apenas balofice ou sinal de um instinto, apurado pela experiência, para a gastronomia? Rapidamente se percebeu que seria mais a segunda hipótese, como ficou demonstrado nas sucessivas provas de eliminação que superou, e que não foram poucas: foi a jogo em 7 dos 11 programas, nos quais “eliminou” cinco concorrentes diretos (quando ficou entre os dois menos bem classificados).

Se os espetadores não sabiam bem o que pensar dele, não foram os únicos. O trio de apresentadores também parece ter sido apanhado de surpresa pela criatividade e irreverência do gestor de património, que algumas vezes raiou a insolência, tendo o painel optado por desarmadilhar algumas situações através do humor. Não foi sempre a melhor opção, sobretudo naqueles momentos em que o concorrente deixou a insegurança falar mais alto, quase sempre a lidar com os seus pares femininos. O que tinha em experiência e inventividade pareceu compensar, ao longo do seu percurso no programa, em falta de maturidade e espírito de equipa, como ficou, paradoxalmente, mais evidente nos momentos em que devia brilhar. A celebração de uma vitória para a qual foi decisivo acabou quase sempre marcada pela sua necessidade em deixar claro a quem pertenciam os louros.

A grande final

Por estes motivos, e mais alguns, esta temporada do programa de culinária vai deixar algumas saudades a quem seguiu, semana após semana, o percurso dos 15 concorrentes na “maior cozinha do país”. Numa altura em que a “caixinha mágica” parece cada vez menos mágica, o Masterchef, com as suas “caixas-mistério”, continua a destacar-se pela forma como combina talento e competição sem prescindir da empatia e exigência. Os quatro finalistas desta edição (Ana, Lionel, Rita e Sahima) disputam o título de Masterchef 2022 este sábado à noite, na RTP1.