O consumo de alimentos fermentados estimula a atividade anti-inflamatória e antioxidante do organismo, melhora a taxa glicémica no sangue e tem também um efeito benéfico sobre o peso.

Uma vez que o consumo regular de alimentos fermentados tem inúmeros benefícios no microbioma intestinal, é fácil entender todo o seu potencial benéfico na saúde em geral.

Existem vários exemplos de alimentos fermentados usados pelas mais diversas culturas, sempre com o intuito de melhorar a digestão e o aparelho digestivo.

A fermentação permite conservar os alimentos, favorecendo o desenvolvimento de bactérias boas e inibindo o crescimento de outras responsáveis pela putrefação.

Neste contexto intestinal não interessa alimentar rotas proteolíticas (Desenvolvidas por algumas bactérias intestinais que produzem protéases – enzimas - necessárias para a degradação das proteínas em aminoácidos); estas devem ser mantidas controladas e só assim é que aproveitamos os benefícios que também têm estas bactérias, como a produção de aminoácidos essenciais (que o nosso corpo não produz).

“Há alimentos que enchem os nossos supermercados que são verdadeiras balas para as bactérias que nos curam” - Alexandra Vasconcelos
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As proteínas são as responsáveis pelo aumento deste rendimento, o que desestabiliza o equilíbrio e a concentração das bactérias fermentativas produtoras de butirato e outros ácidos gordos de cadeia curta, tão necessários para todo este ambiente. As fibras são alimentos fundamentais para estas bactérias, pois só elas é que as conseguem digerir.

Talvez agora já entenda porque a dieta ocidental está associada a tantos malefícios para a saúde. Esta alimentação privilegia a flora proteolítica em detrimento da sacarolítica, uma vez que é rica em proteína e carnes e pobre em fibra.

Os legumes, tal como os nossos intestinos, contêm boas e más bactérias. Por isso é que os legumes quando ficam ao ar livre vão-se estragando e envelhecendo e tornam-se impróprios para comer.

Contrariamente, se sofrem processos de fermentação e os mantivermos hermeticamente fechados sem oxigénio e a uma temperatura compreendida entre os 18 ºC e os 23 ºC durante uns dias, as bactérias boas vão crescendo em detrimento das mais nefastas.

Assim, a fermentação permite que cresçam bactérias benéficas do tipo Lactobacillus que vão alimentar-se da rafinose (o açúcar dos legumes), libertando ácido láctico. Este é o responsável pelo sabor mais ácido destes alimentos, como o chucrute, o kimchi e outros fermentados de legumes. Mas é este ácido láctico que impede que as bactérias putrefactivas se multipliquem, permitindo assim que possamos comer estes legumes após várias semanas, sem que se estraguem e com a vantagem de manterem sempre a sua crocância e as suas propriedades nutritivas.

Tudo o que precisa de saber sobre alimentos fermentados, amigos inseparáveis de uma boa saúde
Abóbora fermentada com gengibre. créditos: Daniela Sousa/Planeta

Em todos os processos de fermentação há aproveitamento das moléculas de glicose (açúcar presente) em condições anaeróbicas (sem oxigénio), originando a produção de ácido láctico, álcool etílico ou ácido acético, dependendo do substrato e do processo fermentativo.

A fermentação láctica, ou lactofermentação, é a que liberta ácido láctico e que encontramos em produtos comuns como o chucrute, as azeitonas, os legumes, o miso, o kimchi, o kefir e os iogurtes.

Outros tipos de fermentação:

- Fermentação alcoólica: Esta fermentação faz-se usando bebidas alcoólicas como anis, vinho, uísque ou sidra. Na fermentação alcoólica, as bactérias e leveduras alimentam-se da glicose e transformam-na em álcool etílico, gás carbónico e ATP.

- Fermentação acética: É realizada por bactérias quando não há oxigénio, tal como as outras fermentações. Mas neste processo é libertado gás carbónico e obtém-se vinagre (ácido acético) e dióxido de carbono.

De um modo geral, podemos dizer que estes processos de fermentação possuem um saldo de duas moléculas de ATP por molécula de glicose utilizada no processo. Repare que a fermentação láctica não liberta CO2, ao contrário das fermentações alcoólicas e acéticas.

Sabia que…

A fermentação láctica, com produção de ácido láctico, ocorre também nos nossos músculos quando praticamos exercício físico. Quando as células musculares não recebem oxigénio em quantidades necessárias, o que ocorre durante o exercício físico intenso, a oxidação da glicose necessária para realizar a respiração celular é feita de forma anaeróbica, dando lugar à produção de ácido láctico. A acumulação desse ácido faz com que as pessoas sintam dor nos músculos após o exercício físico.

Os fermentados têm muitos benefícios, tais como:

- Maior concentração de vitaminas, como as vitaminas C, B e outras;

- São facilitadores da absorção de nutrientes porque melhoram a sua biodisponibilidade;

- Melhoram e apuram o sabor dos legumes, assim como, quando misturados com outros alimentos, também os tornam mais apetitosos.

Como fermentar legumes? (regras básicas)

- Primeiramente, lavar bem os vegetais, retirando os pedaços que tiverem algum tipo de defeito;

- Pode cortar os alimentos em pedaços grandes ou pequenos ou ainda utilizá-los inteiros;

- A fermentação ocorre quando massaja os alimentos em água e sal, processo conhecido por salmoura. Nestas circunstâncias, as bactérias presentes (fermentos lácticos) alimentam-se do açúcar dos legumes e libertam ácido láctico;

- Pode prolongar o período de fermentação. Na verdade, quanto maior o tempo de fermentação, mais intenso é o sabor.

Do que necessita?

- Vegetais à sua escolha cortados em pequenos troços;

- Salmoura: utilize uma solução com três colheres de sopa de sal marinho (não refinado) por litro de água;

- Temperos a gosto: pimenta, cominhos, coentros, mostarda, anis-estrelado, grãos de coentros e raminhos de ervas frescas, malagueta, entre outras opções que desejar;

‒ Frascos de vidro com fecho hermético e previamente esterilizados.

A importância da temperatura

Para que se inicie o processo de fermentação, os alimentos devem estar hermeticamente fechados em frascos previamente esterilizados e à temperatura ambiente durante alguns dias. Para esterilizar coloque-os numa panela de água a ferver, completamente submersos, durante 10 a 15 minutos ou leve os frascos ao forno durante 10 minutos a 180 ºC.

Se a temperatura for muito alta, o processo de fermentação é mais rápido, o que contribui para obter produtos mais ácidos e mais espessos.

Pelo contrário, se a fermentação se processar a uma temperatura entre os 18 ºC e os 20 ºC, demora mais tempo, mas é a situação ideal.

As temperaturas baixas, como a do frigorífico, não são indicadas para a fermentação. Assim, deve deixar os produtos fermentados fora do frigorífico, colocando-os no frio somente após toda a sua fermentação.

O que podemos fermentar?

Pode fermentar praticamente todos os legumes e muitos frutos. Utilize os vegetais que mais gostar e combine-os de acordo com as suas preferências.

As crucíferas ou brássicas, como repolho, couve-chinesa, couve-roxa e couve-frisada, são os legumes que resultam particularmente bem quando os fermentamos. No entanto, pode fermentar também beterraba, abóbora, cenoura, pimentos, pepinos, couve-flor.

Legumes mais macios, como o tomate, ficam moles quando fermentados, mas o sabor fica excelente. Pessoalmente, acho que não resulta fermentar batatas e nabos.

Apesar de todos os legumes poderem ser fermentáveis, alguns atingem melhor este processo, para além de o resultado ser mais saboroso e, por isso, mais fácil de introduzir na alimentação.

Tudo o que precisa de saber sobre alimentos fermentados, amigos inseparáveis de uma boa saúde
Salada Americana fermentada. créditos: Daniela Sousa/Planeta

Legumes cuja fermentação resulta melhor:

Couve-roxa, Repolho, Couve-chinesa, Couve-frisada, Cenoura, Beterraba, Aipo, Abóbora, Couve-flor, Ruibarbo

Fermentação de frutos:

Ananás, Pêssego, Bagas, Uvas, Frutos vermelhos, Melão, Cerejas, Ameixas, Azeitonas.

Ideias para incluir os fermentados na alimentação

Todos estes fermentados podem e devem ser incluídos nas refeições. Uma ou duas colheres de chucrute ou de kimchi para acompanhar carne, peixe, legumes cozidos ou saladas com legumes crus, para além do efeito na digestão e na microbiota, tornam os pratos mais saborosos e aumentam a diversidade de sabores.

Produtos fermentados na forma líquida (como kefir ou kombucha) podem ser adicionados à água ou aos batidos, melhorando assim os seus efeitos a nível da microbiota intestinal.

Outros alimentos ricos em probióticos:

Iogurte sem açúcar, Iogurte de soja, Kefir, Chocolate preto, Alcachofras.

Alimentos especialmente ricos em prebióticos (fibras nutricionais que permitem nutrir as bactérias intestinais benéficas):

Alcachofras, Leguminosas, Cebola, Alho, Alho-francês, Espargos, Arroz integral.

Alimentos com efeito de limpeza e com efeito antibiótico:

Alho, Orégãos, Cravinho, Gengibre, Tomilho, Sálvia, Cebola, Toranja.

Estes alimentos ricos em fibra e os fermentados são adequados para todas as pessoas, uma vez que servem de substrato para as bactérias produtoras de ácidos gordos de cadeia curta, aos quais se associa inúmeros benefícios, para além de nos manterem saciados.

No entanto, pessoas com alguma doença intestinal, SIBO, inchaços, gases, devem evitar este tipo de alimentos durante quatro a oito semanas, de forma a poderem corrigir os desequilíbrios intestinais, e depois irem introduzindo-os aos poucos. Apesar de os alimentos ricos em fodmaps poderem aumentar os processos fermentativos e provocar desconfortos abdominais, não os devemos evitar por muito tempo.

A adaptação por vezes pode demorar semanas ou até meses.

É importante que, quando se chegue à quantidade de fibra certa, se mantenha essa ingestão diariamente, a fim de não haver grandes oscilações na composição da flora e para que consigamos aguentar essa tão importante quantidade de fibra. Significa que conseguimos substituir as nossas bactérias intestinais pelas que estão associadas à saúde a longo prazo.

Este artigo é um excerto do livro As Bactérias que Nos Curam, edição Planeta. Páginas 180 a 186.