Em exagero ou realizados com produtos inadequados, alguns hábitos saudáveis podem tornar-se contraproducentes, porque as bactérias… fazem parte de nós!

Apesar da carga negativa que têm, são essenciais à nossa saúde. Equilibram a presença de outros microrganismos, como fungos, parasitas e vírus que, com elas, formam a flora comensal do corpo humano.

«São necessárias para se manter um meio estável para a função do órgão», explica Jorge Atouguia, médico infeciologista, e encontram-se na pele, nas cavidades e nos órgãos que têm comunicação para o exterior. «As bactérias», explica este especialista, «dividem-se em patogénicas e não patogénicas». As primeiras provocam doenças, como é o caso das que se formam na cavidade oral, como consequência de uma higiene deficiente.

As outras, protegem-nos contra agressões externas e, por isso, não devem ser eliminadas. Alguns hábitos de higiene acabam, contudo, por «fragilizar as nossas defesas e estimular o crescimento de elementos patogénicos», aumentando o risco de infeção, afirma David Serra, dermatologista.

Pele

«A higiene excessiva é um problema emergente e um importante fator de risco para a secura cutânea, dermatite e eczema», alerta David Serra, dermatologista. «Um banho diário é, geralmente, adequado à maioria das pessoas». Mais do que isso, explica o dermatologista, só se justificará em determinados grupos, «sobretudo jovens, atletas ou pessoas com vários empregos».

De acordo com o especialista, «embora essenciais, os banhos não deixam de representar uma potencial agressão para o estado da pele. Quando são demasiado frequentes, os danos são visíveis, sendo a secura a primeira manifestação». Mais do que um efeito estético da pele, o que está em causa é o seu equilíbrio e saúde.

Podemos estar a causar danos à flora normal que tem como missão «dificultar a colonização por microrganismos patogénicos causadores de infeções». Este sistema de defesa, que dificulta o crescimento de bactérias nefastas, é executado «através da produção de moléculas com propriedades antimicrobianas e da manutenção de um pH ácido à superfície da pele», sublinha o médico.

O especialista recomenda:

- Prefira produtos de banho com fórmulas suaves, como os syndets (sem detergentes), indicados, sobretudo, para peles atópicas, mas também para peles normais, em caso de banhos frequentes. Alguns produtos contêm agentes hidratantes que ajudam a reconstituir o filme hidrolipídico da pele.

- Evite fórmulas de composição complexa, com fragrâncias, corantes e outros aditivos.

- O sabão azul e branco, vocacionado para a lavagem de têxteis, não deve ser utilizado na higiene corporal, uma vez que seca a pele.

As diferenças entre os antisséticos e os antibacterianos

Jorge Atouguia, infecciologista, explica para que servem e como devem ser usados:

- Antisséticos

São utilizados para inibir microrganismos passíveis de provocar infeções na superfície da pele e nas mucosas, nomeadamente bactérias, vírus, fungos ou parasitas. Encontram-se nos produtos de limpeza e desinfeção de feridas (como o álcool etílico, a água oxigenada, o mercurocromo), em elixíres bucais e desifetantes de aparelhos médicos e alimentos.

- Antibacterianos

São uma classe de antissético e representam o grupo de fármacos capazes de eliminar apenas bactérias. Destacam-se o álcool, a água oxigenada e os derivados de mercúrio. Os antibióticos também fazem parte desta classe.

Boca

«Dependendo do seu esta do de saúde oral, a periodicidade e os produtos que utiliza, devem variar», aconselha Miguel Stanley, dentista. Poucos minutos depois da escovagem, começa a formar-se placa bacteriana que, com o passar das horas, se transforma numa camada fina que adere aos dentes. Se não for removida regularmente pode provocar mau hálito, agravar cáries e conduzir a infeções.

Regra geral, «dois minutos de escovagem são suficientes para higienizar uma boca saudável», sendo que «pessoas com tratamentos, como pontes, implantes dentários ou doença periodontal devem aumentar esse tempo». Além disso, também a escolha dos instrumentos deve ser feita à medida.

«Escovas com cerdas duras podem exacerbar problemas de retração gengival em pessoas com gengivas finas», situação que tende a agravar-se com a «escovagem excessiva, o uso de pastas dentífricas abrasivas, ou o uso de palitos, a aplicação de pressão na passagem do fio dentário e o uso de elixíres bucais à base de álcool ou gluconato de clorexidina», alerta.

Os elixíres eliminam grande parte das bactérias presentes na boca e são fundamentais para uma boa higiene oral. Miguel Stanley adverte, no entanto, que algumas fórmulas contêm gluconato de clorexidina.

E, se usadas em excesso, podem provocar «manchas na superfície dentária, dor, stresse, ansiedade, osteonecrose da mandíbula, ferimentos, anemia, lesões cáusticas em pacientes pós-operatórios, pressão arterial elevada e asma». Aconselhe-se com o seu dentista sobre a periodicidade de utilização mais adequada ao seu caso.

Vagina

«A flora vaginal é resultado de um equilíbrio instável de vários microrganismos que coa bitam na perfeição. Os duches vaginais», diz Fátima Romão, ginecologista, «eliminam indiscriminadamente esses organismos, aumentando o risco de infeção urinária». Por ser extremamente sensível, a mucosa vaginal deve ser mantida ao natural sempre que possível.

«Sujeitá-la a constantes lavagens, destrói os seus mecanismos de defesa e, por consequência, afeta o seu funcionamento», diz a ginecologista. «Duas vezes por dia, de manhã é à noite, são suficientes para garantir uma correta higienização vaginal», explica Fátima Romão.

A lavagem com produtos ginecológicos e água após as relações sexuais não é obrigatória. «O próprio esperma tem uma ação protetora e uma composição fisiológica adaptada à vagina», descreve a médica.

A especialista recomenda:

- Dado tratar-se de uma mucosa sensível, prefira produtos com pH neutro ou ácido (soluções específicas ou sabonetes comuns).

- Evite fórmulas com cheiro, consideradas agressivas para a flora vaginal.

- Depois de evacuar, limpe-se da frente para trás, de forma a evitar a contaminação da vagina com bactérias do intestino. Pode usar toalhitas neutras.

Alimentação

Lavar fruta e legumes com água é um ritual indispensável, mas existem produtos que prometem ir mais além. As soluções desinfetantes existem mas serão mesmo necessárias?

As suas fórmulas são compostas por cloreto de sódio e água, que combatem bactérias, fungos e vírus presentes nos alimentos. «A sua ação bactericida está comprovada. Podemos obter um efeito similar se usarmos uma solução de hipoclorito de sódio (lixívia normal), uma colher de sopa em um litro de água», explica Miguel Rego, nutricionista.

Esta é uma alternativa rápida quando «suspeitamos da necessidade de fazer uma desinfeção de produtos hortícolas e saladas». A sua utilização pode ser útil no caso das grávidas, a quem se recomendam especiais cuidados ao nível da higienização de alimentos crus. Mergulham-se os alimentos durante 15 a 20 minutos na solução desinfetante e depois passam-se por água.

Texto: Nelma Viana com David Serra (dermatologista), Fátima Romão (ginecologista-obstetra), Jorge Atouguia (infecciologista), Jorge Caena (gastrenterologista), Miguel Rego (nutricionista) e Miguel Stanley (dentista)