No texto do pedido de fiscalização da conformidade dos diplomas com a Lei Fundamental, a que a agência Lusa teve acesso, os deputados argumentam também que estão em causa os princípios da igualdade, da proporcionalidade, ao livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade da pessoa humana e "uma violação do dever do Estado de proteger as crianças, com vista ao seu saudável e integral desenvolvimento".

Assinado por mais de um décimo dos deputados à Assembleia da República em efetividade de funções, como está estabelecido, o pedido será apresentado esta quarta-feiraem conferência de imprensa na Assembleia da República pelo deputado do PSD Fernando Negrão e pela deputada do CDS Vânia Dias da Silva.

No caso do acesso à procriação medicamente assistida por parte de todas as mulheres - independentemente de condição médica de infertilidade, do estado civil ou orientação sexual -, é questionada a conformidade à Constituição da República Portuguesa (CRP) de se estabelecer "como regra o anonimato dos dadores e como exceção a possibilidade de conhecimento da sua identidade".

Já na gestão de substituição, permitida em casos de infertilidade, os subscritores sublinham que se está "perante uma proibição absoluta do acesso à identidade de todas as mulheres que assumam o papel de ?gestantes de substituição', o que viola flagrantemente os direitos à identidade pessoal e identidade genética, previstos nos n.ºs 1 e 3 do artigo 26.º da CRP, e se revela uma solução profundamente desproporcional e desadequada, o que afronta o artigo 18.º, n.º 2, da CRP".

No texto de 25 páginas, em que fundamentam os motivos que os levam a recorrer ao Tribunal Constitucional, os parlamentares sociais-democratas e centristas apontam que "o movimento científico e doutrinário, nacional e internacional, mostra-se cada vez mais consciente da importância e reforço do direito a conhecer a identidade genética, enquanto parte do direito à identidade" e que nesse sentido foram as recentes alterações à Lei da Adoção.

Com as últimas alterações a essa legislação, "passa a ser assegurado o acesso ao conhecimento das origens ao adotado com 16 anos ou mais de idade que manifeste essa vontade (com a autorização dos pais ou legal representante, enquanto for menor)", apontam.

Ainda sobre o direito ao conhecimento da identidade genética, os subscritores consideram que, "por essa via, é também violado o princípio da igualdade perante a lei, porquanto só uma parte da população portuguesa - a que não nasça por recurso a técnicas de PMA - tem direito ao conhecimento da sua identidade genética, dele ficando excluídos os que assim nasçam".

Relativamente à gestação de substituição, considera-se que há uma violação do primado da dignidade da pessoa humana e do dever do estado de proteção da infância e é defendido que se está perante "uma verdadeira mercantilização do ser humano: a criança passa a ser objeto de um negócio jurídico e a mãe gestante converte-se numa mera incubadora ao serviço dos beneficiários".

"Um processo de coisificação que, independentemente da natureza onerosa ou gratuita do mesmo, traz indubitavelmente à colação o princípio da dignidade da pessoa humana, seja no que refere à gestante de substituição, seja no que se refere à criança", argumentam.

Os signatários defendem que, mesmo estando apenas previsto de forma generosa, "as mulheres podem ser coagidas a aceitar, nomeadamente através de pressões emocionais, ou mesmo de ameaças ou promessas relativamente ao trabalho ou à família".