Em entrevista à agência Lusa, dias antes do 29.º aniversário da Convenção dos Direitos das Crianças, que se comemora a 20 de novembro, Rosário Farmhouse apontou que ainda há uma certa invisibilidade em relação a alguns direitos das crianças, nomeadamente o direito à participação, a ser ouvido naquilo que são as atividades ou as medidas que lhes dizem diretamente respeito.

“Quando os políticos definem políticas públicas que têm diretamente a ver com as crianças e jovens, [devia haver] a consulta às crianças e aos jovens sobre o que é que eles acham sobre isso”, defendeu.

Entende, por isso, que o caminho dos direitos tem de ser reforçado, com as políticas da infância e da juventude a precisarem de “empoderamento para chegarem cada vez mais longe”.

“Ao investirmos na infância e na juventude estamos a investir no futuro do país e acho que há ainda um caminho que pode ser feito, melhor, mais profundo e mais musculado”, salientou.

Defendeu, por isso, que o direito das crianças à participação seja mais estimulado, bem como o direito a brincar, apontando que, nos tempos atuais, este direito tem estado um “pouquinho invisível”, esquecido entre as muitas atividades que as crianças têm, sem conseguir acompanhar os ritmos das vivências atuais e dos desafios constantes que aparecem.

“Acho que deveríamos rever os tempos das crianças, até porque a infância é só uma e passa muito depressa e acredito que, com esta vontade de querermos que as crianças tenham todas as oportunidades e capacidades para um mundo competitivo que temos hoje, nos esquecemos de lhes dar o tempo para brincarem sem horário”, sublinhou.

Apontou que as crianças, desde que acordam até que se deitam, têm o tempo todo comprometido, seja na escola, com as aulas, seja com os trabalhos que trazem para fazer em casa, seja com as atividades extracurriculares, não tendo “tempo para ter tempo”.

Sublinhou que as famílias precisam de criar momentos de convívio físico e não virtual com as suas crianças, sem estarem agarrados a outras ferramentas e sem estarem muito controlados pelo tempo.

“Esta pressão para lhes dar todas as oportunidades está-nos a desfocar do que é fundamental, que é estar com os filhos sem horários”, frisou.

Apontou que as novas tecnologias e as novas formas de comunicar trazem grandes desafios para as famílias, mas também para as crianças, alertando para um certo “descontrolo” na proteção da privacidade e da intimidade dos mais novos.

Para Rosário Farmhouse, estes são novos desafios que se colocam, mas aproveitou para lembrar que se mantém os desafios antigos, destacando os maus tratos e apontando que se trata de um fenómeno “completamente transversal a todas as classes económicas e sociais”.

Algo que a faz considerar, tendo em conta os 29 anos de trabalho da comissão nacional, que houve uma grande evolução nas últimas décadas em matéria de direitos das crianças, sublinhando que há 30 anos comportamentos como os maus tratos físicos ou os castigos corporais eram completamente aceitáveis e possíveis não só no seio da família, mas também nas escolas.

“Acho que ainda temos um longo caminho, enquanto sociedade, para respeitarmos as crianças enquanto sujeitos com direitos”, frisou.

Este ano, a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens assinala o 29.º aniversário da Convenção dos Direitos das Crianças na Escola Secundária Rainha Santa Isabel, em Estremoz.