Esta investigação realizada num hospital universitário português, e a que a Lusa teve hoje acesso, reforça a ideia de que o consentimento informado para a doação de embriões para investigação científica só deve ser assinado no final dos tratamentos de fertilidade.
Este trabalho científico, publicado na revista Acta Obstetricia et Gynecologica Scandinavica, analisa a vontade de casais sujeitos a tratamentos de Procriação Medicamente Assistida de doarem embriões crio-preservados para investigação científica desde 15 dias após a transferência do embrião (momento em que já existe uma confirmação, ou não, da gravidez) até 12 meses depois, tendo em conta fatores psicossociais, demográficos e reprodutivos. Os participantes foram avaliados em dois momentos distintos.
A escolaridade, a prática religiosa e a importância dada à investigação influenciam a tomada de decisão para a doação de embriões crio-preservados por casais sujeitos a tratamentos de fertilidade.
Participaram neste estudo 72 casais heterossexuais sujeitos a tratamentos de Procriação Medicamente Assistida (fertilização in vitro ou microinjeção intracitoplasmática de espermatozoide) num hospital universitário português, entre 2011 e 2012.
Se, no início, uma grande parte (86,5%) dizia estar disposta a doar os embriões, no segundo momento verificou-se um decréscimo significativo dessa vontade (76,3%).
Susana Silva, uma das investigadoras responsáveis pelo trabalho, ressalvou que “Portugal apresenta, em termos europeus, uma das proporções mais elevadas de casais dispostos a doar embriões para investigação científica”.
Enquanto os participantes com menor escolaridade (≤12 anos de educação) não tiveram uma evolução significativa na vontade de doar ao longo do tempo, mais participantes educados (>12 anos de estudo) mostraram-se menos dispostos a doar embriões para pesquisas.
Sobre este aspeto, a investigadora Susana Silva disse que “um dos argumentos que as pessoas usam para doar prende-se com as expectativas sobre os benefícios”, além de que o facto de “em Portugal não estar a ser desenvolvido nenhum projeto com embriões humanos leva a que não vislumbrem uma concretização efetiva”.
A intenção da doação não se alterou naqueles com uma prática religiosa mais frequente (pelo menos uma vez por mês), ao contrário daqueles cuja prática religiosa acontece menos de uma vez por mês.
Também não houve variações nos casais que consideraram a pesquisa com embriões humanos “muito importante”. Aqueles para quem aquela é apenas “importante” registaram um decréscimo na sua intenção de doá-los para investigação.
“O facto de haver mudança ao longo do tempo realça a importância de ponderar sobre o momento adequado de aplicação do consentimento informado, apontando para que este deva ser assinado no final do tratamento”, reforçou Catarina Samorinha, a primeira autora do artigo.
Acrescentou que “conhecer as experiências e perspetivas dos pacientes quanto aos fatores humanos e do sistema de saúde que estão envolvidos no processo de decisão em relação à doação de embriões para investigação científica, é fundamental para melhorar a prestação de cuidados centrados no paciente no contexto da Procriação Medicamente Assistida”.
A investigadora Susana Silva considerou que estas conclusões levam “a pensar nas orientações do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida” para a assinatura do consentimento informado, que, como reforçam os dados resultantes desta investigação, “deverá ser feita no fim do tratamento, em consonância com as recomendações do Comité de Ética da Sociedade Americana para a Medicina Reprodutiva”.
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