Sendo filha única, nunca tive com quem dividir as atenções dos meus pais, pelo que este é um tema que não domino em “pele própria”. Mas lembro-me de os meus amigos de infância e de adolescência, quase todos com irmãos, se queixarem de ser os “patinhos feios” das suas casas. De, independentemente de serem os filhos mais velhos, novos ou do meio, sentirem que os seus pais preferiam sempre um dos irmãos. De se sentirem menos acarinhados, menos protegidos, menos desculpados, menos amados.

Nunca foi coisa que me preocupasse.

Até que fiquei grávida da minha segunda filha. Porque foi logo ali, naquele risquinho rosa que apareceu no teste de gravidez, que eu dei por mim a pensar se seria capaz de amar outra criança com a mesma intensidade com que amava aquela que já tinha nos braços. Parecia-me uma impossibilidade, para ser franca. Eu desejava tremendamente aquele novo bebé, mas parecia-me totalmente inviável conseguir voltar a amar tanto, tanto, tanto, como eu amava a minha filha mais velha.

A gravidez foi avançando, a minha alegria por voltar a ser mãe foi crescendo, mas a dúvida manteve-se até ao momento em que entrei na sala de partos. “E seu tiver um filho preferido?”. Bastou, no entanto, que aquela bebé gordinha e perfeita pousasse no meu peito para que eu soubesse que sim, que a amava com a mesma intensidade com que tinha amado a primeira quando ela nasceu.

Quando engravidei dos meus filhos gémeos, a questão não se colocou. Aí, eu já sabia que o coração de mãe tem a capacidade milagrosa de amar em igual escala todos os filhos, independentemente de serem dois, quatro ou dez. O amor é igual, tal como o são o carinho, a saudade, a preocupação, a vontade imensa de os ter sempre por perto.

Não significa isto que não tenhamos relações diferentes com os nossos filhos. Um filho é alguém com personalidade própria, com comportamentos, atitudes, pensamentos e convicções. E, logo, um filho é alguém que pode estar mais ou menos em sintonia com a nossa própria forma de ser. E parece-me que é precisamente aqui que reside a grande confusão que origina a tal história do “filho preferido”.

A minha filha mais velha, apesar de ter apenas (ou já…) 13 anos, sempre foi uma criança muito madura. Com pensamentos muito crescidos e elaborados. Muito diferente da sua irmã, que é infantil, sonhadora e ingénua. Quer isto dizer que me habituei, desde cedo, a conversar muito com a mais velha. A confidenciar-lhe situações da minha vida e a desabafar temas que, se eu contasse à minha outra filha, a fariam simplesmente sorrir e dizer-me algo como: “não tens dinheiro? Deixa lá isso, alguma fada há-de colocar uma nota debaixo da tua almofada”.

Tenho relações muito diferentes com os meus quatro filhos. Com a mais velha, converso muito sobre temas ditos sérios. Com a do meio, sou levada a abusar dos mimos e das brincadeiras ingénuas. Com os mais novos, divido-me entre conversas sobre as curiosidades do mundo e as orientações para que, nas suas aventuras pelo nosso bairro, não esfolem os joelhos. Isto fica mais claro se disser que todos os meses compro uma revista de informática para a mais velha, uma de “artistas pop” para a do meio e outra de carros para os mais novos. Basicamente, os meus filhos são todos tão diferentes quanto as revistas que leem.

Não faz isto com que eu “prefira” algum deles. Não gosto especialmente de gadgets informáticos, mas ouço atentamente os relatos da mais velha sobre as novas aplicações que ela vai descobrindo sei lá onde. Também não sou fanática por tendências de moda, mas fico a par de todas aquelas que a minha filha do meio me põe à frente dos olhos. E confesso que não acho a menor graça a bicicletas, mas ajudo os meus filhos a procurar vídeos de BMX e afins por esta internet fora. É um “esforço sem força”, como diria uma amiga minha, que nos aproxima nestas gigantescas diferenças.

Ter um filho preferido, para mim, não significa valorizar um deles – mas antes preterir os restantes. E, tirando algumas exceções que não consigo sequer calcular, vejo como impossível que uma mãe (ou um pai) consiga alguma vez fazer a mais difícil das escolhas: a do filho que mais ama.

Alda Benamor