Há coisas boas na vida, coisas que nos dão verdadeiro prazer de estarmos vivos para as podermos ver, testemunhar, sentir, ouvir, saborear. Muitas destas coisas que tornam a vida “worth living” são de comer, de comer e chorar por mais. Uma delas vem de Espanha e chama-se Jamón Ibérico de Bellota, também chamado de Pata Negra.

Quem disse que de Espanha não vem bom vento nem bom casamento devia ser vegetariano. Não é possível dizer isso depois de provar este produto maravilhoso. Os presuntos dos “nuestros hermanos” são tão bons, mas tão bons mesmo que são para mim dos alimentos mais extraordinários que o nosso planeta produz. Na verdade, acho que tal maravilha deve mesmo vem é do céu ou da finca que Dionísio tem no Olimpo, tal prazer (ou pecado) não pode ser terreno.

Claro que estou a falar desta forma superlativa dos melhores presuntos, de bellota, porque, como em tudo, há presuntos e presuntos. Este é feito com peças de porcos ibéricos, os famosos porcos pretos, criados ao ar livre e alimentados a bolota. O seu “irmão”, ao qual chamam de cebo (porcos alimentados a cereais e ração) é bom mas não chega aos calcanhares do de bellota. E depois há o primo afastado, o Jamón Serrano, uma espécie de ovelha negra da família, apesar de ser feito com porcos brancos. Ainda que tenha Jámon no nome, “c’est pas la même chose”…

Os melhores presuntos vêm de duas zonas, a Serra de Huelva (com epicentro em Jabugo) e a zona de Guijuelo, na província de Salamanca. As melhores marcas incluem o Jota Negra, El Armiño, 5J e Joselito, para além de pequenos produtores “boutique” que fazem também excelentes presuntos. A cura média anda entre os 30 e os 48 meses, parte da razão para o ser preço ser elevado. Outras razões incluem a necessidade de 2 hectares de montado por animal (para ter bolotas suficientes para a sua alimentação), o facto de os animais serem abatidos ao fim de 14 meses de vida (contra cerca de metade para o Jamón Serrano) e a menor produtividade (medida quer em relação carne/gordura quer em número de crias).

Muitos dos porcos utilizados na produção destes jamones são criados em Portugal e depois enviados para lá da fronteira para serem curados. São os nossos porcos de raça alentejana, que com muito orgulho os nossos vizinhos transformam em jóias da gastronomia. Assumo-me como defensor dos produtos nacionais em toda a linha mas tenho de confessar o meu gosto pende mais para o Jamón Ibérico que para o nosso presunto, apesar de termos bons produtores em Portugal, nomeadamente no Alentejo, onde o método de cura e salga é semelhante ao utilizado em Espanha.

Remato com uma imagem de fazer crescer água na boca: uma noite à lareira em boa companhia, com um bom vinho e um prato de presunto de bolota, cortado bem fininho, como se fosse pele, macio como o cetim, desfazendo-se na boca (e não nas mãos, como diz o famoso slogan) e deixando um gosto ligeiramente doce, com a dose exacta de gordura… mmmm, que maravilla!!!!