Os portugueses preferem países com praia mas também estão a fazer mais escapadas europeias e a arriscar cada vez mais destinos diferentes. Em entrevista ao Modern Life, Margarida Gameiro, porta-voz do motor de busca e agregador de preços global Momondo para o mercado português, revela outras tendências e novas realidades. "Ponta Delgada, nos Açores, veio destronar Barcelona, em Espanha", confidencia.

Estamos nos primeiros meses de 2019 numa altura em que muitos portugueses começam a planear as férias. Quais são as vossas previsões em relação à evolução do setor em Portugal e da procura turística dos portugueses para este ano? 

Os últimos anos foram de forte crescimento no setor do turismo em Portugal. Quanto aos próximos, tendo como base os dados do Banco de Portugal e o World Travel and Tourism Council, espera-se que esse ritmo se mantenha, com estimativas de crescimento entre os 3% e os 10%.

Em relação à procura turística dos portugueses, conseguimos chegar à conclusão, através do nosso estudo International Travel Survey, que revela os hábitos de viagem em 22 países, que o tipo de férias que os portugueses mais preferem são destinos de praia. No entanto, aquilo que os portugueses pesquisaram em Momondo.pt vai ao encontro daquele que tem sido o seu comportamento no último ano.

Procuraram, sobretudo, destinos de fim de semana europeus. Londres e Paris mantiveram-se no pódio das pesquisas para os city breaks, tal como em 2017. Ponta Delgada, nos Açores, veio destronar Barcelona, em Espanha, mostrando que os portugueses têm cada vez mais interesse em explorar destinos domésticos.

Aliás, se olharmos para os dados do Instituto Nacional de Estatística, vemos que houve [em 2018] um aumento de 3% nas viagens domésticas dos portugueses face a 2017, e que para essas viagens, a estadia em hotéis foi a primeira escolha, com [uma percentagem de] 20,4%.

O que marcou as pesquisas e as reservas de férias nos últimos meses do ano, outra das alturas em que os portugueses viajam muito? Denota-se alguma nova tendência ou não houve grande diferença em relação a nos anteriores? 

Os destinos em que observámos os maiores aumentos nas pesquisas de voos em 2018 estão mais dispersos pelo mundo, quando comparamos com as de 2017. No ano passado, os portugueses mostraram-se cada vez mais aventureiros, já que os destinos onde registámos uma maior pesquisa de voos face a 2017 foram para fora da Europa, sobretudo para São Tomé e Príncipe, para a Bolívia e para a Macedónia.

Já nos city breaks, como base os dados de pesquisas da Momondo, podemos afirmar que oito das dez cidades preferidas dos portugueses em 2018 situaram-se na Europa, com Paris a continuar a ser a grande vencedora.

É a porta-voz da Momondo para o mercado português. Como é que vê a evolução que o turismo português tem tido nos últimos anos? Passou de um país visto com alguma desconfiança em termos turísticos para o país onde, de repente, toda a gente quer vir...

À semelhança de todas as capitais europeias que têm passado por fenómenos turísticos, como Lisboa, as cidades ficam um pouco descaracterizadas, mas é um processo normal e acho que há uma curva de aprendizagem que as entidades têm que ter e é preciso dar tempo ao tempo. Enquanto porta-voz da Momondo, noto que, de facto, existe um interesse cada vez maior pelo destino e pelo mercado.

Continuam a preferir praia mas já arriscam outros destinos. «Os portugueses estão mais aventureiros»

Eu trabalho especificamente o mercado português mas noto que, por exemplo, com base em informações dos meus colegas que estão a trabalhar outros mercados na Europa, Portugal aparece constantemente no top dos países mais pesquisados nos outros domínios da Momondo e isto é super interessante de se ver.

É um fenómeno que, se calhar, é um bocadinho influenciado pelo trabalho de promoção turística que o próprio [organismo que promove o] turismo de Portugal e o próprio governo português têm vindo a fazer lá fora. Estamos a falar de grandes investimentos que têm dado frutos.

Isto chega muito facilmente a uma revista na Alemanha que, depois, vai influenciar a nomeação para um determinado prémio, que é, depois, amplamente conhecido e disseminado nos meios de comunicação social de todo o mundo. Depois, há ainda todo um trabalho a ser feito com influenciadores digitais e tudo isso tem, de facto, ajudado o turismo português a ser cada vez mais atrativo.

Estamos a começar a ter uma vertente de turistas vindos dos EUA e do Canadá, que não seriam os países emissores típicos que teríamos há 10 anos. Há todo um fenómeno que tem sido super interessante acompanhar e, do ponto de vista do impacto que tem nos sites da Momondo, vê-se que há um crescimento efetivo.

O facto de celebridades como a Madonna, a Monica Belluci e o Michael Fassbender terem vindo para cá e o Christian Louboutin falar muito da Comporta e de Melides também fez a diferença ou nem por isso?

Acho que é um conjunto de fatores que fazem a diferença. Cada fator há de ter um impacto diferente consoante o target. As celebridades que menciona apontam para um alvo com um poder de compra maior, enquanto que um influenciador digital e um instagrammer que viaje imenso e que faça disso vida vai ter um impacto num target mais jovem, mais independente. São impactos diferentes…

Faz alguma diferença, sim, mas mais do ponto de vista mediático, até. É publicidade grátis para o turismo em Portugal. Não é completamente gratuita, há sempre uma moeda de troca, mas tem um impacto. Obviamente que ajuda ter figuras desta dimensão a falar do destino Portugal lá fora. Faz com que, pelo menos, as pessoas se questionem sobre o que é que se passa em Portugal e se interroguem sobre o que é que tem para oferecer.

Há essa curiosidade e esse estímulo. Obviamente que o impacto mediático que isto tem acaba por ser muito superior àquele que temos no curto prazo. Com este tipo de celebridades a promover o nosso destino e as nossas gentes, esse impacto vai sentir-se mais a médio e a longo prazo.

Não tarda muito, estamos a viver o verão de 2019. Que balanço é que faz do verão de 2018?

São sempre alturas muito boas, principalmente os meses de julho e agosto. Se tivermos em consideração que, durante os meses de verão, os nossos principais países emissores são a Alemanha e a Dinamarca… Curiosamente, a Roménia tem vindo a crescer! Exponencialmente, de mês para mês, em termos de procura de voos para Portugal, verificamos que o pico das férias deles é, precisamente, no mês de julho.

Se formos para Itália e Espanha, já é agosto. Já é muito parecido com o nosso… Mas esses continuam a ser, de facto, os grandes países emissores e isso vai ao encontro daquilo que são os últimos dados estatísticos do Instituto Nacional de Estatística (INE). Essas pessoas continuam a escolher Lisboa e Porto como destinos de eleição e, curiosamente, Faro, que começa a surgir já na segunda posição nos meses de verão, o que é normal, principalmente quando falamos de países emissores do centro e do norte da Europa.

Os nórdicos, quando vêm para Portugal, vêm à procura de praia e, quando falamos de praia, o primeiro destino que nos vem à cabeça é o Algarve. No que toca a estadias, a tendência é a mesma. Lisboa e o Porto o topo das preferências e, depois, tudo o que sejam cidades no Algarve. Monte Gordo, Albufeira, Portimão… As pessoas que vêm destes mercados emissores continuam a apostar muito no Algarve.

Já se começa a assistir também a alguma procura pela Costa Vicentina, embora ainda muito residual. E, depois, as ilhas... Ponta Delgada, nos Açores, sem dúvida alguma, continua a ser um dos destinos preferidos, tal como o Funchal. Os turistas conhecem estas cidades e as aldeias circundantes e, depois, começam a ter curiosidade para conhecer as outras ilhas, principalmente no arquipélago dos Açores.

Continuam a preferir praia mas já arriscam outros destinos. «Os portugueses estão mais aventureiros»

Esse arquipélago tem uma vantagem porque tem uma variedade enorme de destinos. Mas tem crescido sempre… Já não é tão exponencial como era, começa a estagnar um bocadinho mais, mas continua a haver muita procura por Portugal. Mesmo os portugueses que têm saído são mais comedidos.

O português gosta muito de ir para cidades europeias próximas porque é muito sensível ao preço e, de facto, quanto mais sensíveis as pessoas são ao preço, menor é a distância da viagem. Esta é a regra há uma série de anos. Para além das grandes capitais europeias, com Paris no topo, volto a frisar, aparece Barcelona, em Espanha, que continua a ser um destino de eleição dos portugueses.

Para além das capitais europeias e de Barcelona, existe algum destino que se destaque?

Nova Iorque continua a ser o destino preferido dos portugueses em viagens intercontinentais. E aparece sempre no top 10 dos destinos mais procurados! No verão passado, tivemos destinos com praia em Cabo Verde e Banguecoque, na Tailândia, especialmente nos meses de agosto…

Isso tem muito a ver com a tendência crescente dos portugueses quererem ir para o sudeste asiático. Aí, Banguecoque, na Tailândia, aparece no topo das preferências. As autoridades tailandesas têm feito também um trabalho fenomenal em termos da promoção do destino. Este é o grande bolo, por assim dizer…

E o Brasil e as Caraíbas, que tinham tanta procura há uns anos?

Agora não, é curioso… Os viajantes portugueses estão mais exigentes. Fogem cada vez mais áquilo que eram os grandes destinos de há 10 anos. Hoje, querem coisas novas e diferentes. Procuram muito a inspiração nos amigos e na família. Se tiver um amigo que tenha visitado Singapura, essa pessoa mais facilmente vai também conhecer o país.

Antigamente, havia uma grande influência das agências de viagens, que disponibilizavam pacotes para aí, daí esses destinos terem siso uma grande tendência no início do novo século. Mas isso já não se vê… Quando se vê, especialmente nas Canárias, são estadias mais curtas, já não é a estadia que era antigamente de uma semana ou duas. Nota-se alguma diferença a esse nível...

E para aqueles destinos que chegaram a ter alguma procura acima da média, como foi o caso de Tunísia, Marrocos ou Egito. Depois da fase em que perderam turistas, têm vindo a recuperá-los. Os portugueses fazem parte desses turistas que estão a voltar?

Não. Sente-se mais isso noutros mercados... O mercado francês consumia muito estes destinos e, lá, voltaram a ter alguma procura, principalmente o destino Tunísia. Mesmo o viajante espanhol, já começa a procurar mais a Tunísia.

Continuam a preferir praia mas já arriscam outros destinos. «Os portugueses estão mais aventureiros»

Para o português, Marrocos é um destino all year, um daqueles destinos para onde se viaja o ano inteiro e nós temos voos diretos para lá com muita frequência. Não são destinos de eleição para os portugueses como são para os franceses e os espanhóis, por exemplo, mas já se nota alguma recuperação…

No início da temporada passada, surgiram em Portugal muitos pacotes com preços muito irresistíveis para a Turquia que, segundo vários operadores turísticos, conseguiram roubar turistas a Ibiza. Foi uma situação pontual ou também atingiu outros mercados?

Temos que ter em consideração que as agências de viagens trabalham com pacotes. Na Momondo, não temos pacotes, até porque o que nós promovemos é a autonomia e a independência de comparação de preços para o utilizador.

De acordo com os dados que temos disponíveis, não sentimos que esse destino tenha tido um grande crescimento, pelo menos no período do verão. Em comparação com o ano anterior, na Tunísia, houve, de facto, um crescimento. Na Turquia, não o sentimos...

Também com base nos dados que tem, o que é que as pessoas têm mais em conta? O destino, a experiência ou um pouco dos dois? Em termos de requisitos, qual é o fator principal e como é que se encaixam aqui os outros?

O português, para além de ser sensível ao preço, adora destinos de sol e praia mas estes têm a desvantagem de serem caros, o que é um pouco contraditório. Acabam, portanto, por preferir city breaks, fins de semana um pouco mais prolongados. Gostam muito de ficar em hotéis, que continuam a ser o seu tipo de alojamento preferido, com as comodidades que têm que ter, principalmente Wi-Fi, que é condição sine qua non.

Continuam a preferir praia mas já arriscam outros destinos. «Os portugueses estão mais aventureiros»

É um viajante que já procura muita informação online. Recorre a blogues, a meios de comunicação digitais, a influenciadores digitais e, a esse nível, o papel do telemóvel tem vindo a crescer. É uma fonte de pesquisa muito utilizada. O português tem vindo a mudar e é muito exigente. É cada vez mais exigente! Já é um viajante com itens nas suas listas com necessidades às quais temos de ir ao encontro.

Os preços têm que ser dentro daquilo que acham que é razoável. O português gosta de visitar coisas novas e nós, no blogue da Momondo, tentamos dar ao máximo a inspiração que as pessoas procuram. Quando trabalhamos os conteúdos para o nosso blogue, já estamos a pensar no que é que lhes podemos dar de informação nova.

Quando percebemos que, a determinada altura, aumentam as pesquisas do público português por um determinado destino, lançamos um conteúdo a dar a conhecer esse destino e esta estratégia tem resultado muito bem.

Nota-se que, hoje em dia, com a recuperação da crise, o português viaja mais. Normalmente, as camadas mais jovens querem viajar mais, querem conhecer, querem abrir portas, querem desconstruir barreiras, querem conhecer novas culturas… Isto faz parte de um enriquecimento pessoal, o de desconstruir estereótipos. As viagens, nos dias de hoje, servem muito para isso.

O português sempre viajou muito. Além de descobridores aventureiros, tivemos também muitas gerações de emigrantes que partiam em busca de uma vida melhor…

É verdade. O viajante português viaja cada vez viaja mais. Nós temos uma cultura de muita emigração. Na Momondo, nós temos até uma ferramenta, que é o Connect Us, que nos permite, se tivermos um amigo ou um familiar lá fora, marcarmos uma viagem para nos encontrarmos a meio e conhecermos ambos um destino novo. É de fácil utilização e permite-nos matar saudades dessas pessoas. Esta ferramenta é o casamento perfeito para o mercado português.