Peste, saborosa peça de caça ou espécie chave no ecossistema natural? O coelho-bravo é tudo isto e muito mais! Com presença em todo o país, e localmente abundante em determinados ambientes, sobretudo no centro e no sul de Portugal, junto a manchas de vegetação natural de cariz mediterrânico, este mamífero de quatro patas é uma das espécies mais importantes da nossa fauna. E uma potencial praga no seu jardim!

Todos reconhecem o coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus) como umas das espécies cinegéticas portuguesas de maior importância e fama, mas o que poucos sabem é que esta espécie é originária e nativa precisamente da Península Ibérica e foi daqui levada e introduzida depois para todo o mundo. Os coelhos-bravos portugueses e espanhóis são, de facto, os originais e naturais.

Foram os seus antepassados que, depois, foram libertados por essa Europa fora. Muitas introduções foram feitas pelos romanos. Alguns chegaram além-mar. Algumas destas introduções tiveram depois consequências desastrosas, como na Austrália e na Nova Zelândia. Ironicamente, enquanto em todo o mundo o coelho prolifera, na Península Ibérica natal as suas populações são hoje menores do que no passado.

A enorme regressão na biodiversidade que se registou

A situação que causou uma enorme regressão na biodiversidade. No ecossistema ibérico, os coelhos são uma peça importantíssima, uma vez que constituem a principal presa de algumas espécies predadoras, algumas das quais muito raras e ameaçadas, como o lince-ibérico, que chegou a desaparecer de Portugal e foi entretanto alvo de um projeto de reintrodução no nosso país.

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Outro é a águia-imperial-ibérica. Ainda há uns anos, existiam 175 casais na Península Ibrérica, dos quais apenas 25 em Portugal. Famosos pela profligacia reprodutora, os coelhos têm uma gestação curta (30 dias) e podem ter várias ninhadas por ano, de entre dois a oito coelhos de cada vez. Tendem, contudo, a ser muito afetados por diversas doenças, como é o caso da mixomatose e da febre hemorrágica, entre outras.

As populações de coelhos numa determinada área sofrem flutuações acentuadas, para o qual contribuem também os predadores e a disponibilidade de alimentos. Se em certos anos são escassos, noutros podem tornar-se superabundantes. Nalgumas regiões do país, nos meses da primavera e do verão, com a chegada do calor, é normal estes mamíferos invadirem os jardins e as hortas.

O coelho no jardim

Em determinados locais, nomeadamente no Alentejo, na península de Setúbal, no barrocal algarvio, nas serras do centro de Portugal e na região oeste do país, os coelhos são também uma enorme dor de cabeça para os jardineiros e para os agricultores amadores, sobretudo se cultivarem uma horta no seu jardim ou se a sua propriedade estiver perto de manchas de vegetação natural, como matagais, pastos e vegetação serrana.

Uma situação que é muito frequente por todo o país, como muitos certamente saberão, dadas as características retalhadas e dispersas da ocupação do solo. Já ouvi muitas queixas de amigos e de conhecidos sobre os coelhos, que, nessas alturas, quando aparecem, parecem, em muitos casos, determinados em comer tudo o que se tenta colocar no jardim ou cultivar na horta.

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Plano de ação anti-roedores

Há vários métodos para tentar prevenir as investidas,ou pelo menos controlar os estragos, que estes roedores fazem, mas não há um solução inteiramente absoluta e eficaz. As várias formas de intervenção passam sempre geralmente por uma mistura de métodos, adaptados caso a caso para os contextos e situações locais. Em geral, é muito mais eficaz atuar no início, sempre que se detete coelhos pela primeira vez.

Outra das melhores alturas é quando o jardim está a ser construído. Tanto num caso como noutro, é melhor agir previamente do que remediar mais tarde. É que se os coelhos estão habituados a alimentar-se numa área, será mais difícil ver-mo-nos livres deles. Eis, então, algumas possíveis soluções, algumas delas surpreendentes:

1. Coloque uma vedação à volta do jardim

Uma simples rede de galinheiro é eficaz, mas esta necessita de ter, pelo menos, 60 centímetros de altura e estar enterrada cerca de 10 a 15 centímetros, porque senão estes roedores entram por cima ou por baixo. Dependendo do local e contexto, por vezes pode ser mais barato e prático proteger canteiros ou arbustos e árvores individuais do que todo o jardim.

Pode, então, colocar cilindros de rede ou plástico à volta destes. Proteja sobretudo as plantas mais novas. Os coelhos gostam de
folhas tenras e rebentos.

2. Ponha a sua mascote a vigiar

Deixe o seu cão ou mesmo o seu gato, se for grande, correr atrás dos coelhos, sobretudo à noite. Se forem perseguidos várias vezes, os coelhos deixam de entrar tanto no seu jardim.

3. Invista nas plantas certas

Os coelhos não gostam de algumas plantas. Por isso, plante estrategicamente algumas dessas espécies no seu jardim. Estes roedores evitam, por exemplo, as cebolas, de forma que pode plantar um canteiro destas junto à entrada preferencial destes roedores no seu jardim. Os coelhos-bravos gostam especialmente de ervilhas, feijões e alfaces, mas não são tão atraídos pelo milho, pepinos, tomates, pimentos e batatas.

Sendo assim, cultive as plantas mais sensíveis entre tomateiros. No caso das flores, os coelhos não mostram grande interesse por gerânios, margaridas, crisântemos ou cyclamens, nem por plantas aromáticas como o orégão, tomilho e rosmaninho. E use o trevo, planta favorita para estes roedores, para afastá-los de outros cantos do jardim.

4. Espalhe cabelo humano junto à sua vedação

Os coelhos não gostam do odor humano e geralmente evitam a área. O mesmo se passa com os excrementos de gato. Se tiver um caixote para gatos em casa, espalhe a serrilha ou areia usada junto à vedação do seu jardim.

5. Compre repelentes químicos não tóxicos

No estrangeiro, há vários fornecedores que vendem produtos como sangue ultracongelado (para treinar cães de caça), extrato de urina de raposa (para atrair estes animais), que têm excelente resultado como repelentes de coelhos e outras pestes.

6. Recorra ao sistema de rega

Se o seu jardim tiver um sistema de rega remoto, considere ativar alguns dos sprinklers com um detetor de movimento. Os coelhos não gostam de água e evitariam entrar num jardim se estivessem a apanhar com um chuveiro de cada vez que caiam à
tentação.

7. Pegue na espingarda

Pode também, obviamente, caçá-los, mas esta opção não é de facto praticável na maior parte dos jardins, porque segundo a legislação de caça não é possível caçar a menos de 250 metros de uma habitação. Nem é possível capturá-los com armadilhas, ilegais à luz da nossa legislação de caça.

8. Não os confunda com as traças

Nunca utilize bolas de naftalina, embora o cheiro intenso também afaste os coelhos e outros animais porque são bastantes tóxicas para o solo. Todos os testes efetuados com instrumentos acústicos ultrassónicos provaram que não resultam.

9. Invista em mais do que uma destas estratégias

Para manter os coelhos fora do jardim, terá provavelmente de utilizar mais do que uma das estratégias acima listadas. A vedação é quase obrigatória, mas se utilizar uma ou mais das outras soluções, poderá conseguir pelo menos controlar os estragos. E nunca se esqueça que a peste de que se está a tentar livrar é uma peça fundamental no ecossistema mediterrânico.

Texto: José Pedro Tavares (biólogo)