É uma leitora compulsiva e uma apaixonada por histórias desde que se conhece. Nascida em Lisboa em 1978, Iris Bravo licenciou-se em medicina na Universidade de Lisboa e fez, depois, a especialidade de ginecologia e obstetrícia no Hospital Garcia de Orta, em Almada. Atualmente, divide-se entre a família, os livros e a infertilidade e a procriação medicamente assistida. A sua atividade profissional foi fonte de inspiração de "A terceira índia", um dos seus livros de maior êxito, já na terceira edição.

É uma leitora compulsiva assumida. O que é que a levou, também, a escrever?

O que me levou a escrever foi um impulso do momento, num dia em que decidi criar uma história em que a heroína tivesse infertilidade e o ponto de partida fosse o fracasso da minha medicina, digamos assim. Pensei-o como uma forma de dar voz às mulheres que lutam arduamente pelo sonho de serem mães e quis também fazer uma espécie de homenagem às doentes que não consegui ajudar.

Em quem ou no que é que se inspirou para escrever o grande sucesso que tem sido "A terceira índia"? Esperava um êxito com esta dimensão?

A resiliência da Sofia [personagem principal] e o sofrimento por não engravidar foram inspirados nas minhas doentes. Depois, a história ganha asas e tentei incluir outros temas que me são queridos, como a ecologia e o empoderamento da mulher como fator decisivo para o desenvolvimento das comunidades. Desejava muito ter êxito, assumo, mas, por outro lado, também tentei controlar as minhas expetativas porque tinha noção de que não seria fácil…

É, além de escritora, uma médica especializada em infertilidade e procriação medicamente assistida, um tema abordado no seu primeiro livro. Que influência tem a sua carreira profissional na sua escrita? Nessa primeira obra, foi um caso sem exemplo ou é uma tendência constante que pretende manter?

A minha profissão impulsionou-me a começar a escrever e deu-me substrato para o início de "A terceira índia", mas, a partir daí, sinto que já não foi tão importante...

Sofia, a personagem principal nas obras que já publicou, é inspirada nas mulheres que todos os dias a consultam ou, muito pelo contrário, é completamente o oposto das suas pacientes?

O desejo de construir uma família e o impacto dos tratamentos na relação com o marido foram inspirados nas conversas que tenho com as minhas pacientes. As outras características foram imaginadas por mim.

E como foi criar o Ricardo e o Alex, dois personagens tão distintos?

No primeiro livro, foi mais difícil criar o Alex, porque ele não é o que parece. Tem um passado complicado e revela-se aos poucos. No segundo livro, o Ricardo foi um desafio ainda maior que o Alex, porque queria mostrar como estava dividido entre a razão e o coração sem ser demasiado explícita…

Ainda em relação ao primeiro livro, porquê a escolha de Moçambique para o desenrolar da maior parte da história? Tem alguma afinidade particular com África?

Conheço alguns países de Africa, mas nunca fui a Moçambique. Escolhi esse destino para a Sofia porque queria um país muito diferente do nosso a nível económico e social, no acesso a cuidados médicos e na condição da mulher. Imaginei que o motivo para a Sofia não engravidar era alterar a sua trajetória de vida para que interferisse nos destinos de pessoas com quem não se cruzaria se concretizasse o seu sonho.

Esse mau acontecimento, digamos assim, foi necessário para que ocorressem outros acontecimentos bons, como lhes poderemos chamar, a seguir. Exatamente como, por vezes, acontece na vida real e só conseguimos perceber retrospetivamente... A zona de Namaacha foi-me sugerida pelo meu sogro e, depois, fiz pesquisa sobre Moçambique em vários relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU) e algumas organizações não-governamentais.

Como é que consegue conciliar a escrita com a carreira na medicina e a vida familiar, já que também é mãe?

Vou aproveitando alguns bocadinhos livres de tarefas de mãe depois de chegar do hospital. Lido bem com as interrupções e não preciso de calma nem de silêncio para escrever. Mas confesso que, às vezes, me distraio e estrago o jantar. Quando tenho a família toda a dormir, sento-me em frente ao computador pela noite dentro e perco a noção das horas a passar. No dia seguinte, custa-me um bocadinho, mas é compensador...

O seu primeiro livro, "A terceira índia", foi um êxito e tornou-se um bestseller. Como foi ter esta entrada triunfal no panorama literário nacional?

Foi maravilhoso... Fiquei muito feliz com o facto de tantas pessoas quererem ler e gostarem do meu livro. Adoro ver as partilhas com críticas e apreciações e também gosto de receber mensagens queridas das minhas leitoras.

Lançou há cerca de dois meses um novo livro, "A nova Índia”, que é a continuação tão esperada do primeiro. Já há um terceiro livro na calha?

Sim, tenho um terceiro livro meio feito, com história, personagens e contexto completamente novos. O único ponto em comum é a protagonista também ser uma mulher muita corajosa.

Apesar da sua ainda curta experiência, como vê o atual panorama literário nacional e como é que perspetiva a sua evolução no período pós-pandemia?

Baseada na minha curta experiência pessoal, eu diria que, a par dos nomes consagrados, é possível para os autores recém-chegados ganharem o seu espaço e conquistarem novos leitores. Além das editoras e livrarias que nos ajudam a divulgar o nosso trabalho, as redes sociais e os clubes do livro digitais são também uma valiosa ferramenta para alcançarmos mais público e criarmos interesse pelos nossos livros.

Em relação à pandemia, penso que veio reforçar a importância da leitura como fonte de educação, de entretenimento e de prazer. Espero que seja uma tendência que se mantenha nos ano vindouros. Eu, dentro das minhas possibilidades, procurarei dar o meu melhor para ajudar a que tal aconteça e até tenho um projeto com uma amiga escritora nesse sentido. Mas ainda é cedo para falar nele...