Em 2013, uma viagem de comboio entre Filadélfia e Nova Iorque mudou a sua vida. Pensou na azáfama em que andava. Quer explicar-nos o que sentiu nesse momento?
Sim. Certa noite, no início de minha carreira, viajava num comboio noturno para casa, para junto do meu marido e do meu filho com quatro meses. Nesse momento, estive prestes a abandonar tudo. Sentia-me exausta e sobrecarregada. Havia muito a fazer e pouco tempo para concluir as tarefas. Mas, em vez de abandonar o meu emprego como professora titular, direcionei a minha agenda de investigação no sentido de resolver o meu problema que, no fundo, era igual ao de tantas outras pessoas. Depois de anos a ministrar cursos clássicos de marketing, tomei uma decisão movida pela felicidade: desenvolveria um curso que ensinasse os executivos a obter maior satisfação nas suas vidas profissionais e pessoais. O meu curso, “Aplicação da Ciência da Felicidade ao Projeto da Vida” (no original “Applying the Science of Happiness to Life Design”), tornou-se um dos mais populares da Anderson School of Management, da Universidade da Califórnia Los Angeles (UCLA). O curso tinha impacto na vida dos meus alunos. Por exemplo, salvou um casamento e orientou um aluno famoso a aceitar um emprego gratificante. No fundo ensino felicidade. Face a isto, concordei que chegara a hora de escrever um livro o que permitiria a mais pessoas aprenderem a aproveitar ao máximo o seu recurso mais precioso, o tempo. O livro Happier Hour oferece estratégias empiricamente fundamentadas e ativáveis sobre como ‘gastar’ o nosso tempo para desfrutarmos de maior satisfação no dia a dia e mais realização na vida em geral.
Que relação têm os seus compatriotas com o tempo?
Conduzi uma pesquisa à escala nacional que revela que quase metade dos americanos experimenta “pobreza de tempo”, ou seja, a sensação dominante de ter demasiadas coisas para fazer e muito pouco tempo para isso. Mas, não são apenas os meus compatriotas que estão com falta de tempo. Estudos demonstram que as pessoas à escala mundial sofrem com o ritmo de vida agitado. Embora desconheça estudos feitos especificamente junto da população portuguesa, julgo que partilhamos a experiência de viver em contrarrelógio.
Enquanto psicóloga social de que forma está a trabalhar a questão do enriquecimento do tempo?
A forma como gastamos o nosso tempo define-nos e às memórias que deixamos, assim como seremos lembrados. Examino os efeitos deste recurso logístico e existencialmente fundamental para a felicidade. Em particular, desenvolvo e divulgo conhecimento empírico para informar como os indivíduos devem pensar e gastar o seu tempo; para experimentar uma maior realização ao longo dos seus dias e maior satisfação em relação às suas vidas. Descobri, por exemplo, que investir no tempo, mais do que no dinheiro, aumenta a felicidade das pessoas; que a idade influencia a forma como as pessoas vivenciam a felicidade (ou seja, pacífica versus excitante) e os tipos de experiências (comuns versus extraordinárias) que produzem felicidade; que ter pouco ou muito tempo livre prejudica a felicidade; que presentear o tempo com experiências cultiva a felicidade nos relacionamentos.
No seu livro apresenta-nos um episódio que nos faz pensar sobre o tempo e como o relacionamos com os diferentes aspetos da nossa vida. Refiro-me ao frasco do tempo (ver caixa). Quer partilhar com os nossos leitores o significado desta história?
Sim, trata-se de uma analogia sobre como devemos priorizar o nosso tempo. Revela-nos a importância de reservar e proteger o tempo para as atividades que realmente são importantes. Ou seja, cultivar os seus relacionamentos importantes, dedicando tempo às dimensões do seu trabalho que realmente o ajudam a alcançar os seus objetivos (aquelas que se alinham com o seu propósito). Caso contrário, o seu tempo ficará cheio de ‘areia’. Dessa forma, ficará a olhar para o passado, para os seus dias, semanas e anos, sentindo-se insatisfeito e exausto por ter estado tão ocupado. Mas, se priorizar o tempo com ‘bolas de golfe’, que representam o que realmente importa, será capaz de olhar para trás e, mesmo tendo estado ocupado, sentir-se-á realizado e satisfeito, porque investiu no mais relevante.
Há uma relação entre falta de tempo e infelicidade? Como se revela esta infelicidade?
A pobreza de tempo, como já vimos, traduz-se na intensa sensação de ter muito para fazer e não ter tempo suficiente para fazê-lo. Estudos revelam que quando sentimos falta de tempo, ficamos menos saudáveis. Por exemplo, menos propensos a fazer exercício físico, menos gentis, ou seja, menos inclinados a dedicar tempo para ajudar os outros. Também seremos menos confiantes e menos felizes.
Imaginemos que temos todo o tempo do mundo. Isso significa dizer que nos tornamos pessoas felizes?
No início da minha carreira, quando me sentia sem tempo, com um emprego de alta pressão e um bebé para cuidar, pensei que a solução era clara: deveria pedir demissão para ter muito mais tempo para passar com a minha família e fazer o que quer que fosse. Acreditava que com mais tempo seria mais feliz. No entanto, antes de abandonar a carreira pela qual trabalhei tanto, percebi que essa era uma questão empírica que valia a pena testar. Como referi atrás, recrutei alguns dos meus colaboradores favoritos para examinar a relação entre o número de horas discricionárias que as pessoas têm nos seus dias e a relação com a felicidade. O padrão dos resultados foi surpreendente, ao revelar uma curva em forma de U invertido, como um arco-íris.
Quer explicar-nos?
Por um lado, vimos a conhecida queda na felicidade devido à falta de tempo, que é impulsionada por sentimentos elevados de stress. Mas, por outro lado, também vimos uma queda na felicidade relacionada com ter muito tempo livre. Explorando essa característica do padrão, percebemos que as pessoas são motivadas a serem produtivas e têm aversão ao ócio. Sem nada para lhes preencher as horas, as pessoas perdem o sentido de propósito e sentem-se insatisfeitas. Como alguém que encontra um propósito no seu trabalho. Frente a estes resultados percebi que desistir da minha carreira para ter mais tempo não me faria mais feliz. Os resultados também revelaram que, exceto nos extremos, o nível de felicidade que sentimos não tem relação com a quantidade de tempo disponível de que dispomos. Então, sucede que a verdadeira resposta para uma maior satisfação na vida não está em ganhar tempo, mas sim em enriquecer o tempo que temos.
É possível aumentar a sensação de abundância de tempo?
Muitos sentimos falta de tempo, que se traduz em inúmeras coisas para fazer, sem tempo suficiente para fazê-lo. No entanto, a investigação também revela que, para obter mais tempo, a solução não passa, provavelmente, por aquilo em que está a pensar neste momento: fazer menos. Em vez disso, há que ‘gastar’ tempo de formas que o fazem ‘expandir’, o que poderá aumentar a riqueza desse tempo. Vai sentir-se uma pessoa rica de tempo.
Pode dar-nos exemplos?
Sim. Dou-lhe três exemplos, o primeiro, resume-se à palavra “mexa-se”. O exercício é uma forma eficaz de aumentar sua autoeficácia (ou seja, a sua confiança em ser capaz de realizar tudo o que se propõe a fazer). Assim, ao reservar uns minutos para se exercitar, terá a sensação de que tem todo o tempo de que precisa para realizar o que importa. Em segundo lugar, pratique atos de bondade. Quando está a correr no dia a dia, muitas vezes não diminui a velocidade para os outros. Isso não significa que seja má pessoa. Todos somos propensos à mesquinhez imposta pela pressa. No entanto, as nossas investigações revelam que ao ‘gastar’ o seu tempo para ajudar o próximo, fará sentir-se surpreendentemente realizado. Doar tempo pode dar-lhe tempo. Finalmente, experimente a admiração. Estudos revelam que sentir uma sensação de admiração pode expandir não apenas a sua perspetiva, mas a sua noção de tempo. Então, vá em frente e crie um profundo sentido de ligação humana, saia ao encontro da natureza ou reserve bilhetes para um espetáculo. Ficará feliz por ter assim passado tempo.
A Cassie Holmes fala-nos no seu livro em “comprar tempo” de mais qualidade. Como podemos comprar esse tempo?
A investigação demonstra que as pessoas que gastam dinheiro em serviços que economizam tempo são significativamente mais felizes, principalmente se o tempo libertado for realocado para atividades consideradas mais valiosas. De facto, os casais que terceirizam atividades passam mais tempo juntos e relatam maior satisfação no relacionamento. Pense se existem tarefas no seu dia a dia que poderia terceirizar. Por exemplo, poderia recorrer à entrega em casa das compras do supermercado ou refeições ao domicílio? Dessa forma, poderá transformar o tempo que passaria na mercearia e frente ao fogão em momentos à mesa, a saborear uma refeição em família. Comprar um tempo melhor vale, definitivamente, o dinheiro despendido.
É possível olharmos para um trabalho que consideramos monótono e vê-lo como uma atividade divertida?
À medida que os trabalhadores procuram maior significado na forma como gastam o seu tempo, as chefias têm de enfatizar o propósito do trabalho. Quando as pessoas estão cientes do significado de seu trabalho, vão sentir-se mais motivadas a executá-lo (mesmo as tarefas menos divertidas) e sentem-se mais satisfeitas com isso (o trabalho em si parece mais divertido). Logo, as chefias devem ajudar as suas equipas a entenderem que o seu trabalho tem significado.
A investigação sobre controlo do tempo revela que as horas gastas a trabalhar tendem a ser as menos agradáveis, e as horas gastas a socializar tendem a estar entre as mais felizes. Isso, juntamente com inúmeras evidências que nos mostram que a conexão social é fundamental para o bem-estar. Tal sugere que os trabalhadores beneficiariam ao contarem com ligações sociais nas suas horas de trabalho. Desta forma, as chefias devem fazer o possível para apoiar os trabalhadores no desenvolvimento de amizades dentro das organizações. De facto, estudos demonstram que trabalhadores que têm um “melhor amigo no trabalho” são significativamente mais comprometidos, fazem um trabalho melhor e são mais felizes nos seus empregos e na vida em geral.
Perdemos muito tempo nas redes sociais?
Os telemóveis provam ser uma séria fonte de distração. A continua verificação da caixa de e-mails ou a resposta a mensagens de texto ou de navegação nas redes sociais, subtrai-nos, inevitavelmente ao que estamos a fazer no momento. Até a mera presença dos nossos telemóveis recorda-nos todas as coisas que poderíamos e “deveríamos” estar a fazer naquele momento. Portanto, há que definir momentos que são “zonas sem telefone”. Guarde o telefone fora de vista para tornar esse tempo não apenas mais produtivo, mas também mais agradável.
O que, realmente, mudou na vida da Cassie Holmes desde que decidiu fazer uma gestão diferente do seu tempo?
Como descrevo em Happier Hour, há tantas pequenas mudanças que podemos fazer em como pensamos e passamos as horas do dia que tal se traduz num novo sentido de alegria e realização na vida.
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