Certamente que já ouviu falar dezenas de vezes sobre a síndroma da imunodeficiência adquirida (SIDA), do poder destrutivo do Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH) e dos riscos do sexo desprotegido, a mais importante forma de transmissão deste vírus.
Na última década, a par dos avanços da medicina no tratamento desta infecção, foram desenvolvidas inúmeras campanhas na perspectiva de educar para prevenir. Mas, a verdade é que há ainda quem acredite que a SIDA é uma doença ligada à prostituição, toxicodependência ou homossexualidade. Nada mais errado. «A epidemia da SIDA», revela a Coordenação Nacional para a Infecção VIH/SIDA, «mostrou que todos têm de se prevenir: homens, mulheres, casados ou solteiros, jovens e idosos, todos independentemente da cor, raça, situação económica ou orientação sexual.» Em Portugal, o ano passado, revela a mesma fonte, registou-se um aumento do número de casos de transmissão heterossexual e um menor número de casos associados à toxicodependência.
Porque a informação é a primeira arma contra esta ameaça, com base em dados fornecidos por especialistas em virologia e infecciologia e divulgados por entidades de referência nacionais e internacionais na luta contra a SIDA, respondemos às dúvidas mais comuns e desmistificamos ideias erradas que ainda persistem ao fim de duas décadas de informação e sensibilização. Leia o que se segue e proteja a sua vida.
O que é o VIH?
«A infecção causada pelo vírus do VIH é uma doença provocada por um ou dois vírus que progressivamente destroem glóbulos brancos chamados linfócitos, causando a síndroma da imunodeficiência adquirida (SIDA) e outras doenças derivadas de uma imunidade deficiente», explicam os especialistas Jorge Atouguia e Luís Távora Tavira, na obra «Infecções Sexualmente Transmissíveis».
Através da eliminação das células que reconhecem os agentes infecciosos que atacam o organismo (células CD4), o VIH vai enfraquecer o sistema imunitário, o nosso sistema natural de defesa. Com um sistema imunitário debilitado, o organismo não tem capacidade de resposta para a agressão desses agentes, desenvolvendo assim infecções e doenças. «A SIDA corresponde ao estádio final da infecção por VIH. É diagnosticada numa pessoa infectada com o VIH quando esta é vítima de uma ou mais infecções oportunistas, como tuberculose ou pneumonia, e tem um número extremamente reduzido de células TCD4+», elucida a entidade norte-americana National Institute of Allergy and Infectious Diseases (NIAID).
Como é o vírus transmitido?
Segundo o Portal da Saúde, o site do Ministério da Saúde, «a transmissão sexual é a principal via de transmissão em todo o mundo». Nas relações sexuais desprotegidas (anal, vaginal ou oral), ou seja sem recurso ao preservativo, há uma grande probabilidade do vírus ser transmitido através das secreções sexuais.
No sexo oral, revela a mesma fonte, o risco é maior quando existem úlceras, gengivas inflamadas, garganta irritada ou gengivas a sangrar após escovagem dos dentes ou o uso do fio dentário.
O risco de contrair o vírus pela via sexual aumenta em pessoas com múltiplos parceiros sexuais e já infectadas por doenças sexualmente transmissíveis (DST), alerta o Centers for Disease Control and Prevention (CDC).
Outra via de transmissão é o contacto com sangue infectado através da partilha de seringas, agulhas, escova de dentes, lâminas de barbear ou material cortante. Recomenda-se ainda que não sejam partilhados outros objectos cortantes em que exista sangue infectado, como piercings ou objectos de manicura.
O VIH pode ser também transmitido de mãe para filho durante a gravidez ou no parto, através do sangue ou de secreções vaginais, assim como através do leite materno.
Existem outras formas de contágio menos comuns?
O CDC indica outras formas de transmissão mais raras, como as transfusões de sangue, de produtos sanguíneos, transplantes de órgãos e tecidos contaminados com VIH. O mesmo organismo indica ainda as injecções e outros procedimentos médicos realizados em más condições de higiene e saúde. No entanto, nestes casos, o risco tende a ser baixo devido à análise rigorosa e às normas de segurança actualmente vigentes, ressalva a entidade norte-americana.
Nas situações mais raras de contágio inclui-se ainda o caso da pessoa infectada mastigar alimentos que serão depois ingeridos por outra pessoa ou ser-se mordido por um indivíduo infectado, caso a pele fique ferida. É também considerada uma «possibilidade remota» a transmissão do vírus através de um beijo «profundo» dado por uma pessoa infectada pelo VIH que sofra de sangramento das gengivas.
Que ideias erradas ainda subsistem relativamente à transmissão deste vírus?
Apesar dos esforços feitos na divulgação de campanhas que procuram alertar e informar a população, há ainda mitos que persistem. Conviver socialmente com uma pessoa infectada não vai colocá-lo em risco.
O Ministério da Saúde esclarece que não há possibilidade de contágio em qualquer meio que não envolva sangue, esperma, fluidos vaginais ou leite materno. Neste contexto, o vírus não é transmitido através do ar, de água ou de actividades diárias, como o uso do assento sanitário, a partilha de talheres ou copos ou a partir de contactos sociais como um aperto de mão, um abraço ou um beijo na face. O VIH não é transmitido através da saliva, de lágrimas, suor, fezes, secreções ou vómitos, desde que «estes não tenham sangue misturados», acrescenta a mesma fonte.
Também «estudos realizados pelo CDC e outros investigadores não comprovam a transmissão do VIH através da picada de insectos», acrescenta o organismo norte-americano.
Quais são as principais formas de prevenção?
Para se prevenir da infecção por VIH, a Coordenação Nacional para a Infecção VIH/SIDA aconselha o uso correcto do preservativo nas relações sexuais que deve, entre outros cuidados, ser «colocado desde o início do contacto entre o pénis e a vagina. Mesmo não sendo 100 por cento seguro contra uma gravidez não desejada ou contra a SIDA, continua a ser a melhor protecção». Outra medida preventiva passa pelo uso de agulhas e seringas descartáveis.
Este organismo sublinha ainda a importância de todas as grávidas consultarem «o seu médico o mais cedo possível e fazer o teste da sida». Existem tratamentos que reduzem a probabilidade de transmitir o VIH para o bebé.
Prevenir e tratar as as doenças sexualmente transmissíveis (DST) é outro passo importante. A Coordenação Nacional para a Infecção VIH/SIDA lembra que a presença de DST aumenta 18 vezes a probabilidade de contrair o VIH.
Quais são os sintomas do VIH?
Numa fase inicial da infecção, segundo o NIAID, podem não existir sintomas ou muito poucos. Um mês ou dois após a infecção ter ocorrido, é possível que surjam sintomas semelhantes aos de uma gripe que tendem a desaparecer ao fim de um mês, como febre, dor de cabeça, cansaço, aumento dos gânglios linfáticos no pescoço e virilhas.
«Algumas pessoas infectadas com o VIH podem ter sintomas iniciais mais graves, outras podem permanecer até dez ou mais anos sem revelar qualquer sintoma», conta este instituto norte-americano.
Durante os últimos estádios da doença, o vírus enfraquece muito o sistema imunológico e as pessoas infectadas manifestam outros sintomas como perda de peso rápida, febre recorrente, fadiga, feridas na boca, no ânus ou genitais, pneumonia e distúrbios neurológicos, entre outros. «Estes sintomas podem estar relacionados com outras doenças, por isso, a única forma de determinar se está infectado pelo VIH é através do teste», alerta o NIAID.
Como podemos saber se estamos infectados pelo VIH?
Uma análise ao sangue muito simples e muito exacta pode ser utilizada para determinar se alguém está infectado com VIH e «a pessoa que tem algum comportamento de risco deve fazer este teste porque se estiver infectada irá continuar a transmitir a infecção. As análises que fazemos por rotina são aquelas que detectam os anticorpos», esclarece Jorge Atouguia, infecciologista.
Tenha, contudo, em conta que pode existir o «efeito de janela»: desde que a pessoa se infecta até ter a quantidade de anticorpos suficiente para ser expressa nos resultados laboratoriais pode demorar até seis meses ou mais.
Existe outra análise mais precisa?
«Há a possibilidade de fazer um teste que detecta uma proteína do próprio vírus denominada P24. É um teste mais caro mas encurta esse período de janela. Muitas vezes, nos casos mais desesperados do ponto de vista da ansiedade, por não se saber se a relação foi ou não de risco, pode justificar-se a necessidade de recorrer a este teste», diz Jorge Atouguia.
O que devemos fazer em caso de suspeita de infecção?
Em caso de dúvida ou de suspeita forte de risco de transmissão, «as pessoas podem ter de iniciar terapêutica antiretroviral». Sempre que haja uma relação de risco em que a pessoa não sabe se o parceiro estava ou não infectado pelo VIH, deve recorrer aos serviços de urgência para expor a situação. «Aí, em função do risco, os médicos decidirão se faz sentido que o utente inicie tratamento com medicamentos anti VIH», adianta Jorge Atouguia.
Quem deve fazer o teste do VIH?
Segundo a Coordenação Nacional para a Infecção VIH/SIDA, «todos devem fazer o teste».
O Ministério da Saúde refere que a pesquisa no sangue do VIH é especialmente importante sempre que houver dúvidas sobre a possibilidade de estar infectado pelo VIH; se pensa engravidar; se está grávida; se teve relações sexuais sem preservativo, se houve partilha de seringas, agulhas ou outro material na injecção de drogas.
O mesmo se aplica caso tenha feito uma tatuagem ou um piercing com instrumentos não esterilizados (situação actualmente mais frequente em locais que não estejam legalizados) ou se teve contacto directo com o sangue de outra pessoa.
Que passos se deve dar para realizar o teste do VIH?
Recorra ao seu médico de família, médico assistente ou dirija-se aos Centros de Aconselhamento e Detecção Precoce. Para mais informações contacte a linha SIDA 808 26 66 66.
Que tratamentos existem para o VIH?
O ponto de viragem do tratamento do VIH deu-se em 1996 quando foi testada e aprovada uma nova terapêutica – o tratamento antiretroviral altamente activo (HAART) – que combina três ou mais medicamentos e consegue travar a replicação do vírus e recuperar o sistema imunitário. Graças a este avanço da medicina, a esperança média de vida dos doentes passou de 15 para mais de 30 anos.
De acordo com Ricardo Camacho, virologista, responsável pelo Laboratório de Biologia Molecular, no Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, «nos países onde a terapêutica foi aplicada, o resultado foi uma redução drástica do número de mortes e das doenças oportunistas relacionadas com a infecção do VIH».
Todos os medicamentos tentam evitar que novas células sejam infectadas, no entanto estes actuam de forma diferente em diversos estados do ciclo de vida do VIH. Para saber mais sobre esta terapêutica e os avanços da medicina que se esperam nos próximos anos, clique aqui
Para aceder a contactos úteis de associações e organismos nacionais envolvidos na luta contra a SIDA, clique aqui
Texto: Sofia Cardoso e Cláudia Pinto com Jorge Atouguia (médico infecciologista) e Ricardo Camacho (virologista)
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