“A dificuldade é pedir ajuda e reconhecer o problema”, comentou à Lusa Daniela, que é assistente social - já estava habituada a lidar com este tipo de problemas, agora sente-os na pele.
Internada no CRETA - Centro de Recuperação para Toxicodependentes e Alcoólicos, em Cascais (distrito de Lisboa), Daniela, de 35 anos, combate a adição ao álcool, substância da qual ficou “refém” nos últimos dois anos.
“O desgoverno foi total a todos os níveis: financeiro, social, familiar e, essencialmente, para com a minha filha”, reconheceu. Com medo de ficar sem a guarda da menor, decidiu ser tratada. Meteu férias do trabalho e entrou de imediato no CRETA.
Apoiada pela família, pagou do próprio bolso cerca de 10.500 euros pelo tratamento de três meses.
“Não é caro. Num hotel bom, sem terapeutas, pagamos uma média de 70 a 80 euros. Aqui, pagamos uma média de 100 euros por dia com excelentes terapeutas. Se há dinheiro muito bem empregue é aqui. Não consigo chorar um cêntimo”, afirmou.
Para Daniela, esta é a primeira experiência de internamento numa comunidade terapêutica. Para Adonis, de 35 anos, é mais uma tentativa de tratamento de drogas.
Internado também no CRETA, Adonis já é reincidente. Fez vários tratamentos comparticipados pelo Estado, mas recaiu sempre. Começou com 12 anos a beber álcool e a fumar drogas com os amigos.
Hoje, é dependente de heroína, cocaína e haxixe, tem adição ao álcool e ao sexo, e sofre de perturbações do comportamento alimentar. “Acabei por largar o meu trabalho e a minha casa, perder tudo, devido às drogas”, contou.
No CRETA, o tratamento é multidisciplinar, juntando as valências de psiquiatria e psicoterapia, através de sessões individuais e, sobretudo, em grupo.
“Há muitas atividades de grupo, porque as pessoas que aqui temos internadas têm todas um objetivo comum e quando funcionam em conjunto, em grupo, esses objetivos são muito mais facilmente atingidos”, disse o coordenador terapêutico, João Soares, considerando que quando há um grande investimento no tratamento, desde o internamento ao pós-internamento, a probabilidade da pessoa recair é muito baixa.
Apesar de ainda estarem em fase de tratamento no CRETA, Adonis e Daniela já pensam como vai ser quando saírem. Ambos querem continuar a manter-se ligados à comunidade terapêutica, de forma a evitar uma recaída.
Na comunidade terapêutica Ares do Pinhal, em Sintra, no mesmo distrito, os tratamentos são de longa duração, entre um ano e um ano e meio, divididos em três fases: acolhimento, reflexão interior e reinserção socioprofissional. A maioria dos utentes tem apoio do Estado na comparticipação dos tratamentos.
Entre trabalhos agrícolas, tarefas domésticas e sessões terapêuticas na Ares do Pinhal, Bruno, de 32 anos, cumpre o segundo tratamento de dependência de álcool e medicação.
“Durante muitos anos não me lembro de andar sóbrio, de andar sem ser sob o efeito de uma substância”, contou, acrescentando que não tem na família exemplos de toxicodependência nem de alcoolismo, por isso é a “ovelha negra”.
Para Bruno, o consumo de álcool servia como refúgio para os problemas. Tinha 20 anos quando fez o primeiro tratamento e esteve quatro anos sem consumir álcool até uma recaída em que voltou a beber todos os dias.
Empenhado no novo tratamento e motivado para a mudança, sabe que vai ser difícil resistir quando sair do tratamento: “Tenho que me manter vigilante. […] Saio muito pouco à noite, mas, caso saísse, também não ia à procura, não me ia pôr na boca do lobo”.
Dependente de heroína e cocaína, Pedro, de 57 anos, já vai no quinto tratamento, mas acredita que é desta vez que o problema fica arrumado.
Em todos os tratamentos, trabalhou sempre na correção dos comportamentos aditivos, mas nunca resultou. “Não foram os tratamentos que falharam”, assumiu, reconhecendo não ter tido força de vontade suficiente.
“O consumo no fundo é o sintoma e não a doença em si. A doença que está cá dentro é uma doença das emoções e dos sentimentos e só aqui [na Ares do Pinhal] é que consegui perceber de facto isso e identificar aquilo que tinha que trabalhar em mim”, disse Pedro.
Responsável por coordenar a comunidade terapêutica, Miguel Esteves assume que o tratamento de um toxicodependente é um processo complexo, feito de avanços e recuos.
Como nem sempre se consegue a abstinência total do utente, sublinhou, é importante “pelo menos mudar um pouco os seus hábitos e tentar encontrar hábitos mais saudáveis, que lhe permitam um maior ajustamento social, que não ponha em risco a sua vida e a dos outros”.
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